A
OCUPAÇÃO DO VALE DO JEQUITINHONHA
Autor: Carlos Henrique Rangel
1. OS ÍNDIOS
Os primeiros habitantes dos sertões de Araçuaí e
Jequitinhonha foram os índios Tupinaqui, expulsos para o litoral pelos Aimoré.[1]
Estes, oriundos do ocidente, dominaram a região do Mucuri, Jequitinhonha e
Araçuaí, chegando a descer ao litoral de Porto Seguro e Ilhéus para saquear as
colônias portuguesas. Combatidos por Mém de Sá e em seguida pelos Tapajós,
dispersaram pelos sertões em pequenos grupos, sendo mais tarde denominados
genericamente como Botocudos devido ao círculo de pau que usavam no lábio
inferior.[2]
“A primeira denominação que os Botocudos receberam foi
de Tapuio, em oposição aos Tupi que habitavam o litoral da Bahia, e com os
quais os primeiros colonizadores tiveram
contato. Mais tarde, vieram Aimoré,
Guerén, Cren, kren, Ambaré, Guaimoré, Embaré, Kraknum, Endrejerecnum,
Engrekmun, Botocudo. No final do século
XIX, predominaram as auto denominações derivadas dos nomes dos “capitães”(
chefes de tribos ou grupos indígenas, assim chamados pelos portugueses) , de
acidentes geográficos ou dialetos: Naknenuk, Karkmun, Nakrehé, Etwet,
Takruk-Krak, Gut-Krak, Nep-Nep, Jiporok, Pojixá, Minajirum e Borun (homens
verdadeiros). Wied registrou o termo Engerecknung ou Endjerkmun (povos
corredores) no Baixo Jequitinhonha.”[3]
Esses índios ocupavam as
florestas de mata atlântica dos Sertões do Leste formados pelos vales do
Jequitinhonha, do Mucuri e do rio Doce e se autodenominavam Borun. Possuíam
estatura mediana, cor de bronze e pintavam o corpo de preto e vermelho. Os
cabelos e sobrancelhas eram raspados, mantendo ao redor da cabeça apenas uma
espécie de penacho.
Das florestas do Mucuri e
Jequitinhonha, de tempos em tempos, desciam ao litoral para destroçar as
povoações. Caio Prado Júnior sugere que estas “incursões intermitentes” que
permitiam um certo descanso aos estabelecimentos coloniais do litoral sul da
Bahia e do Espírito Santo se deviam ao crescimento vegetativo das nações indígenas
que, com a falta de recursos do seu habitat,
debandavam para o litoral. O morticínio advindo das incursões
restabelecia o equilíbrio.[4]
Nômades, os Borun viviam em
grupos, subgrupos, bandos ou famílias, devido às necessidades de sobrevivência
ou disputas pelo poder. São descritos como antropófagos, supersticiosos, sem
governo ou religião. A liderança era atribuída aos guerreiros mais habilidosos
na caça, pesca e coleta. [5]
Na região de Salto da Divisa
nas primeiras décadas dos oitocentos viviam perambulando entre os quartéis do
Salto e do Arco a horda do chefe Kerengnatnuk, conhecido pelos soldados como
“Capitão June”.
O contato com os colonos e a
destruição do habitat vai dizimar estas tribos ao longo do tempo.
2. A COLONIZAÇÃO
a . Primeiras Expedições
O território compreendido
atualmente pelo Estado de Minas Gerais, desde a segunda metade do século XVI,
vinha sendo trilhado por grupos de aventureiros litorâneos em busca das
riquezas anunciadas pelos índios nativos.
Este processo exploratório iniciado a partir do
nordeste da colônia, especificamente dos territórios baianos, propiciou o
reconhecimento de boa parte do norte mineiro, sem contudo traduzir a ocupação
efetiva destas terras.
A colonização propriamente dita foi desenvolvida de
forma gradual, sendo os índios conduzidos para o interior a partir do avanço
aleatório das boiadas que subiam o rio São Francisco e seus afluentes. A
conquista do interior traduziu-se em um deslocamento não só de efetivos
indígenas, fugindo à ganância dos colonizadores, como também de seguimentos
menos favorecidos na busca de terras livres da tutela da metrópole.
Dentre as expedições mais importantes, devido aos
resultados alcançados ou pelo volume de informações registradas sobre a região,
destacaram-se as comandadas por Francisco Bruza Espinosa, Sebastião Fernandes
Tourinho, Antônio Dias Adorno, Marcos de Azevedo e Fernão Dias Paes.
Francisco Bruza Espinosa (1554) embrenhou-se pelo
sertão com doze brancos, incluindo dentre eles o padre Jesuíta João de
Aspilcueta Navarro. Segundo este religioso, o grupo sertanista entrou naquele
território à procura de pedras preciosas e de ouro. Partiu de Porto Seguro
dirigindo-se para o Jequitinhonha, de onde seguiu rumo noroeste para a Serra
Geral, atual Grão Mogol, chegando finalmente às margens do rio São Francisco
onde assentaram uma aldeia “junto da qual passa um rio por nome Monail”.[6]
A expedição de Sebastião Fernandes Tourinho (1573)
partiu em canoas de Porto Seguro alcançando o rio Doce, de onde retornou com
notícias sobre pedras verdes. Tais descobertas iniciaram a lenda das esmeraldas
que incentivou sertanistas ao longo das décadas que se seguiram a buscar o
interior do país.[7]
Antônio Dias Adorno (1574), contando com cento e
cinqüenta portugueses e quatrocentos índios, subiu pelo rio Caravelas
descobrindo amostras de pedras verdes que, analisadas em Portugal, não
interessaram à Coroa.[8] Parte desta expedição teria
regressado pelo Jequitinhonha, sendo que um grupo chegou ao Jequiriça. Marcos
de Azevedo, já no século XVII, seguindo o itinerário de Fernandes Tourinho,
partiu do Espírito Santo, chegando ao rio Doce e a Barra do Suassuí. Depois de
atravessar uma lagoa, penetrou finalmente na região das esmeraldas de onde
retirou as pedras que enviou ao Rei.[9]
De todas as expedições que percorreram o território
mineiro, a mais importante foi, sem dúvida alguma, a de Fernão Dias Paes.
