O CONJUNTO ARQUITETÔNICO DA PRAÇA RUI
BARBOSA
(Praça da Estação)
(Praça da Estação)
Portal do
Tempo
Autores: Carlos Henrique Rangel -
Historiador
Lílian Oliveira - Historiadora
I –
Antecedentes
A – Considerações Preliminares
Estação
Central de Belo Horizonte, atualmente Museu de Artes e Ofícios com seu entorno
revitalizado.
Fonte:
IEPHA/MG.
Desde os
primeiros agrupamentos humanos, a escolha de um lugar para se viver
temporariamente ou mesmo para se instalar definitivamente obedeciam a alguns pré
requisitos básicos: a existência de fontes de água, rios ou lagos e terras
férteis e ricas em caça. A medida que o homem foi se fixando e evoluindo
tecnologicamente, motivações mais complexas surgiram: terras ricas em metais
preciosos, fácil locomoção, entroncamento de estradas, e após a revolução
industrial, paradas de trens de ferro.
As primeiras cidades mineiras
surgiram em função do ouro e pouco depois do diamante. Os agrupamentos dos
aventureiros se formaram ao longo dos rios e lavras acompanhando as curvas dos
terrenos e o curso dos rios.
A capital mineira que se pretendia
construir em fins do século XIX obedecia a outros critérios, outras motivações.
Deveria ser nova, moderna sem traços do passado. Fiel a este signo de
modernidade deveria apagar os vestígios visíveis do passado e começar de novo
sobre o risco positivista traçado em papel. Tudo novo, como novo deveria ser o
elo com o mundo. Nada de caminhos de tropeiros, mas um caminho traçado e
definido por trilhos de ferro como a cidade que nascia. Elo de ligação com o
mundo, ao mesmo tempo porta de entrada da nova cidade trazendo os materiais para
construir, gente para construir e gente para viver.
A estrada de ferro
conseqüência direta da Revolução Industrial tornou-se em pouco tempo o melhor
meio de transporte, permanecendo incontestável até o advento do automóvel e da
aviação. Rápido e eficiente, como deveria ser a construção do novo centro
político mineiro.
B – Os Caminhos de Ferro
Com a primeira
Revolução industrial iniciada na Inglaterra no século XVIII e a partir do século
XIX se estendendo pelo restante da Europa, começou a concentração dos meios de
produção em fabricas, substituindo as oficinas caseiras. Está concentração
somente foi possível devido às invenções do século XVIII, principalmente o tear
mecânico e a máquina a vapor. O aumento da produção acarretado pelas mudanças no
sistema de produção levou à necessidade de ampliar os mercados e dinamizar a
distribuição dos produtos .
Assim a busca por novos meios de transportes
de mercadorias e passageiros começaram a ser esboçados a partir dos primeiros
anos do século XIX: Em 1802 surgiu a denominada “dirigência a vapor para
estrada” construída pelos ingleses Richard Trevithick e Andrew Vivian; Em 1808
Richard Trevithick apresentou a “Catch me Who Can”. Em 1825 surgiu a primeira
linha férrea considerada prática, que ligava Darlington a Stockton.
A
partir do concurso promovido pela Estrada de Ferro Liverpool-Manchester em 1829,
surgiu a máquina denominada Rocket, construída por Stephenson. Esta máquina
vencedora do concurso começou a percorrer o trajeto Liverpool-Manchester somente
a partir de 1830.
No Brasil, a necessidade de meios de transporte ágeis e
eficientes para o escoamento das produções agrícolas do interior para o litoral
foi sentida ainda nas primeiras décadas do século XIX. Já em 1835, o Regente
Padre Feijó promulgou uma lei que concedia favores aos interessados em implantar
no país, uma estrada de ferro que pudesse ligar o Rio de Janeiro à província de
São Paulo e Minas Gerais. Está lei, no entanto, apesar da várias tentativas de
alguns interessados, não surtiu efeito concreto .
Somente a partir da
segunda metade do século XIX, é que o empresário e futuro Barão e Visconde de
Mauá, Irineu Evangelista de Souza, conseguiu construir a primeira estrada de
ferro do Brasil. O projeto de Irineu era construir uma estrada que ligasse o Rio
ao interior de Minas Gerais a partir de Porto Estrela seguindo inicialmente até
Petrópolis.
O projeto do empresário foi aprovado em 27 de abril de 1852.
Em agosto do mesmo ano iniciaram as obras contando com a presença do Imperador,
vários ministros, conselheiros do Estado e oficiais e grande multidão de
populares . A viagem inaugural aconteceu em setembro do ano seguinte. A extensão
de 14,5 Km da Estrada de Ferro foi inaugurada com grandes festejos no dia 30 de
abril de 1854:
“A agitação tomou conta do lugarejo: bandas de música,
coro de meninos, foguetes, bandeirolas coloridas. Quando o barco que trazia o
imperador chegou ao porto, formaram-se duas alas de nobres, ministros e
funcionários graduados. D Pedro II saudou a todos e, acompanhado por Irineu, o
presidente da companhia, dirigiu-se a um armazém onde tinham sido montadas
arquibancadas, no centro das quais ficavam as cadeiras do imperador e da
imperatriz, além do bispo – que tinha a importante função de batizar as
locomotivas da primeira ferrovia brasileira. Terminada a cerimônia, a comitiva
embarcou nos vagões especialmente decorados para a viagem de cartoze quilômetros
até o vilarejo de Fragoso, feita em pouco mais vinte minutos. Dos dois lados dos
trilhos, oficiais da Guarda Nacional ficaram perfilados, enquanto os menos
afortunados se espalhavam pelos morros para ver o trem passar. De Fragoso o
comboio retornou a Estrela, onde seria servido um banquete na estação.”
A Estrada de Ferro de Irineu Evangelista não vingou. Não chegou a Minas
Gerais. O Império, no entanto se envolveu no processo de instalação de Estradas
de Ferro. Em 9 de fevereiro de 1855, o Governo Imperial anunciou o contrato de
construção da estrada de ferro D. Pedro II, que teria como finalidade unir a
província do Rio de Janeiro com a de São Paulo. Os trabalhos foram iniciados em
11 de junho daquele ano .
Em 1864, a D. Pedro II contava com 221 Km de
linhas distribuídas por três seções e um ramal . Em 1889, a Estrada de Ferro D.
Pedro II era transformada na Estrada de Ferro Central do Brasil. Tornou-se o elo
entre o Brasil do interior e sua produção, com o litoral.
Pioneira em
Minas Gerais, a Estrada D. Pedro II, uniu a província à Corte.
Os primeiros
trilhos na província foram inaugurados em 1º de maio de 1869, com a presença dos
ministros da Marinha e da Agricultura . Até Queluz, atual Conselheiro Lafaiete,
foi utilizada a bitola larga. A partir desta localidade as linhas foram
construídas em bitola métrica prosseguindo para Miguel Burnier, Sabará, General
Carneiro, ganhando o rio São Francisco. Assim, a partir de 1869, o território
mineiro passou a ser trilhado por várias estradas de ferro, de diversas
companhias.
C - A Oeste de Minas
A Estrada de Ferro Oeste de
Minas, surgiu do sonho dos bacharéis Luiz Augusto de Oliveira e José Rezende
Teixeira, que juntamente com outros membros da comunidade de São João del Rei,
constituíram a comissão organizadora da companhia. O ideal do grupo era
construir uma estrada de ferro que partindo da Estrada de Ferro D. Pedro II, se
estenderia até as margens do rio Grande, no território oeste de Minas Gerais.
Através da Lei Provincial n.º 2.398, de 2 de novembro de 1877, o governo
concedeu a subvenção quilométrica autorizando a construção da estrada, ligando
Sítio (Antônio Carlos) à cidade de São João Del Rei. Em 2 de fevereiro de 1878,
foi criada a sociedade anônima com a denominação de Companhia Estrada de Ferro
Oeste de Minas. A falta de recursos da nova Companhia definiu a construção de
uma linha com bitola de 0,76, que teve o apoio do governo de Minas em 30 de
junho de 1879.
A inauguração em 28 de agosto de 1881, do trecho de 100 km
de Sítio, atual Antônio Carlos, à São João Del Rei, passando por São José,
contou com a presença do Imperador D. Pedro II .A Companhia contava então, com
quatro locomotivas, quatro carros de 1ª classe, quatro de 2ª, um de luxo, dois
de bagagens e quinze vagões fechados.
Quatro anos após a sua
inauguração, em 24 de agosto de 1885, a Companhia Estrada de Ferro Oeste de
Minas obteve a concessão para continuar a estrada até a cidade de
Oliveira.
D – Uma Nova Capital para uma nova ordem
“Uma cidade é
sinfonia
com ásperas
dissonâncias.
(...)
Uma cidade segue o
Ritmo
Ágil ou tosco de homens.
Fala pela voz de
criaturas
Imperfeitas e insatisfeitas.
Cresce nas mãos dos
Operários
Canta pelo timbre dos
Poetas
Define-se no porte
dos
Guias
Espairece no afã dos
Atletas
Explode na
estridência
Das máquinas.
A expressão de uma
Cidade é múltipla.
A
beleza de uma cidade é
Instável.
Sua grandeza é Limitada
Á fronteira
mesma das
Cousas” (...) ( LISBOA, Henriqueta. 1972. p. 73,74).
Em
fins do século XIX, o Estado de Minas Gerais buscando adequar-se à realidade
nacional republicana, iniciou os preparativos para a construção de uma nova
capital amparado na Lei n.º 3 de 17 de dezembro de 1893, que autorizava a
transferência da sede político administrativa, de Ouro Preto para Belo
Horizonte.
O sonho de várias décadas de transferir a capital começou a
se realizar. A comissão construtora se instalou na região em março de 1894, com
o prazo de 4 anos para transformar um pacato arraial em uma capital moderna,
revolucionária em suas linhas, sem vínculo com o período colonial ou mesmo com o
falido regime imperial .
