PROTEUS EDUCAÇÃO PATRIMONIAL 22 ANOS

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sábado, 16 de junho de 2018

A ESCOLA DE APRENDIZES MARINHEIROS DE BURITIZEIRO/MG – A VOCAÇÃO PARA SERVIR AOS RIBEIRINHOS


A ESCOLA DE APRENDIZES MARINHEIROS DE BURITIZEIRO/MG – A VOCAÇÃO PARA SERVIR AOS RIBEIRINHOS
Autor: Carlos Henrique Rangel
Atualizada em 2020.

A conquista da região do São Francisco, após a morte do sertanista paulista Matias Cardoso, coube a seu filho Januário Cardoso e aos seus antigos subordinados e descendentes destes.

Primeiramente, Januário teria transferido o antigo arraial fundado por seu pai para um local que considerava mais adequado, atualmente denominado Arraial do Meio. As “ruínas de Mocambinho”  localizadas no atual município de Jaíba seriam então, o que restou desse antigo povoado de Matias Cardoso abandonado às constantes enchentes. (VER TEXTO SOBRE AS RUÍNAS DE MOCAMBINHO AQUI NA PROTEUS). 

Constatando as mesmas deficiências do primeiro arraial no arraial do Meio - também sujeito às inundações - Januário mudou-se novamente, desta vez para o local definitivo, origem do povoado de Morrinhos, atual cidade de Matias Cardoso.

Temos como certo que, o arraial novo dos Morrinhos de Domingos do Prado é o arraial de Morrinhos criado por Januário Cardoso.

A conquista definitiva da região teria ocorrido a partir do Arraial de Morrinhos, com a consequente ocupação das terras dos dois grandes redutos caiapós: Guaíbas e Tapiraçaba.

Consolidado o domínio do Rio de São Francisco, estes sertanistas espalharam suas fazendas e arraiais por toda a região do São Francisco e Rio Verde reforçando os vínculos com as Minas para onde remetiam o gado.

Januário Cardoso permaneceu como principal líder da região até a década de trinta do setecentos.  Após a sua morte a liderança do arraial de Morrinhos ficou a cargo de Domingos do Prado. Com os motins do sertão em 1736, as grandes lideranças locais perderam o brilho e a região por este e outros fatores entrou em um período de relativo declínio.

A região mineira do médio São Francisco se relacionou intimamente com as terras auríferas, durante boa parte do século XVIII, tanto pelo abastecimento de carne e outros produtos que vinham pelo sertão, importados das capitanias de Pernambuco e Bahia, quanto pela rota para o descaminho do ouro.  

A relação entre as duas regiões – Sertão do São Francisco e região mineradora – a partir da decadência aurífera terá como consequência certa estagnação do médio São Francisco e a forçosa necessidade de diversificar suas atividades econômicas. Em fins do século XVIII, a vocação agropecuária do sertão do rio São Francisco já estava inteiramente consolidada.

No século XIX, prevalece a economia de subsistência e a exploração de recursos vegetais — frutas silvestres, ervas medicinais, madeiras de lei, palmeiras, etc. — animais de caça e minerais: ouro, diamante e salitre. A agricultura de subsistência com a consequente comercialização do excedente produziu milho, feijão, cana-de-açúcar e o algodão. Este último produto vai ser favorecido na segunda metade do século XIX pela instalação de várias indústrias têxteis que transformam o sertão sanfranciscano no maior fornecedor de matéria-prima e em mercado consumidor de tecidos produzidos pelas fábricas mineiras.

Esse comércio se fazia principalmente pelos rios trafegados por incontáveis barcas e canoas desde o século XVIII. Por meio dessas pequenas embarcações se fazia o comércio entre Juazeiro - na Bahia - e Januária - em Minas Gerais e subsequentemente entre Guaicuí e Pirapora. Assim, em 1847, trafegavam no rio São Francisco 54 barcas.