Entusiasmado com as informações sobre os sertões das
esmeraldas, o velho sertanista paulista organizou uma bandeira com o intuito de
descobrir as riquezas do sertão de Sabarabuçu. Para esse fim, recebeu do
Governador Geral a patente de Governador das Esmeraldas em 30 de outubro de
1672. Contando com a participação de vários familiares, dentre eles o filho
Garcia Paes e o genro Borba Gato, além da presença do experiente sertanista
Matias Cardoso de Almeida, a bandeira partiu de São Paulo em 21 de julho de
1674.
Por sete anos Fernão Dias percorreu os sertões ,
estabelecendo postos e plantando roças em diversos pontos, descobrindo finalmente
as pedras que julgou serem as esmeraldas. Com esta certeza, morreu de peste o velho sertanista com grande parte de seus índios, às margens
do rio das Velhas, quando se recolhia para Sumidouro.[10]
b. A colonização do Vale do
rio Jequitinhonha
A região do Médio Jequitinhonha, trilhada pelas
primeiras expedições, ficou esquecida a partir das descobertas auríferas e
diamantíferas na região metalúrgica e no Alto Jequitinhonha, em parte pela
falta de ouro ou diamante a explorar. Outro fator determinante deste abandono
foi a proibição da Coroa, que preocupada com o descaminho das riquezas,
contrabando e a grande migração para as minas, vedou a região utilizando-se da
barreira natural das matas densas. A ligação com o litoral ficou restrita ao
caminho novo que pelo sul levava ao Rio de Janeiro. Assim, as populações
nativas do Médio Jequitinhonha reinaram absolutas nas matas até as primeiras
décadas do século XIX.[11]
O Alto Jequitinhonha, que abrangia parte da Comarca
do Serro Frio, parte de Minas Novas e a demarcação diamantina, foi ocupado
efetivamente no século XVIII com os descobrimentos do ouro e diamante. Desde o
início, a Coroa monopolizou a extração e o comércio dos diamantes punindo com o
degredo os infratores.[12]
Em fins do século XVIII a decadência da mineração forçou
a diversificação econômica. Garimpeiros e mineradores voltaram-se para a
pecuária, para a lavoura de subsistência e de algodão ou simplesmente
abandonaram a região do Alto Jequitinhonha, deslocando-se para a confluência
dos rios Araçuaí e Jequitinhonha, região até então esquecida, aproveitando a
amenização da intolerância administrativa.
A corrente migratória para o Médio Jequitinhonha à
procura de riquezas ou terras para a agricultura iniciou a destruição das matas
ocupadas pelos Botocudos. Ainda no século XVIII, o inconfidente José Pereira
Freire de Moura, fugindo à prisão, refugiou-se na confluência do rio Araçuaí e
Jequitinhonha, fundando o aldeamento de Lorena dos Tocoiós.[13]
No início do século XIX, em 1804, o Capitão-mor de
Porto Seguro, João da Silva Santos com uma expedição composta de 66 pessoas,
subiu o Rio Grande de Belmonte, de Belmonte a Tocoiós, distante 400
quilômetros, encontrando os índios Maxacali.
Diogo Pereira R. de Vasconcelos assim descreveu a
expedição do Capitão-mor Santos :
“Do diário que tenho à mão de João da Silva Santos,
Capitão-mor da Vila marítima de Belmonte, aos 15 graus e 5 minutos de latitude
e aos 344 graus e 45 minutos de longitude, me informo da facilidade com que se
pode navegar o rio grande de Belmonte, como ele lhe chama, ou Jequitinhonha,
nome que se lhe dá na capitania de Minas. Começando sua derrota em o 1º de
outubro de 1804 na foz daquele rio, chegou a 10 de novembro à barra do Araçuaí
com 41 dias de viagem, incluídos neste número o das falhas que teve, já em
razão de aproveitar seus mantimentos, já por outros motivos. Descrevendo
circunstanciadamente sua derrota, assegura que da foz à serra de São Bruno, 66
milhas e meia, se pode navegar à vela; de São Bruno ao Salto Grande, 96 e meia
milhas de barra, bem que trabalhosa, diz ele, não é insuperável a navegação,
faz-se apenas preciso atravessar no Salto três quartos de léguas por terra, sem
maiores dificuldades. Neste lugar ( entre o Salto e a barra de São Bruno),
descobriram os antigos paulistas as minas de ouro da lagoa dourada, segundo as
observações do hábil regente dos Tocoiós, José Pereira Freire. Todo o país,
entre a serra de São Bruno e outra que corre ao norte, é habitado por patachós
ou catachós, que em toda a costa de Porto Seguro e dos Ilhéus nos têm feito
hostilidades. Também pela parte de oeste sustentam estes índios contínua guerra
contra o botocudo. Vencem-se igualmente os riscos da navegação no lugar em que
o ribeirão de São Miguel desemboca no rio Grande, ou Jequitinhonha, a 186
milhas da barra, até onde têm já
penetrado as patrulhas da guarda dos tocoiós. Deste ponto à barra do
Araçuaí não achou maiores estorvos, sendo assim que afirma que, desde Belmonte
até a aldeia de Lorena dos tocoiós, um
espaço de 271 e meia milhas, puderam ir 20 dias de viagem, logo se facilitem
alguns passos mais perigosos; não menos assegura que as margens em geral
prometem vantagens à agricultura e são aptas para criação dos gados. Avança,
enfim, que a margem do sul admite uma estrada de carro de 80 léguas, contanto
que se removam algumas dificuldades e que sempre se vão seguindo as picadas dos
índios os, que atalham as voltas e rodeios do rio, especialmente da barra de
São João para baixo. O maior perigo que considera nas hostilidades dos
catachós, ao mesmo tempo que deixa a temer por esta parte, uma vez que vista
sua relação da qual nos consta que, sendo por eles acometida sua bandeira com
uma descarga de pólvora aos ares, os pôs em retirada. Menos temíveis inculta os
botocudos, que sempre achou de paz nos encontros que com eles teve”[14].
O relatório do Capitão–mor de Porto Seguro determinou a
construção do caminho pelo rio, que passou a ser utilizado para transporte de
mercadorias e produtos entre Minas Novas e Belmonte.