Um ano depois da instalação da Comissão
Construtora no arraial de Belo Horizonte, em 1895, a planta da capital elaborada
pelos engenheiros Aarão Reis e Américo Macedo, estava aprovada, dividindo a
cidade em zonas urbana, suburbana e rural.
Sobre os escombros da antiga
Belo Horizonte desenhou-se o xadrez geometrizante da nova mentalidade da elite
brasileira, republicana, progressista e ordeira.
“Belo Horizonte foi
planejada e concebida nos parâmetros urbanísticos pré-modernos, teve a missão de
simbolizar a ”ordem e progresso” mineiro republicano. Ao longo das suas
primeiras décadas de vida, procurou se consolidar como locus da experiência
moderna, sendo esta especificamente urbana. Apontar Belo Horizonte como uma
cidade moderna significa capacitá-la para a apropriação das principais funções
urbanas, que vão transformar a cidade em espaços de representação simbólica. São
as suas experiências comercial, industrial e intelectual entrelaçadas que vão
transformar a cidade em cultura.”(BELO HORIZONTE: ESPAÇO E TEMPOS EM CONSTRUÇÃO
Lemos, Celina Borges. 1994. p. 30).
Esta visão moderna, positivista,
“síntese entre Paris e Washington” norteou a construção da capital, pensada para
crescer do centro para a periferia.
Na zona urbana delimitada pela
Avenida do Contorno, as ruas e avenidas foram projetadas largas, enquanto as
ruas das zonas suburbanas destinadas a sítios, chácaras e quintas, apresentavam
um traçado menos rigoroso com largura inferior e quarteirões irregulares, muitas
vezes acompanhando a topografia do terreno .
“Uma cidade fundada a partir
do nada só pode ter uma planta regular; e essa planta , desenhada por um
engenheiro geômetra, leva em conta sua prática profissional, respondendo ao
ideal de regularização em vigor no meio dos politécnicos
progressistas.
Belo Horizonte foi criada num momento de transição, em que
se operavam mudanças do discurso urbanístico internacional: o retorno aos
traçados serpenteados e a adoção de traçados policêntricos levando em conta as
curvas de nível preconizadas por Camillo Sitte, são-lhe de pouco posterior. O
traçado adotado, baseado no xadrez, era consagrado para as cidades novas
provavelmente devido à facilidade de loteamento; enquanto a superposição de
diagonais que obedecia à “lógica dos fluxos”, da aeração e da comunicação,
adotadas na Paris haussmanniana, já era comum na tradição americana.”(SALGUEIRO,
1997. P. 155).
Para construir essa cidade de forma ágil e em curto espaço
de tempo, era necessário mão de obra, material, e claro, transporte eficiente
destes ingredientes imprescindíveis à Comissão Construtora. O Transporte rápido
eficiente e moderno como a capital que se pretendia construir, era o trem e seu
caminho de ferro.
Desde 1893, quando dos estudos das localidades para a
instalação da nova capital, Aarão Reis manifestava “especial atenção à
viabilidade de implantação de um sistema geral, estadual e urbano de vias
férreas, estudando as conexões possíveis a partir da rede de estradas existentes
ou por criar, tomando-se a Capital como centro” .
“O ideal do dr. José de
Magalhães e o da maioria dos engenheiros e arquitetos modernos e que consiste em
substituir as velhas e pesadas carcaças de pau, encascadas na não menos velha e
pesada alvenaria de pedra, pelas elegantes, leves e racionais construções de
ferro e tijolo, ainda não pode ter cabida, num lugar distante do litoral em mais
de cem léguas e, quando para aproximar essa distância, temos apenas, como
recurso, o serviço insuficiente e moroso, da nossa Estrada de Ferro Central do
Brasil!” (Minas Gerais,05 dez. 1894. p. 3).
Assim, as primeiras medidas
tomadas pela Comissão Construtora foram referentes à implantação do ramal férreo
de entroncamento com a Estrada de Ferro Central do Brasil e a estação de General
Carneiro, construída nas imediações da nova cidade, em formato singular: um
triângulo isósceles. Interessava à Comissão a instalação de linhas urbanas para
o transporte rápido e fácil de material para os canteiros de obras dos edifícios
em construção em toda área urbana. Este ramal de Belo Horizonte, foi construído
a partir da Estação de General Carneiro localizada no quilômetro 590 e
inaugurado em 1893. Em seu relatório referente à construção do ramal, o Dr.
Francisco Sá, Secretário de Estado dos negócios, informa:
“Foi inaugurado
no dia 7 de setembro de 1893 o ramal ferreo que liga a Estrada de Ferro Central
do Brasil á nova capital do estado de Minas.
Esse ramal entronca-se na
estação de General Carneiro a 8 kilometros de Sabará, na Barra do Ribeirão
Arrudas. As condições do entroncamento no kilometro 589 + 700 da E. F. Central
são firmadas no accordo auctorisado pelo governo em 31 de agosto de
1894.
A extensão total do ramal inclusive desvios, no qual despendeu-se
ate 31 de dezembro (1896) com o competente material rodante, estações,
acessórios, etc., a quantia de 2.091:907$379 é de 19.066 metros, 14.780 metros
daquelle e 4.286 metros destes.
Impondo-se a necessidade do trafego para
transporte de passageiros, bagagens e mercadorias por esse ramal, sobre proposta
do engenheiro chefe da Comissão Constructora, de 21 e 27 de setembro de 1895,
aprovei a tabella de vencimento provisorios para o pessoal e bem assim e com o
mesmo caracter, as respectivas tarifas”.
(Minas Geraes, 20 ago. 1896. P. 6.
Relatório do Sr. Dr. Francisco Sá).
II – A ESTAÇÃO CENTRAL DO
BRASIL – Portal da modernidade
“A praça é como um vaso aureo, de
louça um filtro de antiquissimas essencias...
Na penumbra aromal como
balouça
A cabeleira empoada das hortencias”.
Cesar Burnier.
A
Estação que substituiu a Estação provisória - 1920
Para a agilizar a
construção da capital nada mais certo e evidente que a utilização do mais
moderno e rápido meio de transporte da época. O material de construção
operários, construtores e futuros moradores chegaram pela estrada de ferro ao
grande canteiro de obras em que se tornou o arraial de Belo Horizonte.
“... era um dos assumptos de maior importância e que devia ser desde
logo attendido a construção do ramal ferreo, visto carecer a comissão de
importar toda especie de material do trabalho, e para elle convergiam todas as
atenções de modo tal que em junho achavam-se e eram approvados todos os seus
estudos pelo governo.
Esses estudos comprehendiam não só os projectos das
Estações “General Carneiro” e “Minas”, como tambem os planos definitivos do
traçado do ramal, que a partir do ponto de entroncamento da central,
desenvolve-se á margem esquerda do ribeirão dos Arrudas, sempre em rampa
ascendente e pequenos trechos de nível, até seu ponto terminal, não apresentando
em toda a sua extensão de 15 kilomentros nenhuma obra d’arte de maior
importancia”. (Minas Geraes, 7 set. 1895. p. 4-6).
A área escolhida
para a implantação da futura estação da capital, próxima ao rio Arrudas, foi
considerada ideal pela Comissão Construtora. Em 1894, foi apresentada a proposta
do Sr. Júlio Porta & comp., para a construção da Estação Central em que se
obrigavam a fazer a redução de 2% sobre a tabela e a terminar a obra no prazo de
9 meses, depois da chegada do lastro a Belo Horizonte.
Logo depois foram
apresentadas outras propostas:
- A do Sr. Antônio Gonçalves de Almeida, de 9
de julho de 1894, para a preparação da parte da esplanada da Estação de Minas e
do leito do 1º trecho do ramal;
- a do Sr. Domingos Alves de Oliveira,
também de 9 de julho, para o 2º trecho; outra, de 1º de agosto;
- a do Sr.
Januário Marques Barbosa, para construção de uma casa para residência e três
para turmas;
- a do Sr. Joseph Lynch para a preparação do 3º trecho do
canal;
- a de 11 de agosto dos Srs. Francisco Soucasaux, Eduardo Edwards e
Alfredo Camarate, para construção da estação do entroncamento;
- outra
proposta também dos Srs. Soucasaux, Edwards e Camarate, para a construção de um
abrigo para máquinas, oficina e forja, bem como uma casa para residência do
Agente da estação do entroncamento .
Sobre a Casa do Agente, os
construtores enviaram uma carta comunicando ao engenheiro–chefe a instalação da
pedra fundamental:
“Arrudas, 1º de novembro de 1894 – Os
abaixo-assinados, empreiteiros da Estação do Entroncamento do Ramal Férreo de
Belo Horizonte, têm a honra e satisfação de comunicar ao digno Chefe da Comissão
Construtora da Nova Capital de Minas que, no dia 1º de novembro de 1894, foi
lançada a primeira pedra nos alicerces de casa da residência erguida junto à
mesma estação. Cabe, portanto, à modesta firma Edwards, Camarate & Soucasaux
a glória de haver construído o primeiro alicerce da futura capital do Estado de
Minas, confiada ao zelo e competência do Dr. Aarão Reis. Os empreiteiros,
Edwards, Camarates & Soucasoux”. (BARRETO, 1995. p.61)
As pedras
fundamentais das estações de General Carneiro e Minas, ainda não estavam
assentadas em novembro daquele ano . Entretanto, no ano seguinte, em 7 de
setembro de 1895, inaugurou-se oficialmente o ramal férreo ligando a nova
capital em construção com a Estrada de Ferro Central do Brasil. Neste dia
assentou-se também as pedras fundamentais dos principais edifícios públicos na
cidade .
