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terça-feira, 9 de junho de 2020

O BEM CULTURAL E SUAS BOAS E MÁS MEMÓRIAS:


O BEM CULTURAL E SUAS BOAS E MÁS MEMÓRIAS:


FOTO: Em Bristol, no Reino Unido, manifestantes derrubam estátua de comerciante de escravos. Fonte: Jornal GGN - 08/06/2020.



No calor das dores e das revoluções, muitas coisas que simbolizavam o opressor foram destruídas de forma impensada. 
Muitos castelos foram depredados e destruídos durante a Revolução Francesa. 
A própria Notre Dame quase foi destruída. 
Temos que ter o bom senso e o cuidado para mudarmos o foco em relação aos bens que simbolizam o opressor. Versalhes, que custou muito sangue francês está lá. 
Campos de concentrações nazistas foram preservados para que não esqueçamos o que ocorreu e para evitarmos que se repita tais barbaridades. 
Não é rasgando documentos sobre a escravidão que vamos mudar o racismo ou a discriminação. 
Devemos incorporar novos significados a esses monumentos, imprimindo nova carga de memória sobre as ações dos Homens do passado e do passado recente. 
Serão objetos didáticos e poderão nos ajudar a entender como funcionava a mente e a moral do homem escravocrata, do homem opressor, do homem racista, preconceituoso e machista. 

O caminho não é a destruição pura e simplesmente de obras de arte em homenagem a personalidades que se destacaram no passado. Isso é um ato de diminuição da memória.
De empobrecimento da análise crítica sobre os fatos do passado.
O caminho é redefinir o papel dos personagens do passado sob o ponto de vista da mentalidade e moral da época.
São homens esses pseudo-heróis que foram alçados a monumentos.
Homens inteiramente adaptados ao meio em que viviam.
Sujeitos a erros e acertos da sociedade em que viviam.
Não podemos é perder o foco. Não são santos.
São homens falhos com qualidade e defeitos e como tais devem ser apresentados às novas gerações.
Destruir casas de ex-ditadores ou monumentos centenários em homenagem a Cristóvão Colombo ou aos Bandeirantes paulistas é negar o papel transformador destes expoentes da história.
Devemos sim, apresenta-los como são: Homens movidos por desejos, ambições e com uma moral deturpada de época.
Não é destruindo que poderemos ensinar alguma coisa ou mudar alguma atitude. 
É discutindo, analisando, mudando leis e lutando. 
Formando novas gerações, utilizado esses objetos de memória e de novas e terríveis memórias para nunca esquecermos o que se passou e evitarmos que voltem a acontecer.

COMPLEMENTANDO:
A questão não é a criação de novas estátuas e sim a destruição das que existem há décadas ou talvez há séculos. 
Toda revolução ou revolta trás sua carga de vandalismo destruidor de memórias - templos, castelos, monumentos comemorativos - que podem prestar um desserviço à sensibilização e conscientização das novas gerações. 
Não se falou em preservação de estátuas de monstros como Hitler ou Mussolini em praça públicas, mas elas poderiam sim, serem acondicionadas em museus ou espaços de memória com toda a carga de responsabilidades que carregam. 
A maior preocupação é com o alcance destas manifestações destruidoras dos falsos "heróis". 
Até onde iria essa revisão destruidora das personalidades representadas em estátuas e monumentos? 
Destruir o monumento aos Bandeirantes seria aceitável? 
Claro que não devemos manter viadutos, ruas e praças com nomes de ditadores militares ou torturadores. 
Mas destruiríamos monumentos dedicados a D. Pedro I e D. Pedro II? 
Destruiríamos a casa de um comandante Farroupilha assassino de uma brigada negra? 
Não seria mais adequado usá-la como um museu dedicado à escravidão, à denúncia da opressão e ao racismo sem esquecer a quem pertenceu? 
Tem que haver limites. Mas quem definiria os limites? 
O herói de hoje pode ser o bandido de amanhã. 
Nenhum deles são santos ou puros. 
São homens do tempo e da moral que vivenciaram e é desta forma que devem ser estudados e avaliados para que a humanidade aprenda a não cometer novamente os erros do passado.

O QUE NÃO VEJO NÃO EXISTE?
O Absurdo dos absurdos.
Como dizia um grande mestre. "Quem não tem pecado que atire a primeira pedra".
Esquecem que os seres humanos são fruto dos seus tempos e agem conforme a moral e ética deste tempo.
Modismo barato e hipócrita.
Não é destruindo estátuas e monumentos que se resolve preconceito e racismo.
Se resolve ensinando, apontando os erros do passado, resolvendo as questões legalmente e moralmente, no presente e acenando para o futuro.
Temos que analisar os fatos e personagens com senso crítico e não com ódio irracional.
Não se apaga preconceito e racismo com destruição e ódio e sim com inteligência, análise, debate e mudança interior e consequentemente, exterior. 


Museus são lugares de memória mas as Cidades objetos, casa, casarões, sobrados, monumentos, estátuas são coisas de lembrar. 
Todas as coisas materiais e imateriais que tocam uma comunidade, são coisas de lembrar, de memória e elevação da autoestima de um povo. 
São lugar de memória se fazem as pessoas lembrarem de si mesmas e a se pensarem como parte do lugar. Estátuas são homenagens sim, mas também fazem lembrar e podem fazer repensar a história de um lugar. 
Por isso mantemos em algumas cidades coloniais, os pelourinhos e marcos de vila. 
Por isso homenageamos e fazemos lembrar o fundador de uma cidade ou um conquistador e desbravador independente do seu caráter ou qual era o seu objetivo ao embrenhar pelos sertões. 
Não é só para homenagear, mas para lembrarmos do feito deste sujeito e de seu grupo e por que estamos aqui. 
Podemos repensar essa lembrança reforçando-a nas placas das estátuas e nas escolas e livros didáticos. Destruir essas estátuas é destruir memórias.


O NOVO HOMEM VELHO:
O Passado e o presente não mudam só porque destruímos uma estátua, um monumento, um documento.
Esquecimento não transforma o mundo.

Ódio e atitudes irracionais não transformam o mundo.
Conhecimento, análise, debate, transparência, educação, leis e transformação interna, sim.
Se transforme na mudança que deseja para o mundo
e o mundo será um novo mundo.


A MUDANÇA QUE QUEREMOS:
A mudança que queremos tem que ocorrer dentro de nós e não fora.
A mudança externa virá quando a mudança interna acontecer.
A destruição de objetos de lembrar só nos fazem esquecer.
Não nos muda.
O objeto de lembrar tem uma incrível capacidade de armazenar memórias e podemos lhes atribuir novas memórias e conhecimentos. Os objetos de lembrar podem transmitir essas novas memórias atribuídas, às novas gerações, desde que consigamos sensibiliza-las para escutarem o que eles dizem.
A destruição de objetos de lembrar é um ato de violência irracional e diz mais sobre quem destrói do que sobre quem estão querendo esquecer. Não se clareia um quarto apagando uma vela.
Não mudamos o mundo apagando memórias.
Sejamos a mudança que queremos ver surgir.

 (Carlos Henrique Rangel).

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