Dois anos depois, em 1806, o Ouvidor de Porto Seguro,
José Marcelino da Cunha, seguindo ordens do Governador da Bahia, Conde dos
Arcos, viajou pelo Jequitinhonha visando o reconhecimento do território para um
futuro projeto de ocupação e povoamento. Com esse intuito o Ouvidor instalou os
quartéis de Salto Grande e Arcos com o
objetivo de garantir a navegação no rio e a defesa contra ataques indígenas. O
primeiro, nas proximidades das corredeiras do Salto da Fumaça, o segundo em
território baiano.
Subindo o rio Jequitinhonha, a expedição do Ouvidor José
Marcelino chegou a Tocoiós onde encontrou com José Pereira Freire de Moura e
parentes.
Um importante fator que contribuiu para a efetiva
ocupação da região foi o envolvimento da
Coroa instigada pelos ministros interessados no controle da navegação dos rios
do Sertão do Leste e motivada pelas constantes denúncias das “atrocidades”
cometidas pelos Botocudos nos povoados e aldeamentos de índios aliados.
O Príncipe D.
João, em Carta Régia de 13 de maio de 1808, enviada ao capitão-general Pedro
Maria Xavier de Ataide Melo, então governador da Capitania de Minas Gerais,
declarou "guerra ofensiva e justa”, visando a destruição e destribalização
dos índios.[15]
Para concretização deste intuito a própria Carta Régia
determinou a instalação de seis divisões militares ao longo do rio Doce.
A colonização do rio Jequitinhonha teve um tratamento
diferenciado devido às suas riquezas diamantíferas. Visando a preservação dos
direitos sobre os descobrimentos, a Coroa, a partir de 1811 designou companhias
de Dragões para guarnecerem a região.
A Sétima Divisão Militar, comandada pelo Alferes Julião
Fernandes Leão se instalou na região em 29 de setembro de 1811 com sessenta
soldados e alguns índios Maxacali do aldeamento de Lorena dos Tocoiós, fundando
nas margens do rio Jequitinhonha o povoado de São Miguel (atual Jequitinhonha).
A Companhia da Sétima Divisão imediatamente iniciou o
trabalho de construção de uma estrada rente à margem direita do rio, que partia
do recém fundado povoado de São Miguel até a Vila de Belmonte na província
baiana de Porto Seguro.[16]
A partir da construção da estrada, o Alferes Julião foi
instalando quartéis ao longo do rio Jequitinhonha, embriões de futuros povoados
e cidades como Itinga e Joaíma.
Conforme sugestão
do capitão-mor de Porto Seguro, o rio passou a ser utilizado para transporte de
mercadorias entre Minas Novas e Belmonte.
Subiam o rio Jequitinhonha, transportados em canoas, sal
e produtos raros. Belmonte recebia as produções mineiras: milho, algodão,
toucinho, carne seca, dentre outros. O mencionado Quartel do Salto, instalado
nas imediações da Cachoeira do Salto, assegurava esse comércio, impedindo o
contrabando de ouro e diamante e os ataques dos índios.[17]
Abandonado pelos baianos em 1808, o Quartel do Salto foi
ocupado pelo Alferes Julião cinco anos depois.
“A
então denominada oficialmente Guerra Justa teve início efetivamente com a
instalação da Sétima Divisão Militar, e teve também um aspecto fratricida,
pois, como já foi mencionado, os Maxacali, além de empregados em obras
públicas, na abertura de estradas, e como “interpretes ou línguas”, foram
utilizados no combate aos Botocudos.”[18]
Sob a proteção dos quartéis iniciou-se a ocupação das
matas da região. Por outro lado o governo provincial incentivou a instalação de
grandes proprietários, permitindo que tivessem o monopólio na construção de
estradas.
A instalação dos quartéis resultou no início do processo de devastação da mata atlântica
objetivando a utilização das terras para o plantio das lavouras e a destruição
dos refúgios indígenas. Bastou menos de um século de ocupação para reduzir a
cobertura vegetal a um décimo.[19]
O passo seguinte foi a completa extinção dos Botocudos e
dos grupos como os Macuni, Panhame, Puri, Koropó e outros, através da
destruição cultural, doenças e massacres.
Acossados, devido à destruição do seu “habitat”, os
índios foram pouco a pouco se entregando à proteção dos colonos. O resultado
desta submissão foi o abandono das antigas atividades como a caça e a pesca e a
adoção da agricultura nos moldes impostos pelos colonos. Paralelamente, a
diminuição do território aumentou as rivalidades tribais provocando guerras
entre os índios, que só favoreceram aos colonos.
Apoiada nos quartéis, a colonização da região se deu
inicialmente por duas vias:
do litoral, a partir de Belmonte subiram o rio colonos
comerciantes que se instalaram pelas povoações ribeirinhas. Da nascente do rio
desceram garimpeiros em busca de novas minas de diamante e lavradores em busca
de terra.
No fim do século XIX o Médio Baixo Jequitinhonha recebeu
uma segunda leva de migrantes provenientes da Bahia e das cidades mineiras do Alto
Norte: Espinosa, Taiobeiras e Salinas.
Cézar Moreno C. Tavares, cita as três origens e sentidos
do processo migratório para a região:
“... Primeiro, os migrantes que desceram da região
mineradora e penetraram a região através de Araçuaí ,e , depois, desceram o Rio
em sentido ao Baixo Jequitinhonha, passando pelo Médio. Segundo, aqueles que
foram subindo o Rio Jequitinhonha, oriundos do litoral baiano, na foz do Rio
Belmonte, pois o governo baiano vendo a importância do região e quantidade de
terras férteis e devolutas, que antes pertenciam aos índios, não pensou muito,
cuidou logo de incentivar os colonos a partirem para estas terras novas prontas
para a agricultura, essa frente tinha o caráter agropecuário. Por último, foi a
migração sertaneja também baiana, que, fugindo das secas no sertão baiano no
final do século XIX, se pôs em marcha na direção do Baixo Jequitinhonha,
passando por Pedra Azul (antiga Fortaleza), chegando as barrancas do Rio
Jequitinhonha, trazendo criadores de gado para formarem as fazendas e
faiscadores à procura de ouro e diamantes...”[20]
Considerado por muito tempo como região de grande
riqueza, fartura e belezas naturais, o Vale do Jequitinhonha apresenta-se
atualmente empobrecido devido à exploração desenfreada do passado. O Médio
Jequitinhonha onde se situa o município de Salto da Divisa apresenta o mais
alto índice de êxodo rural do vale. Seu
potencial cultural e natural ainda esperam a devida valorização.