A planta da Comissão Construtora previa para a área da Estação,
uma praça logo em frente ao futuro prédio da estação, cartão de visitas aos
forasteiros, visitantes ilustres e quem mais viesse conhecer a capital de Minas
Gerais.
“Ocupando o fundo de uma bela praça de 200 por 100 metros, que
seria cortada longitudinalmente pelo ribeirão Arrudas, convenientemente
canalizado e transposto, bem em frente à Estação por elegante pontilhão já
projetada, sendo as ribanceiras taludadas e gramadas. Uma alameda dupla de 20
metros de largura de cada lado acompanharia o ribeirão em todo o seu percurso
dentro da futura cidade desde o Parque até o arrabalde do Pinto. A enorme
esplanada da lagoinha, que ficava em frente á Estação, seria naturalmente o
futuro bairro comercial, para cujo arruamento já estava em estudo um anteprojeto
bem combinado. Dá praça da Estação partiria, perpendicularmente a esse
importante edifício, a avenida do Comércio, de 50 metros de largura, com
passeios de 4 metros junto aos prédios, via dupla para carros e ‘tramways’ ,
dois renques de árvores frondosas com passeios, e, no centro, estrada areiada,
de 8 metros de largura, para cavaleiros. Esta avenida iria terminar numa praça
junto ao ribeirão onde ficaria reservado espaço para o futuro teatro”. (BARRETO,
1936. P. 165.)
Para servir de Estação provisória foi construído um
barracão de madeira sobre baldrame de pedra seca com 20 metros por 5, com
plataforma coberta de zinco, destinada á agência, telégrafo e armazém de
mercadorias. Ao seu lado, construiu-se um outro barracão com cerca de 30 metros
por 7 metros, para depósito de materiais de construção. Logo essas construções
provaram serem insuficientes para o fluxo de 80 carros diários que transitavam
pelo ramal já em 1896.
Aarão Reis, em maio de 1895 já havia exposto ao
Presidente do Estado, Dr. Crispim Jacques Bias Forte as características do
prédio da Estação de Minas a ser construído no local:
“Quanto à Estação
Central (Minas) que terá de ser levantada como pórtico, na nova capital,
procurei dar-lhe não suntuosidade descabidas nem mesmo luxo artístico
dispensável, mas toda a elegância, todo o conforto e todas as comodidades, cujas
faltas seriam imperdoáveis na Estação Central de uma cidade do século XX”.
(Praça da Estação origem e Destino, 1981. P. 45)
Em outra exposição,
agora da Comissão Construtora da Nova Capital, temos a seguinte descrição da
Estação a ser construída:
“... A estação Central será, incontestavelmente
a melhor, a todos os respeitos, de quantas há nas estradas da América do Sul.
Desde a imponente fachada principal, que ocupará o fundo da vasta praça
retangular, cortada longitudinalmente pelo ribeirão Arrudas, canalizado, até o
vasto armazém que completará, do lado oposto das linhas de trilho o corpo
central da estação, tudo concorre, nesta construção para constituí-la uma das
melhores obras que se tem construído nas vias férreas brasileiras. Duas amplas
plataformas de 7 metros de largura cada uma, dispostas de um e outro lado de
leito, que contará nesse ponto 4 linhas de trilhos, sustentarão, por meio de 60
belíssimas colunas de ferro em linhas paralelas, enorme zimbório metálico de
imponente e magnífico efeito.
Além do corpo principal terá mais esta estação,
um abrigo para máquinas e carros, um girador, carvoeira, residência para
agentes, etc., etc.
...A fachada principal da estação Central ocupará, como
dissemos, toda a face do fundo de uma grande praça de 200mx100m, cortada, no
sentido de maior eixo, pelo ribeirão do Arrudas, convenientemente canalizado com
seus barrancos gramados, e atravessado por elegantes pontes das a do centro se
denominará “David Campista” em recordação ao ex-secretário da
agricultura.”(Arquivo Público Mineiro. Comissão Construtora da Nova Capital -
Revista Geral dos Trabalhos. P. 99.)
O primeiro e mais arrojado projeto,
para a Estação foi orientado pelo engenheiro Hemilo Alves sob indicações do
Engenheiro Chefe, Aarão Reis, contando com a participação do primeiro desenhista
Edgar Nascentes Coelho e do desenhista de 1ª classe, José Verdussen. O edifício
principal da Estação teria 58 metros de frente e 16 de altura, “até o cimo das
balaustradas da platibanda, sendo a parte central coroada por um relógio” .
Posteriormente, o projeto da Estação de Minas, foi completamente modificado,
agora sob orientação do arquiteto José de Magalhães e contando com a
participação dos arquitetos e desenhistas Edgar Nascentes Coelho e José
Verdussem. Sofreu modificações “de modo a conter outras disposições, mais de
accôrdo como fim a que é destinado”, que reduziram os custos da obra a menos da
metade do que se previa. O plano Geral apresentado originalmente pela Comissão
Construtora para a Estação e seus arredores, previa a construção da Estação,
armazém, residência do Engenheiro (ainda existente), residência do Agente,
carvoeira, depósito do material rodante, caixa d’água e área para a instalação
de um hotel .
Para suprir a necessidade de situar melhor o armazém de
importação, sem contudo prejudicar o espaço da praça, a Comissão modificou o
traçado do ramal na chegada à Estação. Já nesta época construiu-se uma linha até
a Praça da Liberdade com 2.223 metros, e ramais para a Pedreira de Calcário,
para o reservatório do Cercadinho, para o local do “Congresso”, Palácio da
Justiça, para a Pedreira de granito no Morro das pedras e para as pedreiras da
Viação e Lagoinha, além de servir ás três olarias mais importantes, numa
extensão total de 20 quilômetros.
A Estação Central construída, na
verdade, muito diferente do ideal projetado, entretanto foi também elogiada pela
sua beleza e linhas:
“A Estação de Minas, pela sua belleza e topographia
é uma das melhores e primeiras dentre suas congeneres.
Construída em um
terreno suavemente inclinado á margem esquerda do ribeirão “Arrudas”, no limite
da área destinada à cidade, no fundo de uma bella praça de 200x220 ms. o seu
conjunto agrada extraordinariamente.
É um edificio com 2 pavimentos e uma
torre de 23 ms. de altura de onde se disfructa um magnifico panorama.
Nesta
torre esta collocado um mostrador que muito realce dá ao aspecto geral do
edificio que mede 58 ms. de frente e 16 de altura.
Na frente há entradas
latteraes, em rampas macadamisaddas para carros, sob um portico.
A “gare” é
extensa e grandemente espaçosa.
Ao seu lado está o grande armazem com uma
area de 580 m2. O serviço de recepção e entrega de cargas é feito completamente
independente do da estação, havendo plata-formas para entrada (de um lado) e
sahida (do outro) dessas cargas.” (LIMA, 1900. P. 16-17.)
Um acordo entre
a diretoria da Estrada de Ferro Central do Brasil e o engenheiro Chefe da
Comissão Construtora, definiu em 2 de dezembro de 1895, o transporte de 2. 400
toneladas de cargas do Rio de Janeiro até a Estação de General Carneiro por um
período de um mês, através de 3 locomotivas e 50 vagões fornecidos pelo Estado
.
Em frente a Estação, além da canalização do Arrudas, a Comissão
empreendeu a construção da ponte “David Campista” no centro da futura praça. O
projeto esboçado pela 3ª seção foi concluído pela 2ª seção a cargo do Dr.
Bernardo Figueiredo.
“Esta ponte – que lembrará os esphorços que, para a
mudança da capital, desenvolveu o illustre ex-Secretario da Agricultura,
Commercio e Obras Publicas – foi projectada com economia, talvez excessiva,
trantando-se de uma obra que se tornará tão saliente pela posição que vai
occupar na futura Capital.
Essa economia é, entretanto, justificada, pela
emergencia que há em concluir-se aquella ponte pela qual deverá transitar todo o
material de construcção, e cargas de toda natureza, que tiverem de se utilizar
do ramal ferreo.
A aboboda, os muros lateraes e os parapeitos, deveriam
ser de cantaria, si não houvesse essa urgencia; pois, esse trabalho, moroso por
sua natureza, exigiria alguns meses para ser concluido, especialmente sendo o
primeiro desse genero feito na localidade onde ainda não há pedreiras de
granito, ou gneis, em franca exploração, nem o pessoal de canteiros
necessario.
Em cerca de 650 metros cubicos, que representam a cubação
desta ponte, somente 6 serão de cantaria, devendo ser essa, empregada na
ornamentação dos parapeitos.
A aboboda foi projectada com alvenaria de
tijolos, e os encontros e os muros das faces, com alvenaria ordinaria de
pedra.
Os muros dos parapeitos serão de alvenaria de tijolos com
argamassa e reboco de cimento. (Revista Geral dos Trabalhos, abr. 1895, p.
71).
Á época da construção do pontilhão David Campista, vários lotes
foram vendidos para construções mistas na área pensada para o bairro comercial
na Avenida do Comercio, hoje Santos Dumont, até o mercado, atual Rodoviária.
Antes mesmo da inauguração da Capital, a região nas proximidades da
Estação já apresentava quarteirões em formação com restaurantes e edificações
novas pertencentes em sua maioria a imigrantes italianos, atraindo ao local,
principalmente aos domingos, um movimento regular de transeuntes .
Assim
que ficaram preparadas as 7 primeiras seções urbanas e suburbanas contíguas da
cidade, compostas por 3 639 lotes, foram doados e vendidos a funcionários
públicos 553 lotes. Outros 557 lotes foram doados a proprietários de Ouro Preto
e apenas 14 foram adquiridos por ex-proprietários de Belo Horizonte. Dos lotes
restantes, 417 ficaram reservados para a Comissão Construtora, sobrando 2 158
lotes destinados à venda.
Na primeira concorrência pública de 10 de
agosto de 1895, foram vendidos 135 lotes na área urbana. Nas 6 seções suburbanas
foram vendidos em 1 de setembro de 1895, os primeiros 48 lotes a preços mais
baixos que os lotes urbanos .