Os barcos a vapor dinamizavam o comércio e o transporte na região a partir da segunda metade do século. Em 1870, calculavam-se entre 250 a 300 embarcações percorrendo aquele rio. No final do século XIX -  já na república - o estado de Minas Gerais criou a Companhia Viação Central do Brasil – mais tarde Empresa Banco Viação do Brasil –, com o intuito de promover o transporte fluvial da bacia do rio São Francisco.

Em setembro de 1892, o Banco Viação do Brasil contava nos rios das Velhas e São Francisco com quatro embarcações de aço movidas a vapor, dois navios de madeira e o vapor Saldanha Marinho, adquirido por volta de 1890.

No início do século XX, a cidade de Pirapora, anteriormente favorecida pela instalação do depósito da empresa Cedro Cachoeira, passou a ser a principal cidade da região, posição fortalecida com a chegada da estrada de ferro, em 1911, vindo a substituir desta forma a cidade de Januária. Nos novecentos, as relações comerciais com a Bahia continuaram fortes. Os vapores continuaram como os grandes transportadores de mercadorias durante toda a primeira metade do século.

Importante salientar que, devido às constantes destruições das matas ciliares do rio São Francisco e de seus afluentes, a profundidade de seu espelho d’água vem diminuindo de ano para ano, causando o surgimento de bancos de areias que prejudicam a sua navegabilidade. O final do século XX assiste ao fim da era dos vapores transportadores de passageiros e mercadorias.

A ESCOLA DE APRENDIZES MARINHEIROS DE BURITIZEIRO


As escolas de aprendizes marinheiros surgidas na segunda metade século XIX se espalharam pelas cidades litorâneas, chegando a 18 instituições durante o Império. No início do século XX, após reformulação, somavam 17 escolas.

É neste contexto que surge a Escola de aprendizes Marinheiros de Buritizeiro, à época pertencente à Pirapora. O projeto do conjunto da Escola de Aprendizes Marinheiros foi elaborado pelo arquiteto de origem italiana, Miguel Micussi, ficando a coordenação das obras – iniciadas em 6 de maio de 1909 - sobre a responsabilidade do engenheiro Capitão de Fragata Tancredo Burlamaqui de Moura. Segundo o Jornal Correio da Manhã, as obras foram iniciadas de fato em 15 março de 1910, conforme inscrição encontrada  na entrada do prédio principal da Escola .[1]

A construção dos imóveis foi concluída em 28 de abril de 1911 e em 13 de junho daquele ano, o Comandante Tancredo Burlamaqui, empreendeu a inauguração da nova Escola de Aprendizes Marinheiros.

A Escola começou a funcionar efetivamente somente em 21 de abril de 1913, contando inicialmente com vinte (20) alunos. Esse número de alunos aumentou durante o ano de 1913, chegando a 82 alunos segundo Relatório do Ministério da Marinha[2] ou 94, conforme o exposto na “Revista Marítima Brazileira”[3]



Única escola de marinheiros em território mineiro, o complexo arquitetônico construído pela Marinha durante os anos de 1910-1911, funcionou cerca de sete anos apenas, fechando em 1920. No entanto, apesar da prematura falência, tornou-se um marco da história da região e da marinha brasileira.



 O HOSPITAL CARLOS CHAGAS


Logo em seguida, em 1922, o conjunto foi transferido em regime de comodato para o governo de Minas Gerais, passando a abrigar o Hospital Regional Carlos Chaga, outro importante estabelecimento destinado ao combate às doenças na comunidade ribeirinha. Em 1939, por meio do decreto-lei federal n.° 1.569, de seis de outubro, assinado pelo presidente Getúlio Vargas, o conjunto foi definitivamente repassado ao Estado de Minas Gerais em troca de um prédio em Pirapora que se destinaria a sede da Capitania dos Portos no estado.

Apesar de ter se tornado referência regional, o Hospital Carlos Chagas foi fechado, provavelmente devido à inauguração de um hospital municipal em Pirapora em fins dos anos 1940 e início de 1950. Sabe-se que em 1944, o hospital ainda funcionava no prédio da antiga Escola de Aprendizes de Marinheiros.