Ainda predominam
como atividades econômicas do vale do Jequitinhonha, a pecuária, lavoura de
subsistência e a mineração. Os índios desapareceram violentamente no processo
colonizatório imposto à região. Das tribos guerreiras que povoavam os Sertões
do Leste, sobrevivem alguns remanescentes das tribos Maxacali, Patachó e Krenak,
nos vales do rio Doce e Mucuri.
C - SALTO DA DIVISA –
HISTÓRICO DO MUNICÍPIO
Salto da Divisa
situa-se na microrregião pastoril de
Almenara com área de 1334 km2. Limita-se ao norte com Jordânia (MG) e
Itamarantim (BA), ao leste com Itapebi e Itagimirim (BA) e ao oeste com Jacinto
(MG).
Os primeiros habitantes de Salto da Divisa foram os índios
remanescentes da tribo dos Botocudos, denominação atribuída devido ao uso de
botoques de madeira trespassando o lábio inferior e as orelhas.[21]
O município integra-se à região abrangida pelo vale
do Jequitinhonha, caracterizado por dois momentos de povoação branca nos
primórdios da colonização. O primeiro momento remete aos séculos XVI e XVII,
tendo a presença dos exploradores: Espinosa, Sebastião Fernandes Tourinho, Dias
Adorno, Fernão Dias Pais Leme, que à procura de pedras verdes, chegaram até às
proximidades do rio Araçuaí.[22]
O segundo momento constitui-se pela transformação do
rio Jequitinhonha em via de navegação, para o tráfego de víveres e viajantes,
entre os quais muitos contrabandistas de diamantes e ouro. Esse fator levou o
governo da província da Bahia a instalar um posto policial na localidade que se denominou Quartel do
Salto. Foi em torno desse quartel que a partir de 1808, surgiu o povoado
que recebeu o nome de Salto Grande.
Nas suas imediações, o transporte de mercadorias e viajantes era feito
margeando-se o curso do rio por terra, desde que nas proximidades do quartel a
navegação do rio era inviável, devido ao “Salto”, queda d’água de grande
importância do rio Jequitinhonha, na divisa da capitania de Minas com
Bahia, que deu a denominação ao Quartel.[23]
“Em Salto Grande, dada a existência de um trecho
encachoeirado do rio, o carregamento das canoas era transportado por tropas,
dos portos de cima, Cruz, portão e porto de areia, para o porto do meio.”[24]
Mais tarde o quartel foi abandonado pelo regimento
baiano. Sabendo desse abandono, em 1813, as autoridades mineiras incumbiram o
Alferes Julião Fernandes Leão da ocupação do quartel, o que possibilitou a
abertura de uma estrada à margem direita do Jequitinhonha, entre Salto Grande e
São Miguel.[25]
A ocupação do quartel pelas autoridades mineiras determinou
a ligação administrativa da região a Minas, através de Minas Novas (antiga Vila
do Fanado). Em 1811, o Alferes Julião já havia instalado o Quartel de São
Miguel, delineando a povoação de São Miguel, atual Jequitinhonha.
Esses dois quartéis instalados pelo Alferes “serviam para guarnecer o rio para impedir o
contrabando de ouro e diamante; combater, aldear e “civilizar” os índios
Botocudo”[26].
O Príncipe Maximiliano que esteve no Brasil entre os
anos de 1815 a 1817, conheceu o Quartel dos Arcos e o Quartel de Salto, quando
de sua viagem pelo Rio Grande de Belmonte.
“O Quartel do Salto fica à margem do rio (Belmonte),
num trecho mais largo do Vale, onde, estando baixo o nível d’água, numa rocha
nua e plana emergia, orlando de ambos os lados a corrente estreita. As
construções são de barro, cobertas com grossas e compridas placas da casca do
“pao d’arco”. O comandante, um cabo (oficial subalterno) homem de cor,
recebeu-me bem, dando-me um quarto num dos edifícios,. Tinha somente dois soldados
consigo, o resto partira em canoas para Minas; todos os quartos vazios estavam
ocupados pelos botocudos, a quem se permitia habita-los no intuito de
conservar-lhes as bôas disposições”.[27]
Através dos relatos de viajantes (Saint-Hilaire[28], Wied[29], Pohl [30]) que passaram pela região
abrangida pelo rio Grande Belmonte, compreende-se como os índios Botocudos do
Belmonte conheciam bem as matas e a região, pois eram hábeis caçadores e
grandes conhecedores de plantas e ervas; sem contar que superavam os obstáculos
naturais em áreas de difícil acesso. Os brancos (soldados, viajantes e
aventureiros) buscavam uma aproximação com eles, para melhor conhecer e
facilitar a vida dos quartéis.
Essa relação de troca e aprendizado pode ser
entendida pela localização isolada dos quartéis, o difícil acesso e a
manutenção dos caminhos. A criatividade e sabedoria dos índios tornavam-se
imprescindíveis para uma melhor relação com uma natureza extremamente difícil.
Os Botocudos “aprenderam
por experiência própria, que nos “quartéis” os mantimentos são às vezes parcos,
motivo pelo qual alguns dêles fizeram plantações “[31].