A destruição do lugarejo antigo e a
construção da nova cidade exigiu braços e eles vieram de diversas regiões do
país e do mundo em busca do sonho. A imigração européia a partir da segunda
metade do século XIX veio ocupar o espaço deixado pela mão-de-obra escrava. Na
década de 1870 o país recebeu mais de 20 000 italianos, o maior contigente de
imigrantes dentre todas as nacionalidades. A partir da década seguinte e até o
fim do século, o número anual de imigrantes superaram a casa dos 100
000.
Quando da construção da nova capital mineira em fins do século XIX,
a Europa vivenciava problemas econômicos derivados do desenvolvimento do
capitalismo, que excluíam milhões de indivíduos. A estes restava a procura de
novos mercados, novos lares onde pudessem sobreviver com dignidade. A América
aparecia como esse novo eldorado atraindo imigrantes da Itália, Reino Unido,
Alemanha, Áustria, Irlanda, Espanha, Portugal e mesmo de países nórdicos. A
construção de Belo Horizonte atraiu imigrantes, em sua maioria, naturais da
Itália, Portugal e Espanha, política confirmada pelo ofício de 12 de agosto de
1895, do Dr. Francisco Bicalho, Chefe da Comissão Construtora, solicitando ao
Secretário da Agricultura providências para aquisição de
trabalhadores:
“Tendo os serviços incumbidos a esta Comissão entrado em
época de maior desenvolvimento e sendo evidentemente insuficiente o número de
trabalhadores que atualmente procuram esta localidade, tomo a liberdade de
lembrar a V. Exa. A conveniência de estabelecer aqui uma hospedaria de
imigrantes, fazendo a Inspetoria de Terras e Colonização dirigir para ela
principalmente imigrantes solteiros, que queiram dedicar-se a serviços por
salários, prestando-se esta Comissão a levantar e fornecer o barracão necessário
para o primeiro agasalho, logo que tenha recebido as instruções necessárias
daquela repartição e aquiescência de V. Exa.”(100 Anos da Indústria. p.
22,23.)
Esse contigentes imigratórios de trabalhadores esperavam de Belo
Horizonte a realização do sonho de “fazer a América”. Muitos imigrantes,
artesãos especializados e qualificados ocuparam lugar junto à equipes de
trabalho da construção, com destaque para os italianos, que em 1912
representavam 67,7% dos estrangeiros . Alguns enriqueceram devido a experiência
na área industrial adquirida na Europa. Para a maioria, no entanto, a realidade
se mostrou diferente. Nos traços geométricos da nova cidade, não havia espaço
para operários e aventureiros. Aos construtores braçais, sobraram as margens do
sonho, no limite determinado pela avenida que contornava a área urbana da
capital projetada. Assim expulsa da área central a multidão de migrantes e
imigrantes que construiu o sonho elitista buscando em suas arestas a
oportunidade de um futuro melhor, ocupou as áreas menos nobres das seções
suburbanas com suas edificações simplórias de sobrevivência precária.
No
alto da Estação ou “favela”, parte do atual bairro Floresta, na altura da rua
Sapucaí, se desenvolveu ainda nos primeiros anos, um núcleo populacional de
casebres mal alinhados. Já em 1896, com autorização das vendas de lotes
suburbanas, o governo tentou ordenar as construções, estipulando o prazo de dois
anos para a edificação de imóveis permanentes. A 10 réis por metro quadrado,
operários e moradores de cafuas se tornaram a partir de 1898, proprietários de
lotes sendo obrigados a construir casas de acordo com os padrões estabelecidos
pela prefeitura .
Na região da antiga fazenda da Boa Vista, ex
propriedade de João José da Cunha, da qual fazia parte a “Favela”, as primeiras
edificações permanentes do Bairro Floresta começaram a surgir. Em agosto de
1896, antes mesmo da inauguração da capital, dinâmico industrial e construtor
português, Antônio Teixeira Rodrigues, (o Conde Santa Marinha) construiu à
avenida 17 de dezembro, limítrofe com as ruas do Ramal e Januária, o prédio onde
instalou uma serraria, uma oficina de cantaria, uma fundição, uma ferraria, uma
carpintaria, além de moinhos para cereais e torrefação de café. A sua imponente
residência foi construída pouco depois nas imediações do prédio industrial .
Ainda neste período foi instalado noa subida da Avenida 17 de dezembro, o Hotel
Floresta, casa boêmia dos senhores Carlos Monte Verde e Eduardo Spitler que
teria emprestado à região o famoso nome .
Nos anos 1899-1902, na gestão
do prefeito Bernardo Pinto Monteiro, as 300 cafuas do Alto da Estação e de
outros pontos, juntamente com as 600 do leitão, somando uma população de 2000
pessoas, foram removidas para a 8ª seção suburbana onde receberam títulos
provisórios para o estabelecimento de suas edificações .
“ No momento
actual volve esperançado quem se dispuzer a percorrer a cidade, vendo as obras
que a certeza do futuro de Bello Horizonte inspira e emprhende, aquilatando do
capital enorme que dia a dia entra e se emprega, apezar da momentosa crise
...
Bairros hontem despovoados surgem hoje ás nossas vistas topetados de
edificios solidos e graciosos; ruas inteiras se alindam e pompeiam nos renques
pittorescos das suas arvores, por sobre cuja copa corre maior trama larguissima
de fios, que levam o telephone e a luz aos pontos mais longinquos; as linhas de
postes e os trilhos do bond completam os beneficios que a administração espalha
e mantem escrupolosamente, sem uma reclamação que revele afrouxamento no
comprimento do dever.
As casas que hotem vimos fechadas reabrem-se e
afastadas as suas persianas, notam-se physionomias extranhas, de pessoas que
demandam a cidade, cujo o progresso fará o seu definitivo advento, mal se evolem
das chaminés as fagulhas e o fumo, silvando os motores das fabricas cuja
proficuidade breve verificada sua installação, se estenderá pelos logares
visinhos por toda nossa terra” (Minas Geraes 13 maio 1902. Texto não assinado.
p.1).
A inauguração da cidade denominada “Cidade de Minas” aconteceu em
12 de dezembro de 1897 através do decreto n.º 1 085. O trem com a comitiva de
autoridades: secretários de Estado, Chefe de Polícia, Congressistas Estaduais,
diretoria da comissão de festas , representantes da Comissão Construtora e da
Guarda Nacional, desembargadores, comandante da Brigada Policial e outros que
foram de encontro ao Presidente do Estado chegou a General Carneiro às 11 horas
do dia 12 de dezembro. O trem do Presidente chegou a General Carneiro às 12
horas e quarenta minutos. O comboio inaugural composto de 13 carros chegou á
Estação de Minas às 14 horas, sendo recebido por bandas de música militares e
grande multidão:
“Às 2 horas precisamente, ao silvo prolongado das 2
locomotivas na curva da entrada de Belo Horizonte, por todos os pontos da nova
cidade estrugiram girândolas e dinamites, ao passo que, na grande praça da
Estação de Minas, dez mil pessoas seguramente aclamaram delirantemente o sr.
Presidente do Estado, seus auxiliares de Governo e a Comissão Construtora,
enquanto as bandas musicais eletrizavam a multidão com o Hino Nacional. (...)
Mas, como dizia desembarcados o Presidente e sua comitiva, formou-se o
grande cortejo, que se pôs em movimento, rumo à praça da Liberdade. Na praça da
Estação, o esquadrão de cavalaria, em uniforme de grande gala, depois de prestar
continências ao chefe de Estado, segue-lhe os passos prestando guarda de honra.
Transposto um alto e vistoso arco triunfal ali elegantemente erguido, já na
ponte ‘David Campista’, foi o presidente Bias Fortes saudando pelo advogado dr.
Alfredo Guimarães, em nome da Comissão dos festejos populares e do povo de Belo
Horizonte, ao qual agradeceu S. Exc. Em eloqüente e emocionado discurso,
reivindicando para o Congresso Mineiro e para o conselheiro Affonso Penna a
grande parcela de glória atribuída ao Governo do Estado na construção da nova
Capital.
Sempre, envolvido pelas mais expressivas demonstrações de
regozijo popular, prosseguiu o cortejo, a pé, pela rua dos Caetés”. (Barreto,
1936. p. 724)
Ainda no século XIX, em 2 de julho de 1898, o Governo
preocupado em expandir o tráfego ferroviário, concedeu a Joseph De Jeagher,
através do decreto n.º 1 152, o privilégio para construir e explorar uma estrada
de ferro partindo da capital e indo de encontro a Estrada de Ferro Oeste de
Minas na Estação de Gonçalves Ferreira. Os estudos para a efetivação desta
estrada foram contratados ao engenheiro Joaquim Domingos Leite de Castro em 9 de
agosto daquele ano.
Paralelamente, em 13 de dezembro de 1899 ocorreu
oficialmente a encorporação do ramal férreo da capital à Estrada de Ferro
Central do Brasil através de termo de recebimento:
“Aos 13 dias do mez de
dezembro 1899, presentes na Estação da Capital de Minas os srs David Campista,
secretario das Finanças do Estado de Minas Geraes, por parte do governo do mesmo
Estado, e dr. Alfredo Eugenio de Almeida Maia, e dr. Da E. de F. C. do Brasil,
foi este declarado que, auctorizado por aviso n. 119 de 30 de novembro último,
do Ministério da Industria Viação e Obras Publicas, recebeu para ser encorporado
à E. F. C. do Brasil, o Ramal Férreo da Capital do Estado de Minas, vendido à
União por escriptura lavrada em notas do tabelião Evaristo Valle de Barros, com
todos os edificios e dependências, mobilia, material fixo, rodantes e
telegraphico, locomotivas, carros e wagons, etc., etc., constantes do inventario
apresentado e acceito para a transação effectuada. (...)” (Minas Geraes, 14 dez.