CENTRO EDUCACIONAL DE BURITIZEIRO DA FUCAM



Em 1951, o conjunto de imóveis da antiga Escola de Aprendizes Marinheiros foi destinado à sede de uma das Escolas Caio Martins - importante instituição assistencialista do estado de Minas Gerais, que teve sua origem em 1948, quando a matriz foi instalada pela Polícia Militar na Fazenda Santa Tereza, no município de Esmeraldas.



A criação do novo estabelecimento de ensino em Buritizeiro ocorreu em 2 de janeiro de 1952, por Manoel José de Almeida.



As Escolas Caio Martins foram transformadas pela lei n.° 6.514, de 10 de dezembro de 1974, em Fundação Educacional Caio Martins – Fucam - vinculada à Secretaria de Estado de Esportes e da Juventude (SEEJ), subdividida em seis centros educacionais: Buritizeiro, Carinhanha, Esmeraldas, Januária, São Francisco e Urucuia.



 Atualmente a Fundação encontra-se subordinada à Secretaria de Estado de Trabalho e Desenvolvimento Social – SEDESE –, tendo como principal objetivo “o desenvolvimento sustentável e integrado de crianças, adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade social, prioritariamente da zona rural, para a participação cidadã.”



O Centro Educacional de Buritizeiro – Fucam –, sediado no antigo prédio da Escola de Aprendizes Marinheiros, apresenta salas de aulas para oficinas de educação complementar, cozinha, refeitório, biblioteca, sala da sede do 61º Grupo Escoteiro Hélio Marcos, salão para eventos e, na parte externa, quadras de areia e de futebol. O curso ensina artesanato de raiz, informática, música, olericultura orgânica, jardinagem, esportes, além de fornecer apoio pedagógico e ao escotismo. Nos seus 2.117 hectares das fazendas Varginha e Porto, a Escola conta com horticultura, bovinocultura e avicultura e realiza visitas guiadas voltadas para o ensino, pesquisa e extensão.



O conjunto arquitetônico e paisagístico da antiga Escola de Aprendizes de Marinheiros se destaca por ter servido de sede a três instituições de importância inquestionável para a região sanfranciscana:



- A Escola de Aprendizes Marinheiros – única escola desta categoria criada em Minas Gerais, devido à importância do comércio fluvial interestadual da região.

- O Hospital Regional Carlos Chagas – importante baluarte na luta contra as epidemias que assolavam o sertão sanfranciscano.

- O Centro Educacional de Buritizeiro da Fucam - ainda hoje uma das mais prestigiadas instituições de ensino de Minas Gerais.



O conjunto arquitetônico é a junção de suas funções ao longo do tempo, numa sobreposição emoldurada pelo Rio São Francisco e o Sertão. O sertanejo, seu habitante aprendiz, determinou os usos na medida de suas necessidades, impregnando os espaços de um simbolismo além da pedra e cal. À qualidade arquitetônica do conjunto soma-se toda uma aura atribuída desde a sua origem para servir e engrandecer o homem sanfranciscano.



Seu valor histórico e arquitetônico desponta como um importante marco da cultural da Região Norte de Minas Gerais e justificou o seu tombamento como patrimônio cultural do povo mineiro empreendido pelo IEPHA e pelo Conselho Estadual do Patrimônio Cultural – CONEP -em 2017.









[1] Informação encontrada em inscrição pelos jornalistas do Jornal Correio da Manhã existente na entrada do prédio principal.  (Jornal O Correio da Manhã, 19 de junho de 1911, p.2).
[2] brasil, Ministério da Marinha, 1913, p.306.
Em nota no Jornal do Brasil de 4 de Setembro de 1913, p.9, há informação de que a Escola possuía matriculados, 88 alunos.
[3] Revista Marítima Brazileira, dezembro de 1913, vol.XXXIII, n.º 6, p. 767.
Em julho de 1913, a escola possuía 24 alunos. Outros 23 novos alunos vieram do Rio de Janeiro e outros pontos. (Jornal O Pirapora, 6 de julho de 1913, p.2).

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