O viajante João Emanuel Pohl, mineralogista, médico
e botânico que esteve no Brasil entre 1817 e 1821, no seu percurso pelo rio
Jequitinhonha discorreu sobre o que presenciou no Quartel de Salto Grande:
“Salto Grande
forma os limites da capitania de Porto Seguro. É edificado sobre uma pequena
elevação, próximo à margem do rio. O lugar é insignificante e consta apenas da
casinha coberta de telha do cirurgião- Ajudante Cunha, onde ficamos, e quatro
pequenas cabanas de palha, que constituem
o chamado quartel, habitação dos soldados aqui estacionados, dos quais
só havia três. Todavia estavam em construção na margem do rio, dois armazéns de
sal cobertos de telha”.[32]
Pela Lei n.º 185 de 4 de abril de 1840 o povoado foi elevado
a distrito de paz, subordinado a Minas Novas, recebendo a denominação de São
Sebastião do Salto Grande. Neste período, o comerciante Carlos José Esteves,
detentor do monopólio de transporte de cargas e do comércio de sal e cereais, foi o grande empreendedor do povoado
construindo um casarão no Porto da Cruz
e várias casas e armazéns na Rua de Baixo.
Ainda na primeira metade do século XIX, foram construídos
entre a Rua de Baixo e o Porto de Areia, três calçadões, espécie de cais, que
facilitavam o transporte de mercadorias, protegiam a povoação contra enchentes
e serviam de base para construção de armazéns.[33]
Atualmente existem ruínas de apenas um destes calçadões.
No ano de 1870, o Distrito de Salto integrou-se ao município
de Araçuaí. Nesta época, Salto e Araçuaí em Minas Gerais e Belmonte na Bahia,
eram os principais centros comerciais do rio Jequitinhonha.[34] No final
dos oitocentos, Salto possuía 1.776 habitantes.[35]
O século XX assistiu o declínio da navegação no rio
Jequitinhonha, principalmente após a construção da Estrada de Ferro Bahia –
Minas, que facilitou o transporte de mercadorias entre dois Estados. A cidade
de Araçuaí, antes um grande entreposto comercial do nordeste de Minas, teve sua
importância reduzida. Salto substituiu gradativamente o comércio e a lavoura
pela pecuária.
Em 1913, Salto passou a fazer parte do município de
Jequitinhonha, então criado. Pertenceu em seguida aos municípios de Almenara e
de Jacinto.
Na década de 20, os grandes latifundiários e suas boiadas
ocuparam as matas do distrito de Salto e conviveram com as roças de milho, arroz, mandioca,
feijão e cana de açúcar. O surto de progresso se refletiu no aumento da população
incentivando o comércio e a construção de armazéns.
“O comércio através de canoas pelo Rio Jequitinhonha, de
Salto a Pedra Branca (hoje Itapebi) e a Belmonte ganhou notável impulso. Salto
passou a produzir e a exportar cereais, carne, toucinho, peles, poaia,
recebendo em troca, do litoral, via Belmonte, sal, querosene, bebidas e
produtos manufaturados. Ainda não havia estrada de rodagem. As tropas de burros
eram o único meio de transporte entre Salto e localidades vizinhas. Dezenas de
animais carregados entravam e saíam de Salto todos os dias. Com os seus
cincerros, bonecas e penachos à cabeça as tropas davam à localidade um colorido
especial. Toda cidade do interior, em sua história, deve ter experimentado
coisa semelhante.”[36]
Pelo decreto-lei n.º 1.058 de 31 de dezembro de 1943, Salto
Grande passou a pertencer ao recem-criado município de Jacinto.[37]
Em 27 de dezembro de 1948, pela Lei n.º 336, Salto Grande é elevado à categoria de município com a
denominação atual .[38]
A pecuária ainda é preponderante, caracterizando o município
como grande criador e exportador de gado bovino. A criação de equinos, suínos e
muares acompanham essa atividade. Além disso, Salto da Divisa sobrevive através
do fundo de participação dos Municípios, da pecuária extensiva e do comércio
varejista. A mão-de-obra é locada no campo, na administração pública e no
comércio.[39]
Atualmente a população de Salto da Divisa soma 5.408
habitantes na área urbana e 2.380
habitantes na área rural.[40]
D – AS CACHOEIRAS
DO TOMBO DA FUMAÇA
Situado na divisa entre os Estados de Minas Gerais e Bahia,
o conjunto de quedas denominadas Cachoeiras do Tombo da Fumaça determinou a
ocupação da região devido ao entrave que significou à navegação e transporte de
mercadorias.
Nos primeiros anos do século XIX, o Ouvidor
de Porto Seguro instalou um Quartel nas imediações do Salto com o intuito
de garantir a ocupação e navegação do rio Jequitinhonha bem como inibir o contrabando e ataques indígenas. Segundo o naturalista
Maximiliano, príncipe de Wied Von Neuwied, o primeiro destacamento instalado em
Salto era formado por cerca de sessenta homens. Devido ao descontentamento dos
soldados indígenas, o destacamento foi transferido para o Quartel dos Arcos na
ilha de Cachoeirinha (Bahia).
O Quartel do Salto foi então ocupado pelo Alferes Julião
(comandante da Sétima Divisão)com mais dez
a doze homens. [41]
A julgar pelas informações dos viajantes, os índios da
região relacionavam-se bem com os poucos soldados do Quartel. Nas primeiras
décadas do século XIX, a horda do chefe Kerengnatnuk, conhecido por “Capitão
June”, vivia entre os quartéis do Salto
e dos Arcos, sendo bem recebido em ambos.
O príncipe Maximiliano percorrendo o trecho do caminho entre
o Quartel dos Arcos na Bahia e Salto, no ano de 1816, assim o descreve :
“Perto desse posto militar, uma grande cascata torna o Rio
todo inavegável, sendo necessário saltar nesse ponto e prosseguir em terra por
sobre uma montanha; acima do “Quartel”, embarca–se novamente em outras canoas.
Minha Bagagem foi descarregada e transportada para o “destacamento”. O caminho
galga uma ribanceira íngreme, onde se construiu um alpendre para os produtos
vindos de Minas, aí desembarcados. Em cima, entra–se em um mato alto, onde as
bromelias atapetam o solo, formando um balsedo impenetrável;
Um dos seis quartéis[42]
instalados ao longo do rio Jequitinhonha, o Quartel do Salto cumpriu sua função
como guardião do caminho fluvial e como polo colonizador. Ao redor das cabanas
dos soldados, surgiu o povoado de Salto Grande, atual cidade de Salto da
Divisa.