1899. p. 4.)
III – O Novo Século e a nova
Capital
Nos primeiros anos do século XX, a cidade de Belo
Horizonte obteve um bom crescimento, favorecido principalmente pela política de
incentivos do governo, concedendo terrenos, luz elétrica e isenção de impostos
às industrias que viessem para a capital . Enquanto em janeiro de 1894, a
população da cidade era de 2 600 habitantes, passando a 3 500 no fim deste mesmo
ano, em 1900 a população chegou a 13 500, alcançando a casa dos 40 000 em 1912 .
O Prefeito Bernardo Pinto Monteiro iniciou a arborização da Praça da
Estação em 1900, dando prosseguimento ao embelezamento da porta de entrada da
cidade . Em novembro de 1902, o Prefeito da Capital, Coronel Francisco Bressane,
contratou para o ajardinamento da Praça da Estação e da Liberdade, o Sr. Antônio
Nunes de Almeida, que já à época, apresentou os projetos para as obras . No
entanto os trabalhos só foram iniciados em 1904, tendo como ponto de partida o
lado da rua da Bahia . O projeto previa jardins nos dois lados da praça entre as
margens do rio Arrudas, com uma fonte a ser implantada entre a rua Caetés e a
avenida do Comércio e um coreto nos canteiros entre esta avenida e a rua
Guaicurus. Os trabalhos iniciados em julho daquele ano foram concluídos somente
em 4 de setembro de 1906 .
“Iniciei a arborização da praça da Estação.
Também mandei arborizar o cemitério e os arredores de todas as caixas d’água e
de areia, achando-se concluído esse serviço. Tem presidido a escolha das árvores
o maior cuidado, se bem que tenha essa Prefeitura encontrado as maiores
dificuldades em obter mudas.
As qualidades principais empregadas são:
magnolias, terminaleas, accacias, deannospeas, saboeiras, malvaceas,
castanheiras, dilenéas, jambolanos, synamomos, tamarinho, ficus benjamim,
amoeirras, eucalyptus, palmeiras imperiaes, oytis, sassafraz, flamboian.”
(Mensagem ao Conselho Deliberativo da Cidade de Minas, 19/7/1900, prefeito
Bernardo Pinto Monteiro).
A Estação cumpria o seu papel de portal de
entrada e lugar de recepção de figuras ilustres do Estado e do país, que vinham
conhecer as maravilhas arquitetônicas e urbanísticas que se construíam no centro
do Brasil. Em 1903 a cidade recebeu Santos Dumont ,“Pai da Aviação”, em
acalorada recepção:
“O chamado Pai da Aviação, Alberto Santos Dumont, que
acabava de deslumbrar Paris com seus célebres vôos, com que comprovou ser
possível dirigir as aeronaves, visitou Belo Horizonte em 21 de de setembro de
1903.
Grande multidão aguardava a chegada do ilustre aviador que desembarcou
na Estação da Central pelas 11 horas da manhã. O povo prorrompeu em estrondosas
aclamações ao “Herois dos Ares” que, ao sair do vagão, agradecia risonho a
todos, tendo na mão seu conhecido e famoso chapéu “Panamá”.
(...)
Recebido
com música e entusiasmos, foi pôsto à disposição do Pai da Aviação um landau
para conduzi-lo ao centro da cidade. Populares desatrelaram os animais do landau
e levaram este, não obstante os protestos de Santos Dumont. (MOURÃO, 1970. P.
65,66.)
Outras visitas ilustres recebiam a mesma ovação, quase um ritual
a ser cumprido pela população e autoridades, que consistia em banda de música,
discursos, aclamação, fogos de artifício e cortejos gigantescos pelas ruas da
cidade culminando na Praça da Liberdade. O mesmo ocorria com as despedidas, e
velórios de figuras importantes da política. A mesma multidão que assistia a
chegada, despedia entusiasmada e emocionada. Foi assim com os reis belgas em
visita a cidade em 1920:
“A chegada de suas majestades à capital foi no
dia 2 de outubro de 1920, em trem especial da Estrada de Ferro Central do
Brasil. (...)
O comboio real que trazia os ilustres visitantes constava das
seguintes peças: um carro salão; um carro de fumar, um carro dormitório do Rei e
outro da Rainha; um carro para o Presidente da República e seus convidados e
mais um carro de administração e outro de expediente e bagagem.
A chegada foi
pela manhã, aguardada por grande multidão que se espalhava pela Praça da Estação
e trajeto dos carros que conduziam os reis e a comitiva.
(...)
Na gare,
esperavam os ilustres hóspedes: o Presidente Artur Bernardes, senhora e filha;
Dr. Afonso Pena Junior e senhora; General Setembrino de Carvalho; o Prefeito
Afonso Vaz de Melo; Dr. Júlio Otaviano e senhora; Desembargador Artur Ribeiro e
senhora; cônsules, oficiais, representantes da imprensa e outras
personalidades.
Ao desembarcar o casal de soberanos, foram feitas as
apresentações de estilo, tendo a seguir, o Sr. Prefeito oferecido à Rainha um
ramalhete de flôres naturais, com suas saudações.
O povo que enchia a Praça
da Estação, ovacionou os soberanos agitando bandeiras belgas e brasileiras. A
artilharia deu uma salva de 21 tiros em honra dos augustos hóspedes e do Sr.
Presidente da República.
A brigada de Infantaria apresentou armas, sendo
tocado a “Brabanconne” – Hino Nacional belga e o Hino Nacional brasileiro. D.M.
o Rei Alberto prestou, então continência às bandeiras. (MOURÃO. 1970. p.
281,283)
Os jardins bem cuidados, em 1907 receberam vários bancos idênticos
aos do Parque Municipal e o coreto sofreu reformas para receber bandas de
música. Quanto a iluminação, ampliou-se o número de lâmpadas de arco existentes
em toda a extensão dos jardins . Neste ano, 1907, foi implantada uma linha de
bonde que ligava a Estação ao restante da cidade.
Nas imediações da
praça começaram a surgir edificações imponentes, como o prédio que hoje abriga o
Centro Cultural, localizado à avenida Santos Dumont, n.º 174, esquina com rua da
Bahia. Construído por volta de 1906, foi inicialmente um hotel, depois quartel
do 2º batalhão da Brigada Policial e a partir de 1911, sede da Escola Livre de
Engenharia e depois Instituto de Eletrotécnica da EEUFMG. Mais tarde, 1920,
surgiu o prédio do Instituto de Química da Escola de Engenharia, o edifício
Aurélio Lobo, atual Hotel Sul Americano, construído em 1928 e o pavilhão Mário
Werneck, construído em 1948.
A cidade em seu nascedouro ainda oferecia
poucos atrativos ou espaços de lazer para a crescente população com exceção às
retretas musicais que ocorriam nas praças e no Parque:
Tediópolis:
esplêndido nome para esta cidade, pois suas soberbas e largas e desertas e
poeirentas ruas são a morada eterna do tédio... Não sei o que seria dos
habitantes entediados desta belíssima Belo Horizonte, se não fossem as retretas
aos domingos nas praças da Estação, Liberdade e no Parque”. (A CAPITAL, 02 JUL.
1907. P. 2)
A atividade industrial incentivada pelo Decreto n.º 1 516 de
maio de 1902 que facilitava a instalação de indústrias na Capital, se concentrou
nas imediações da Estação desde os primeiros tempos. O Conde de Santa Marinha
foi o pioneiro ao instalar seus galpões do “Empório Industrial” à beira da linha
férrea, transformando a área em verdadeira escola de trabalho, com serrarias,
oficinas de carpintaria, ferraria, moinhos. Em seguida surgiu a “Industrial
Serraria Souza Pinto”, de Antônio Garcia Paiva e Augusto de Souza Pinto,
instalada em 1903 e atualmente dinâmico espaço cultural da cidade. Em 1908, Belo
Horizonte já se encontrava em segundo lugar no Estado como centro de produção
têxtil, perdendo apenas para Juiz de Fora. Contava a essa época com 4 empresas
empregando 407 trabalhadores e 270 teares. Alguns anos depois, em 1912, a
capital passou a contar com um parque industrial com 91 estabelecimentos,
destacando-se dentre estas a Cia Industrial de Belo Horizonte instalada na Praça
da Estação, em 1906, que possuía 500 trabalhadores. Esta sólida indústria têxtil
acompanhou o crescimento da cidade até os anos 90, quando encerrou suas
atividades. No entanto, o prédio ainda mantém a atividade comercial de vendas de
tecidos, sendo uma referência para os belorizontinos. A maioria das empresas no
entanto, contava com 20 a 50 funcionários. Das 91 indústrias instaladas, 26 eram
alimentícias; 11 empresas no ramo de minerais não metálicos; 7 empresas
madeireiras; 36 de vestiários e outras 11 de diversos ramos . Outro importante
estabelecimento a se enraizar nas redondezas da Estação, foi o “Estabelecimento
Industrial Mineiro”, fundado em 1909 pelo italiano Paulo Simini. Esta indústria
fabricava alimentos massas, licores, águas minerais, vinhos, chocolate, doce,
cerveja e até mesmo charutos, cerâmicas e confetes. Em sua dependências
empregava cerca de 40 funcionários . A Crise que ocorreu entre os anos 1914 a
1918, interrompeu por algum tempo o dinâmico crescimento da cidade, devido a
dificuldade de se obter materiais de construção. Neste período a prefeitura
municipal passou por séria crise financeira obrigando a diminuir os incentivos à
indústria como a concessão de lotes e energia elétrica.
Com relação às
atividades comerciais, em 1913 a Avenida do Comércio já concentrava grande
atividade atacadista, contendo inúmeras fábriquetas, pensões, hotéis,
barbearias, botequins, alfaiatarias, casas de modas, confeitarias, casas de
bilhar, etc. Já a esta época existia uma Escola de Comércio, destinada a
ministrar conhecimentos práticos relacionados à atividade, com cursos que
duravam dois anos .
Todas esta atividade industriais aliadas às atividade
comerciais da redondeza davam à Praça da Estação o caráter de quase Centro, onde
a economia chegava, nascia e consolidava. Operários transitavam em meio às
novidades e assistiam a transformações dos espaços urbanos. O esboço de uma
cidade se transformava em realidade.
“ No fim da Segunda década deste
século Belo Horizonte parece constituir, economicamente, um centro regional de
alguma importância, comparável a outros como Juiz de Fora na Zona da Mata,
Barbacena no Campo das Vertentes e Uberlândia no Triângulo. Seu raio de
influência, no entanto, não ultrapassa a região imediatamente ao norte, onde ao
lado da pecuária, se desenvolvia a cotonicultura e a indústria têxtil”.(MOURÃO,
1970. P. 310, 311.).
Em 1910, aconteceu a inauguração provisória do primeiro
trecho da linha da Oeste de Minas ligando Belo Horizonte à Estrada de Ferro
Goiás, trecho: Belo Horizonte - Henrique Galvão .A Praça da Estação, nas
primeiras décadas do novo século recebeu novos adornos como o busto da heroina
Anita Garibaldi inaugurado em 21 de setembro de 1913. Prevista para o dia
anterior, a festa foi transferida devido às chuvas que caíram durante todo
aquele dia:
“Realizou-se ante-hontem, às 3 horas da tarde, com grande
solenidade, a inauguração do busto em bronze da heroina brasileira Anita
Garibaldi, erigido na praça da Estação.
O acto este concorridíssimo, a
elle comparecendo o exmo. Sr. Julio Bueno Brandão, presidente do Estaddo,
acompanhado de sua exma. Família e dos srs. Dr. Bueno Brandão Filho e
tenente-coronel Vieira Chiristo, official de gabinete e ajudante de ordens da
Presidencia; os srs. Drs. Delfim Moreira, Arthur Bernardes e José
Gonçalves,secretarios do Interior, Finanças e Agricultura; o sr. Dr. Americo
Lopes, chefe de Policia; o sr. Dr. Olyntho Meireles, prefeito da Capital;
representantes de associações, familias e pessoas de todas as classes sociaes,
além da colonia italiana, ficando literalmente cheia a vastissima praça. (...)”
(Minas Geraes, 22 e 23 set. 1913. p. 8.)
No ano seguinte, em 4 de
setembro de 1914, a praça conhecida como da Estação recebeu a nova denominação :
”Praça Cristiano Otoni” .
“ A Praça da Estação acha-se entre a rua Bahia,
Avenida Amazonas, rua Caethés, Avenida Commercio, rua Guaycurús, rua da Estação
e rua Sapucahy.
Bellissimo Jardim com bancos publicos, todo grammado e onde
se pode admirar bellas flores da rica Flora Brasileira.
Aformosea a Praça, o
rio Arrudas, correndo placido e espelhando em suas aguas christalinas as
verdejantes e frondosas arvores do Jardim.
No centro da Praça foi construído
um primoroso coreto de ferro.” (VERAS. 1913. P. 300-301.)
Em 1916,
iniciaram-se os trabalhos de remodelação da Estação em todas as suas
dependências “tendo em vista o arejamento das mesmas por meio de abertura de
portas para plataforma e o irrephehensivel aceio que se nota nesta importante
repartição” .
Nas proximidades da Estação Central , os srs.
Marchiorlatti & comp. Inauguraram no dia 11 de março de 1916 a Serraria
Mármore , Companhia à serraria a vapor Garcia de Paiva & Pinto instalada já
há alguns anos nas imediações da Praça. Ainda naquele ano de 1916, ocorreu uma
concorrência para a construção de muros no pátio da Estação.
As
transformações não cessaram de acontecer no ambiente: Um novo restaurante foi
instalado nas dependências da Estação em 1917, inaugurado com grande recepção
pelo seu proprietário, Coronel Manoel dos Santos Bittencourt.
Três anos
depois do início das obras na Estação, em 1919, inaugurou-se a bitola larga
unindo Joaquim Murtinho à Capital. Este melhoramento iniciado em 1914 e
introduzido por André Gustavo Paulo de Frontin, diretor da Central foi elogiado
em matéria da revista carioca, “Tank”:
“...Alem disso, não lhe escapou a
circustancia de Bello Horizonte, pela sua posição geográphica, vir a tornar-se
em futuro quiçá breve o centro ferro-viario do Brasil e talvez a capital da
republica.
Nestas condições, mister se fazia uma estrada de grande bitola
que puzesse a cidade em comunicação rapida e commoda com o Rio, sem os
inconvenientes da baldeação que o tempo se fazia em Burnier ou
Lafayette.
Ainda há pouco inaugurou-se a esta capital festivamente a
bitola larga de Joaquim Murtinho a esta capital, e a elle se deve, na maior
parte, a realização desse velho sonho dos horizontinos. Foi, o incançavel
labutador que, quando pela segunda vez occupou o cargo de director da Central
(1910-1914), teve a ideia de construir esse trecho, mandando proceder aos
respectivos estudos.
Não lhe passou despercebido que uma linha de caminho
de ferro pelo Valle do Rio Paraopeba teria, além de outras e obvias vantagens,
enorme importancia para o abastecimento da nosssa capital, de vez que a zona
atravessada pela bitola estreita antes de chegar aqui é pauperrima em productos
que possam servir áquelle abastecimento”
IV – Os anos Vinte,
a afirmação da cidade como Centro Regional
“Dada a grandeza do
seu traçado toda gente pensava que Bello Horizonte nunca passaria de uma cidade
sem vida, com edificios esparsos.
Mas esse precentimento foi dissipado. Bello
Horizonte, agora mais que nunca, desenvolve-se da zona urbana ao ponto mais
afastado, uma febre intensa de construções.”(Minas Geraes, 8 março 1912. P.
4)
A capital mineira iniciou a década de 1920 como importante centro
regional, tornando-se eixo econômico e comercial das regiões que antes estavam
ligadas ao Rio de janeiro e à São Paulo. O crescimento urbano gerou o isolamento
da população de baixa renda na áreas além da avenida do Contorno, em bairros e
loteamentos que não se articulavam com o traçado da área central. Paul Singer ao
analisar a capital na nova década comenta:
“Em 1920, Belo Horizonte já
perdera a condição de uma economia essencialmente dependente de suas funções de
capital do Estado. Sua indústria adquiria certa expressão, como pode ser
verificado pelos dados do Censo daquele ano”. (SINGER, 1968. p. 233).
Nos
anos 20, Belo Horizonte assistiu a alterações em seu papel na economia de Minas
Gerais, devido instalação de indústrias siderúrgicas em municípios vizinhos, e a
expansão da rede viária, ligando a capital a várias regiões. Destaque para a
inauguração do ramal de bitola larga da Central do Brasil em fins dos anos 10,
com a construção das estações da Gameleria, Jatobá, Barreiro e Calafate,
pertencentes a Belo Horizonte . Nos anos 20 a ligação com Divinópolis
representou um importante passo a caminho do interior. Em 1930 ocorreu o
prolongamento do ramal Belo Horizonte–Santa Bárbara, que permitiu o escoamento
da produção para o porto de Vitória, integrando a região do vale do Rio Doce.
Esta expansão do sistema ferroviário ligou Belo Horizonte a diversas regiões do
Estado alcançando as cidades com produção têxtil: Sete Lagoas, Paraopeba,
Curvelo, Pitangui; as cidades com indústrias siderúrgicas: Sabará, Caeté, Barão
de Cocais, João Molevade, Rio Piracicaba; e as cidades do sul do Estado e suas
indústrias têxteis, de mineração e siderurgia.
Com relação a atividade
comercial, a cidade contava em 1923, com 72 hotéis e pensões, 680 casas
comerciais, 7 cinemas e 1 teatro .Em termos culturais, a cidade assistiu ao
surgimento de novidades como o lançamento da publicação modernista “A Revista”,
do grupo de Carlos Drumond de Andrade e a criação da Universidade de Minas
Gerais encampando as faculdades de direito, de Medicina, as escolas de
Engenharia, Odontologia e Farmácia .
A primeira Estação, logo se mostrou
insuficiente para o fluxo de movimento. Com apenas 22 anos de existência, em
1920 iniciou-se a sua demolição tendo como objetivo a construção de novo e amplo
prédio. A cidade precisava de uma estação mais ampla, mais condizente com a sua
condição de capital em processo vertiginoso de crescimento:
“Prossegue
activamente a demolição do edificio da estação da Central, construido há 22 anos
para em seu logar ser construido um outro de grandes dimensões, que melhor
attenda os serviços da mesma via-ferea, dado o grande desenvolvimento da cidade
e consequentemente de todos os serviços que correm por aquella repartição.
O
armazem de encomendas soffreu algumas modificações para servir de estação
provisória”. ( Minas Geraes, 22 maio1920. p. 5).
As inovações no sistema
de transporte e o aumento do fluxo do ramal ligando Belo Horizonte ao Rio de
Janeiro favoreceram a renovação urbanística e arquitetônica da praça. Com a
necessidade de desafogar e agilizar o tráfego ferroviário, duas obras estavam em
andamento em 1920:
A demolição da Estação Central e a Construção da Estação
da Oeste de Minas.
Esta ultima, construída pelo engenheiro A.G. Gravatá
foi finalizada em 3 de outubro daquele ano em terreno adquirido ao Sr. Francisco
Beltrão . A inauguração da Estação Oeste de Minas veio suprir as necessidades da
Oeste de Minas que antes possuía apenas um abrigo de carros e locomotivas
adaptado para estação de passageiros e mercadorias.