O conjunto das Cachoeiras
Conforme relatório elaborado no final do século XIX, o rio
Jequitinhonha se dividia em duas partes, rio de pedra e rio de areia. O trecho
onde se situa as corredeiras configuram o ponto extremo do rio de pedras. O
afunilamento causado pelos rochedos, obrigando grande volume d’água a seguir
pelo estreito corredor, forma uma série de corredeiras e cachoeiras que assombram os observadores pela violência
e beleza.
O viajante austríaco Johnn Emanuel Pohl, em sua passagem
pela região em 1820, descreve suas impressões sobre esse fenômeno natural :
“Nesse canal rochoso se encontram as três principais
cataratas do Jequitinhonha, que, merecidamente, têm o nome de Salto Grande,
sendo que cada uma delas se divide em várias quedas de água. A primeira cachoeira tem três interrupções,
numa extensão de 90 metros de comprimento, caindo da altura de onze metros. As
águas precipitam-se aqui com estrondoso ruído, espumando entre massas de rocha,
num abismo insondável e a sua espuma verde-amarelada ressalta como uma coluna de
pouco mais de dois metros de altura. A violência deste rio estreitado, que
antes corria com a largura de 450 metros, esculpiu nos rochedos as formas
bizarras que agora admiramos. Mesmo a considerável distância da cachoeira,
ainda se nota a violenta erosão do rio que, durante a estação das chuvas,
inunda as margens pedregosas deixando as massas de granito ora irregulares, ora
arredondadas, e com inúmeras cavidades umbilicadas que a água produz pelo
atrito das pedrinhas arrastadas que rodopiam sobre as massas de pedras,
formando assim aquelas escavações. A segunda cachoeira, a mais violenta, está a
uns 100 metros a leste da anterior. Se já estávamos encantados com a visão das
outras quedas de água, muito mais iríamos ficar agora com a contemplação desse
majestoso e sublime espetáculo da Natureza, que se pode ver, mas não descrever.
Aqui acampamos à margem e ficamos admirando as maravilhas da Natureza que
diante de nós se apresentavam em seu máximo esplendor. Cercados por águas, com
múltiplos arco-íris difundindo as suas cores, entregamo-nos, mudos e
estupefatos, a essa soberba paisagem natural”[43]
Tal descrição, feita a 179 anos atrás, não poderia ser mais
exata. O conjunto natural extasia o observador ainda hoje, quando se sabe que o
volume de água já não é mais o mesmo devido a degradação do meio ambiente.
Para se chegar à
grande cachoeira do “Tombo da Fumaça” é necessário andar sobre o leito
de pedras, procurando sempre um lugar mais adequado para o próximo passo.
Anda-se uns duzentos metros até o local da queda. A caminhada no entanto
compensa.
A cachoeira denominada atualmente de “Tombo da Fumaça”, a
mais impressionante das quedas d’água, localizada no trecho em que o rio
estrangulado pelas pedras força a passagem numa velocidade e força
assustadoras, provoca com seu impacto uma névoa de vapor como uma cortina de
fumaça. O rio prossegue o seu curso transpondo as barreiras ou se moldando em
curvas e saltos, acalmando-se um pouco perto da pedra do
“Canta Galo”, uma ilha rochosa situada logo após a última cachoeira que possui
uma significativa cobertura vegetal, composta de cactos e bromélias.
Outras formações rochosas se destacam na paisagem como: a
“pedra do Jacaré” que se assemelha a esse réptil e a “Pedra do Bode” que tem
esse nome por ter abrigado bodes que
tentavam escapar de uma enchente. A “Garganta do Diabo”, outro local apreciado
pelos moradores, apresenta uma forte corredeira devido ao desnível e
estreitamento do rio.
Destaca-se também o “Buraco”, uma reentrância na rocha que
acumula peixes e crustáceos na época de menor volume d’água , local muito
procurado pelos pescadores.
A
cobertura vegetal e a fauna
Nas primeiras décadas da colonização a região apresentava
uma cobertura vegetal expressiva de mata atlântica, que constituía um obstáculo
para o transporte de produtos. Atualmente existem fragmentos de mata atlântica
com trechos bem preservados no lado baiano. Entretanto predominam nas margens
“gramíneas formadoras de pastagens” e a ocorrência menor de vegetação de clima
úmido e seco.
Quanto à fauna, os peixes constituem a grande riqueza do
município, sendo encontradas as espécies : piau, roncador, piabanha, bagre,
caçari, carpa, timboré, piampara, surubim, robalo, dentre outros. Esta
incidência de peixes favorece a ocorrência de lontras, pacas, cutias, capivaras
e cobras. A riqueza da fauna de peixes do rio Jequitinhonha e consequentemente
do trecho estudado de Salto da Divisa, determinou a sua inclusão nas áreas de
prioridade para conservação da biodiversidade do Estado de Minas Gerais, como
área de importância biológica extrema.[44]
A cidade
de Salto da Divisa
O núcleo urbano de Salto da Divisa mantém sua fisionomia
marcada pela implantação em sítio elevado desfrutando da privilegiada posição
em relação à paisagem dominada pelo rio Jequitinhonha. A povoação concentra-se
junto à sua margem direita, enquanto na margem esquerda localiza-se a ilha
conhecida como “da Marinha”, formada por um braço secundário do rio que se
junta ao curso principal no trecho ocupado pelas cachoeiras do “Tombo da
Fumaça”. Esta ilha praticamente desocupada recebe o uso ocasional de pastagem e
constitui-se em área de importância paisagística para a ambiência local,
determinada pelo Jequitinhonha e suas cachoeiras, junto à Salto da Divisa.
A arquitetura civil da cidade compõe-se em grande parte de
seu conjunto, de construções de pequenas dimensões e sem maior apuro
arquitetônico. Em meio a esse casario, veem-se algumas edificações tipicamente
antigas, raros exemplares dos primeiros tempos do arraial de Salto Grande. Do
período inicial da ocupação do Salto da Divisa existem como remanescentes as
ruínas do cais, construído em pedra, hoje tomadas pelo mato e duas construções
na rua do Cais, que funcionavam como depósitos de sal, atualmente em processo
de arruinamento.