Sua inauguração
contou com a presença do Presidente da República, Epitácio Pessoa; dr. Pires do
Rio, ministro da Viação; Dr. Raul Soares, Ministro da Marinha; Dr. Clodomiro de
Oliveira, Secretário da Agricultura e outras tantas autoridades e representantes
da sociedade mineira .A muralha com sua balaustrada, entre a Estação da Oeste de
Minas e a rua Sapucaí foi construída à época.
“A nova estação da Oeste é
um dos edifícios sumptuosos de Bello Horizonte e uma das construcções mais
perfeitas que nós temos solidez sobriedade e qualidade de materiaes
empregados.
Ella faz honra a Empreza Schnoor, que possue, actualmente um
apparelhamento completo para construcção civis e de estradas de ferro.
A
construcção da grande muralha, encimada por sólida e bella balaustrada, veio
tornar o ponto do novo palácio da Oeste um dos pontos mais pitorescos da
cidade.
A illuminação da via de automóveis, privativa estrada, e de grande
effeito, como também a do interior, principalmente dos grandes salões de espera
em que se destaca, no tecto, uma decoração de ornatos de fino gosto artístico”.
(DIÁRIO DE MINAS, 30 Set. 1920. p. 1.)
Quanto a Estação Central, demolido
o antigo prédio, foi construído um novo, projetado por Caetano Lopes,
engenheiro-chefe da construção, com desenho do arquiteto Luiz Olivieri. O
projeto original sofreu modificações propostas pelo Chefe da Seção de
Construção, Pires e Albuquerque sem contudo perder as características iniciais
.
A pedra fundamental do novo edifício foi lançada em 7 de agosto de
1920, com a presença do Presidente do Estado Arthur Bernardes, o dr. João Luiz
Alves, Secretário das Finanças e do chefe da construção , Dr. Pires e
Alburquerque.
A obra durou pouco mais de dois anos, sendo inaugura em 11 de
novembro de 1922.
“(...) será hoje inaugurada a nova estação de Bello
Horizonte, edificada no mesmo local da antiga e projectada pelo dr. Caetano
Lopes, quando engenheiro-chefe da construção, sendo o desenho do architecto Luiz
Oliviéri.
É um edificio de grandes proporções, onde todos os serviços que
correm por alli passam a ter condigna installação.
Obedecendo ao estylo
romano, a nova estação impressiona agradavelmente pela harmonia de suas linhas
architectonicas.
No primeiro pavimento estão a sala para o agente e destinada
às senhoras, decoradas com muito gosto, existindo outras para o telegrapho e
restaurante, tambem decoradas a caracter, tendo as paredes revestidas de
azulejo.
O grande e sumptuoso hall, com suas columnas de granito envernizado,
é a principal dependencia do edificio, destacando-se os trabalhos de decoração e
de estucamento.
O serviço de água, luz e sanitario é perfeito.
Fiscalizou,
a princípio, o serviço de construção, por parte do dr. Pires e Alburquerque, o
engenheiro Leônidas dos Santos Damazio, auxiliado pelo engenheiro Henrique
Gustavo Tamm”. (MINAS GERAES, 12 nov. 1922. P. 7).
Inicialmente
fiscalizadas pelo engenheiro Leônidas Damazio, as obras foram entregues à
responsabilidade do engenheiro Waldemar Machado de Mendonça a partir do mês de
junho de 1922. O engenheiro e industrial Antônio Gravatá, conduziu a construção,
cabendo a parte elétrica ao engenheiro Ildeu Ramos de Lima.
A inauguração
da nova Estação contou com a presença do Dr. Raul Soares, Presidente do Estado;
Dr. Cristiano Machado, Oficial de Gabinete; Fernando Mello Vianna, Secretário do
Interior; Alfredo Sá, Chefe de Polícia; Dr. Flávio dos Santos, Prefeito de Belo
Horizonte; dr. Ismael de Souza, Diretor da Rede Sul Mineira; D. Antônio dos
Santos Cabral, Bispo da Diocese e tantas outras autoridades .
No ano
seguinte, 1923, foram iniciados e concluídos os trabalhos de construção da ponte
de concreto armado logo em frente a Estação em substituição à ponte metálica
David Campista existente no local e transferida para a rua Guaicurus A nova
ponte construída pela “Cia. Constructora de Cimento Armado” deveria ser
concluída em 4 meses, possuindo 18 metros de largura, 10 metros a mais que a
antiga . Neste ano, a praça recebeu novo nome: “Rui Barbosa” em homenagem ao
grande jurista.
Paralelamente, em fins dos anos 20 iniciou-se a
construção do Viaduto de Santa Tereza. Marco importante para a engenharia civil,
o projeto de construção sob a direção do Dr. Andrade Pinto, subdiretor da 6ª
divisão da Estrada de Ferro Central do Brasil, veio facilitar o acesso ao bairro
Floresta .
Quanto aos jardins, estes sofreram remodelações motivadas pelo
avanço de 14 metros da construção do novo prédio da Estação, o que implicou na
supressão do jardim em frente e a retirada de algumas árvores. O projeto de
remodelação, do arquiteto e desenhista Magno de Carvalho, foi iniciado no lado
direito do rio Arrudas, em setembro de 1924 . As obras prosseguiram pelo ano
seguinte quando foram concluídos o calçamento “a macadame betuminoso”, reparados
o calçamento e os paralelepípedos de alguns pontos perto da fábrica de tecidos
(atual 104). O Arrudas por sua vez, teve toda a margem revestida de pedra e
cercada por balaustres no trecho que atravessa a Praça.
Os jardins na
margem esquerda do Arrudas continuaram em obras até 1925. Seguindo o projeto,
foram construídos nos jardins, dois lagos e duas pérgulas, calçamento feito em
mosaico português ao redor dos jardins e instaladas quatro estatuetas e quatro
leões de mármore de autoria do escultor Folini. Em março de 1925 foi concluída a
iluminação da Praça Rui Barbosa com a instalação de novos postes de bronze com
quatro grandes focos elétricos cada um, sendo reforçados os focos dos antigos
postes . O busto de Anita Garibaldi, inaugurado em 1913 foi transferido para o
Parque Municipal. Todas as obras foram inauguradas em 6 de setembro de 1926
.
Deste período de modificações dos jardins e da própria Estação temos a
descrição sempre oportuna de Pedro Nava em seu livro de memórias “Beira-Mar”
:
“Descendo de Floresta a pé ou de bonde era difícil não passar na Praça
da Estação. Para mim como esquecê-la? (...).
“...Voltei ao Jardim da
Praça da Estação (mesmo caminho de pedra e cacos para meus pés). Fui até ao
busto de Anita Garibaldi que se me afigurou enomenorme sobre sua coluna. Esfinge
estilita. Não me propôs adivinhações. Arrastei meus passos aos pórticos da
Avenida do Comércio e entrei no Éden para afogar as mágoas bailando com
putas...”
“Saímos dali para o restaurante da Estação da Central. Depois
assistimos ao levantar do dia e emendamos o de ontem com o de hoje.
Estação
da Central, Jardim da Praça da Estação... Imagens indissoluvelmente ligadas à do
Ribeirão Arrudas. Lembro dele, de minhas andanças nas suas ribas. Quando suas
águas passavam sobre o dorso Bahia-Januária, parecia um riacho de roça. Para os
lados da estação ele aparecia canalizado, suas margens ligadas por pontes de
cimento. Nelas me debrucei muitas vezes em noites de solidão total, deixando
pender a cabeça, ficando em pontas de pés, empurrando todo o peso do corpo para
a frente, peitoril agora na virilha (só largar, esticar os braços e o equilíbrio
será rompido) – vamos, Pedro! Coragem! Mais um impulso e tudo ficará resolvido
lá embaixo apenas um corpo meio mergulhado na água um fio de sangue da cabeça
quebrada nos calhaus teus miolos rolando Arrudas Velhas São Franciscoceano...”
(NAVA,1985. p. 258-260)
Paralelo às reformas nos jardins da Praça Rui
Barbosa, em 1924 começou a construção dos novos armazéns da Central, obra
empreendida pela firma “Dolabella & Portella. Este melhoramento era
reivindicado pela Associação Comercial de Minas Gerais devido ao grande
desenvolvimento do comercio da cidade, considerada à época um dos maiores
centros de distribuidores de mercadoria do interior do país, ponto de
convergência de estradas de ferro para todo o Estado . Em abril de 1925, as
obras dos armazéns construídos perto do palacete do Conde Santa Marinha estavam
por concluir.
V- As Décadas de 30 e 40 - Mudanças à
vista
A Estação nos Anos trinta
Nos anos 30, enquanto
o centro de Belo Horizonte se valorizava, apresentando os primeiros
arranha-céus, á área suburbana se povoava ultrapassando os limites previstos
pelos idealizadores da capital. A indústria de bens de consumo se expandiu,
empregando em 1936, 1168 operários . Nesta época iniciou-se a implantação da
Cidade Industrial, em Contagem, conseqüência de uma política de industrialização
e modernidade do Estado.
“Os sobrados e bangalôs vão dar espaço aos
prédios. Os bondes, que encurtavam os espaços e propiciavam o encontro, passam a
dividir as ruas com os automóveis. Inicia-se decisivamente a apropriação da
féerie geométrica, onde o descer e subir, os altos e baixos transgrediam os
arbítrios perspéticos do plano. As esquinas agudas e obtusas são apropriadas
pelo transbordamento barroco oriundo de Ouro Preto. Havia um intenso diálogo da
arquitetura com as esquinas - lugar privilegiado da conversa. Belo Horizonte
encontrou o presente, construiu um lugar.” (LEMOS, 1994. p. 35.)