Apesar das construções mais recentes, a maioria do casario
conserva a simplicidade de um partido construtivo tradicional onde predominam
as casas térreas. Destaca-se uma única edificação assobrada do século XIX, de
dois pavimentos, sede da Filarmônica 1º de Maio, localizada à rua Direita
esquina de rua Sabino Pinheiro. Apresenta características de uma construção
colonial, quer pelas linhas arquitetônicas, quer pelo material empregado. Suas
duas fachadas principais trazem uma equilibrada composição de vãos com quatro
portas no pavimento térreo, duas em cada fachada, e oito janelas, quatro em
cada fachada. Os vãos tem enquadramento em madeira, bem como os cunhais. A
cobertura é em 04 águas de telhas coloniais, arrematada por beirais em
cachorro. Merece, sem dúvida, ser amparado por medida legal de proteção pelo
município.
Dentre os vários elementos de grande autenticidade que
marcam a harmonia da paisagem local aparece o verde dos quintais com seus
pequenos arvoredos e os jardins.
A
cobertura vegetal
Nas primeiras décadas da colonização a região apresentava
uma cobertura vegetal expressiva de mata atlântica, que constituía um obstáculo
para o transporte de produtos. Atualmente existem fragmentos de mata atlântica
com trechos bem preservados no lado baiano.
Entretanto predominam nas margens “gramíneas formadoras de pastagens” e a
ocorrência menor de vegetação de clima úmido e seco.
A fauna
Quanto à fauna, os peixes constituem a grande riqueza do
município, sendo encontradas as espécies : piau, roncador, piabanha, bagre,
caçari, carpa, timboré, piampara, surubim, robalo, dentre outros. Esta
incidência de peixes favorece a
ocorrência de lontras, pacas, cutias, capivaras e cobras.
A riqueza da fauna de peixes do rio Jequitinhonha e
consequentemente do trecho estudado de Salto da Divisa, determinou a sua
inclusão nas áreas de prioridade para conservação da biodiversidade do Estado de Minas Gerais, como área de importância biológica extrema.[45]
O
patrimônio edificado
Do período inicial da ocupação do Salto da Divisa existem
como remanescentes as ruínas do cais, construído em pedra, hoje tomadas pelo
mato e duas construções na rua do Cais, que funcionavam como depósitos de sal,
atualmente em processo de arruinamento. A sede da Filarmônica 1º de Maio, única
construção assobradada do século XIX,
está em bom estado de conservação.
As edificações na margem do rio, situadas nas ruas Beira
Rio, Boa Vista, Angelina Nascimento, Sabino Pinheiro, são despojadas.
A
população
A população de Salto da Divisa em sua maioria apresenta a
tez morena, cobreada que remete a uma ascendência indígena.Um bom número dos habitantes ribeirinhos
vivem da pesca e da fabricação de brita (processo rudimentar de quebra das
pedras do leito do rio transformando-as em britas). As mulheres lavam roupas
utilizando as águas do rio e o leito pedregoso.
A barragem
e reservatório de Itapebi
A construção da Usina
Hidrelétrica de Itapebi a 118 km da foz
do rio Jequitinhonha, próximo a Cachoeirinha, Estado da Bahia, segundo as
Empresas Petroquímicas do Brasil S. A., têm como objetivo a geração de 375 MW
de energia elétrica no prazo de 5 anos a
partir do início das obras. Esta energia gerada, contribuiria para suprir os “déficits energéticos
previstos para os Estados de Minas Gerais e Bahia servindo como ponte de
interligação dos sistemas sul-sudeste
com o nordeste.”[46] O
reservatório previsto, terá 65 km2, abrangendo os municípios de Itapebi,
Itagimirim e Itarantim no Estado da Bahia e Salto da Divisa no Estado de Minas
Gerais.
As conseqüências deste empreendimento para o município de
Salto da Divisa são calamitosas. Além de afetar a vida de cerca de 235 pessoas
ameaçando as suas atividades econômicas e a destruição de 50 moradias, as águas
represadas ameaçam cobrir o conjunto de cachoeiras do Tombo da Fumaça,
referencial histórico, cultural e paisagístico da cidade e do Estado de Minas Gerais.[47]
Para conter as
ameaças do projeto de construção da barragem, a comunidade de Salto da Divisa
liderada pelo Movimento de Cultura Popular Saltense – MCPS – criou o Movimento
S.O.S. Tombo da Fumaça, que vem se mobilizando junto às instâncias federais e
estaduais, visando a proteção do conjunto paisagístico das Cachoeiras do Tombo
da Fumaça :
“O Movimento S.O.S. Tombo da Fumaça surgiu a partir da
constatação dos elevados custos sócio-econômicos, culturais e ambientais que a
construção da Barragem de Itapebi trará para nossa região, em particular Salto
da Divisa. Constituído por cidadãos cônscios, o Movimento entende que não é
justo que o Vale do Jequitinhonha e o Estado de Minas Gerais paguem com a
descaracterização de uma de suas paisagens mais belas, que é o conjunto das
cachoeiras do Tombo da fumaça. A descaracterização do Tombo da Fumaça, e a
não-garantia dos direitos sociais da
população diretamente e indiretamente atingida, é um preço que não estamos
dispostos a pagar pela construção da barragem.
O que o S.O.S. Tombo da Fumaça quer é que o projeto de
construção seja reformulado de forma a preservar as CACHOEIRAS DO TOMBO DA
FUMAÇA E GARANTIR OS DIREITOS SOCIAIS DE NOSSA GENTE. Somos por um
desenvolvimento com justiça social e que traga benefícios reais para nossa
região, pois estamos cansados de ser usados como cobaias de projetos que, ao
invés de desenvolver, atrasam e aprofundam a miséria do Vale do
Jequitinhonha.”.[48]
E - A
PROTEÇÃO DO CONJUNTO
A Bacia do rio Jequitinhonha, devido ao seu valor natural,
foi tombada pela Constituição Estadual de 1989, nos Atos das Disposições
Transitórias, artigo 84, estendendo a proteção ao Conjunto das Cachoeiras de
Salto da Divisa.
Por outro lado, a Lei n.º 080/98 de 27 de abril de 1998, do
Prefeito Joaquim Abagaro de Oliveira, declarou a Cachoeira do Tombo da Fumaça e
adjacências como “Área de Paisagem Natural Notável”, ficando vedada qualquer
obra ou serviço que viesse a alterá-la.
Infelizmente, no dia 26 de abril de 1999, a Câmara Municipal
de Salto da Divisa, ignorando os protestos da comunidade, aprovou através da
Lei n.º 092/99, a revogação da Lei n.º 080/98.
A região de Salto da Divisa está relacionada como “Reserva
Particular do Patrimônio Natural Federal” – RPPN – por ser considerada de
relevante importância para a proteção da biodiversidade.[49]
O IEF, no relatório denominado “Levantamento do Potencial
Ecoturístico e Paisagístico do Tombo da Fumaça”, realizado em abril de 1999,
concluiu :
Levando em consideração principalmente os aspectos
paisagísticos da área conhecida como “Tombo da Fumaça”; os vários pontos de
belezas cênicas notáveis; o aspecto sócio - histórico - cultural do município
de Salto da Divisa, e mais especificamente, da importância que representa o Rio
Jequitinhonha para a população local, pode-se afirmar com absoluta convicção
que a Cachoeira do “Tombo da Fumaça”e áreas adjacentes, apresentam um grande
potencial para o desenvolvimento de atividades ligadas ao turismo ecológico,
aliado à programas e trabalhos de educação ambiental .
(...)
Finalizando, observa-se grande potencialidade para criação
de uma Unidade de Conservação no município. Sugere-se então, a criação e
implantação de uma Área de Proteção
Ambiental – APA, devido aos usos diretos e indiretos a que são atribuídos
pela ocupação atual da área, abrangendo todas as atrações descritas acima, no
item “Potencial Ecoturismo”.[50]
Em que pese o inegável valor de todo o conjunto, reconhecido
no nível federal e estadual pelos órgãos da área de meio ambiente e pela Constituição Estadual, o
seu tombamento pelo IEPHA/MG vem de encontro aos anseios da comunidade local
preocupada em preservar para as gerações futuras as belezas naturais do seu
município.
No momento em que paira a ameaça do desaparecimento do
Conjunto Paisagístico das Cachoeiras do Tombo da Fumaça, devido a construção da
barragem de Itapebi no Estado da Bahia, o seu
reconhecimento como Patrimônio Cultural dos mineiros é mais que
pertinente. A proteção de todo o
conjunto pelo instituto do tombamento é a sua salvaguarda, impedindo o seu
desaparecimento sob as águas que o moldaram.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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do Tombo da Fumaça. Teófilo Otoni: IEF,
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-11/12 p. ; 29 mai, -15/16 p.; 9 jun, -17/18 p.; 11 de jun., -13/14 p.; 12
jun., -15/16 p.; 16 jun., -21/22 p.; 19 jun., ; -15/16 p.; 23 jun.,- 9/10 p.;
26 jun., -15/16 p.;2 jul., ; -11/12 p.; 8 jul.,- 15/16 p.; 10 jul.,- 9/10
16 jul., - 9/10 p.; 23 jul., - 14 p.; 29
jul., - 19/20 p.; 26 ago., - 15/16p.; 25 ao, 11p.; 30 set. 8 p.; 2 out.-13 p.; 30 out. -12 p.; 31 jan. -11/12/13
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- WIED-NEUWIED, Maximiliano Philipp, Príncipe
Von. Viagem ao Brasil. São Paulo: Nacional, 1940.
[1] VASCONCELOS, 1974. p. 124.
[2] Idem, 1974. p.131,132.
[3] TAVARES, 1998. p.34.
[4] PRADO JÚNIOR, 1981. p.49
[5]TAVARES, 1998. p.36, 37.
[6] VASCONCELOS, 1974. p.51,55.
[7] CALMON, 1971. V.1. p. 313.
[8] Idem, 1971. V. 1. p. 313,
314.
[9] VASCONCELOS, 1974. p. 66,
67.
[10] FRANCO, 1940. V. 181, Cap.
12, 13
[11] PRADO JÚNIOR, 1981. p.76.
[12] TAVARES, 1998. p.19
[13] Idem, 1998. p. 26.
[14] VASCONCELOS, 1994. p. 150,
151.
[15] TAVARES, 1998. p. 27.
[16] TAVARES, 1998. p. 27, 28.
[17] GUIMARÃES, 1960. p.92.
[18] TAVARES, 1998. p.30
[19] TAVARES, 1998. p. 31 a 33.
[20] TAVARES, 1998. p. 39 a 63.
[21] SANTOS, 1997. p. 2.
[22] SOL, 1981. p. 15
[23] SALTO da Divisa. Enciclopédia
dos Municípios brasileiros, 1959. P. 114.
[24] SOL, 1981. p. 16.
[25] Idem, nota n.º 29
[26] TAVARES, 1998. p. 30.
[27] WIED-NEUWIED, 1940. p. 251.
[28] SANIT-HILAIRE, 1975.
[29] WIED-NEUWIED, 1940. p. 236.
[30] POHL, 1976. p. 350.
[31] WIED-NEUWIED, 1940. p. 242.
[32] POHL, 1976. p. 350.
[34] SOL, 1981. p. 22.
[35] TAVARES,1998. p. 70.
[36] SOL, 1981. p. 28
[37] SANTOS, 1997. p. 3.
[38] SALTO da Divisa, p. cit. p.
114.
[39] SANTOS, 1997. p.10.
[40] 1º CENSO cultural ... ,1995.
p. 110.
[41] WIED NEUWIED, 1940. P. 236.
[42] Segundo o príncipe
Maximiliano, existiam ao longo do rio, os Quarteis dos Arcos, Estreito, Vigia,
S. Miguel e Tucaios de Lorena.(WIED NEUWIED, 1940. p.227.)
[43] POHL, 1976. p. 351.
[44] BIODIVERSIDADE, 1998. p. 46
[45] BIODIVERSIDADE, 1998. p. 46
[46] AHE ITAPEBI – Estudo de
impacto ambiental . 1996. p.7/2.
[47] AHE ITAPEBI – Estudo de
Impacto Ambiental . 1996. p. 4/28.
[48] CARTA ABERTA À POPULAÇÃO.
1999.
[49] Biodiversidade em Minas
Gerais, 1998. p.59.
[50] BRANDÃO,1999. p. 8.
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