O
lago da Praça nos anos trinta
Em 1931 foram concluídas a Planta Geral da
Capital com novos projetos de subdivisão; a Planta de modificação de subdivisão
de lotes de grande parte da Zona Oeste da cidade e as plantas cadastrais das
ex-colônias Américo Werneck e Bias Fortes .A Avenida Amazonas, com a implantação
da Cidade Industrial perto de Contagem se transformou em principal via de
ligação externa da cidade, unindo a Estação ao polo industrial e este ao mercado
de São Paulo. A cidade tornou-se o mais importante centro industrial, comercial
e financeiro do Estado, contribuindo para isto a instalação da indústria
siderúrgica incentivada pela política do governo de concessão de incentivos,
isenções de impostos e taxas às empresas que se instalassem no município. A Zona
Industrial de Belo Horizonte, localizada ao longo do Rio Arrudas, entre o bairro
de Carlos Prates e o Matadouro Municipal, recebeu mais de 20 novas empresas
atraídas pela proximidade do transporte ferroviário e pelas facilidades para
descarga industrial nas águas do rio .
“Entre 1930 e 1945, Belo Horizonte
oferece aos seus habitantes um espetáculo de beleza, jovialidade e alegre
irresponsabilidade. Poetas e escritores elegem-na musa predileta e única. Há uma
necessidade de conspirar, revolucionar, inovar, descortinar novos e inquietantes
valores.
Nos bondes, bares, e redações dos jornais prega-se um tempo novo.
Uma pequena geração de incendiários talentosos dedica-se a incomodar a mesmice
das idéias. A vida é esta: Descer a Bahia e subir Floresta. Para a época, uma
vida nada besta” (Welber Braga, Antropólogo).
A Praça da Estação ou Rui
Barbosa, começou a nova década com reformas: A essa época, os jardins
apresentavam certa desordem de plantas e a administração pública resolveu
implementar jardins mais simétricos, conservando e simplificando as roseiras
existentes que somavam 250 variedades . Em 15 de julho de 1930 foi inaugurado
logo em frente a Estação, o “Monumento à Terra Mineira”, escultura em bronze do
artista Julio Starace em homenagem ao 150º aniversário do martírio de
Tiradentes.
“Na face lateral direita do mesmo bloco central, figura o
martírio de Tiradentes. No centro do tablado, vê-se a imagem do Proto-Martir,
algemado, rosto alcandorado, na transfiguração do sonho da liberdade. Ladeia-o
um miliciano que procura despir-lhe a camisa para vestir-lhe a alva, preparada
sobre o tablado, e um religioso que leva ao alferes o conforto da palavra de
Cristo. Ao lado direito, ergue-se o patíbulo, vendo-se perto do mesmo o carrasco
que segura a extremidade do baraço, posta ao pescoço do condenado, dispondo-se
para a execução.” (MINAS GERAES, 16 JUL. 1930. P. 5-7)
Alguns anos mais
tarde, em 1936, outro monumento foi integrado à Praça: a “Fonte Luminosa
Independência”. A inauguração deste projeto do Sr. Antônio Corrêa Beraldo deu-se
na noite do dia 3 de setembro daquele ano, tendo custado 48:500$. Um novo
viaduto foi construído ligando a Avenida do Contorno à Praça da Estação acabando
com os acidentes constantes que ocorriam nos trilhos da Central.
A região
da Estação, ocupada desde os primeiros tempos pelo comércio atacadista, hotéis e
pensões, industrias, ainda mantinha em fins dos anos 30, seu status de Portal de
Belo Horizonte, recebendo e despedindo as visitas ilustres ou não. Além de elo
com o mundo externo, a Estação era o ponto noturno freqüentado pelos boêmios e
intelectuais modernistas. São anos de crescimento em que foram ampliadas as
concentrações industriais nas áreas desmembradas do Parque Municipal, tendência
que não prevaleceu nos anos que se seguiram.
“A Praça da Estação em Belo
Horizonte. Duas vezes a conheci: Antes e depois das rosas. Era a mesma praça,
com a mesma dignidade. O mesmo recado para os forasteiros: Esta cidade é uma
promessa de conhecimento, talvez de amor.
A Segunda Central, inaugurada por
Epitácio. O monumento do Starece, encomendado por Antônio Carlos. São feios? São
belos?
São linhas de um rosto, marcadas pela vida. A praça de entrada de Belo
Horizonte... Conta pra gente uma história pioneira. De homens antigos criando
realidades novas. É uma Praça –
Forma de permanência no Tempo.
E merece
respeito...” (Carlos Drumond de Andrade)
CAPITULO II – DE
PORTAL A PASSAGEM: A MUTAÇÃO DO ESPAÇO URBANO
O dinamismo da
economia moderna “desmancha no ar” o que aparentemente é sólido, aniquilando e
ao mesmo tempo recriando instituições, ambientes e idéias que sirvam ao novo
estágio de criação do mundo. Não seria diferente com Belo Horizonte, cidade que
nasceu compromissada com o progresso e por isso mesmo, sujeita às metamorfoses
urbanas impostas por ele.
A década de 40 caracterizou-se por uma mudança
do quadro político, social e econômico do país, sobretudo devido à revolução de
1930, ao golpe de Estado de 1937 e a grande transformação mundial deflagrada
pela Segunda Grande Guerra. O Estado de Minas Gerais apresentava uma nova
conjuntura política, novos partidos e uma maior participação popular nas lutas
por conquistas políticas. A industrialização do Estado foi dinamizada com a
instalação de setores de bens de consumo duráveis e não duráveis.
Para
seguir a “tradição do novo”, a região central de Belo Horizonte foi remodelada.
A cidade tinha que se adaptar às exigências que a modernidade impunha. A Praça
Rui Barbosa, concebida e executada não apenas para atender às necessidades
econômicas e políticas de uma época, mas, sobretudo para demonstrar ao mundo
como a existência moderna seria vivida, não funcionava mais como reflexo, como
expressão simbólica de modernidade. A modernidade de então era outra e novos
significados estavam brotando.
Começava a “era do automóvel” e a Praça
da Estação não seria mais a porta de entrada da cidade. Significativo foi o
pesar do então prefeito Juscelino Kubitschek, em 1941, por não poder substituir
definitivamente os bondes que serviam a população por automóveis, devido aos
problemas trazidos pela Segunda Guerra Mundial. O amor pelas grandes obras e
transformações serviu de certa forma, como uma camisa de força que apresentava
esse novo mundo como o único mundo moderno possível.
Iniciou-se o
processo de verticalização do centro urbano, com a conseqüente valorização do
solo e a substituição das antigas edificações nas áreas disputadas pelas
indústrias e comércios atacadistas. As ruas e avenidas foram remodeladas pela
administração Juscelino Kubitschek de Oliveira que substituiu o paralelepípedo
pelo asfalto. No cenário surgiu a Pampulha, projeto que buscava uma nova ordem
sócio-cultural e estética.
Belo Horizonte se expandiu para a zona oeste,
com a instalação da Cidade Industrial. No impulso modernizante do Prefeito “JK”
foram instaladas avenidas radiais destinadas a integrar as regiões afastadas com
o centro urbano, impedindo o congestionamento do trânsito.
Uma rodoviária
começou a funcionar em 1941, recebendo 105 linhas de ônibus regulares de
transporte intermunicipal. É o início da perda de status e de transformação do
portal da cidade. Não se chegava mais à cidade apenas de trem. Os passageiros
foram aos poucos desaparecendo, permanecendo apenas o movimento de
carga.
“Quando o transporte ferroviário foi desprezado em favor do avião,
a “Praça da Estação” foi abandonada pelos seus antigos visitantes ilustres.
Abandonada também pelo comércio refinado que se transferiu para a Av. Afonso
Pena, viu-se aos poucos abandonada pelos poderes públicos, desvalorizados os
terrenos e construções das suas margens. Não sucumbiu porém, se transformou.
Adaptando-se aos novos tempos se aliou aos humildes habitantes dos subúrbios que
continuavam a chegar e partir nos trens, abriga-os nos inúmeros terminais de
ônibus e lhes oferece os serviços variados de fotógrafos lambe-lambe, ambulantes
e comércio varejista popular.
Assim , assume o caráter de praça do povo como
se conhecesse aquele famoso verso de Castro Alves.
Esta é sua importância
atual, talvez a única praça de Belo Horizonte verdadeiramente popular. Do povo,
no dia a dia, indo e vindo do trabalho e nas suas grandes Festas do natal e do
São João.(forró de Belô).
Aí está a motivação maior de sua preservação: A
Praça da Estação, com seus jardins, estátuas, edifícios que o cercam e
configuram, constitui ainda hoje patrimônio ambiental do povo que a freqüenta e
usa. Não é um local de rica história ou de belos monumentos mortos” (CASTRO,
José Carlos Laender de. Parecer para Tombamento, 01 jun. 1981.)
A Capital
participava de 31% do produto industrial do Estado. Mesmo com os problemas
advindos com a situação do pós-guerra a “Belo Horizonte Industrial”, nos anos
seguintes, se firmou como o centro do Estado.
“Um grito porém é preciso
dar. Até quando viveremos assim, entregues à própria sorte, criança desamparada,
sem um plano, uma rota a guiar os nossos passos? Até quando crescerá Belo
Horizonte sem um Plano Diretor, sem uma comissão de Técnicos capazes?”. (Sylvio
de Vasconcelos, Arquiteto).
Na década de 50, uma nova era se inicia para
as Estação Central e sua Praça.
Sinal dos Tempos.
“Belo Horizonte já
não tem mais aquele ar de coisa inaugurada, o tempo já patinou a cidade, o
aspecto de feira internacional desapareceu. Hoje o forasteiro não vê mais Belo
Horizonte, porque a vive. A cidade não é mais um problema de urbanização
forçada, que atrai nossa curiosidade a nossa critica. Hoje, Belo Horizonte é uma
cidade como as outras e o que ela tem de excepcional, ou de melhor, não são
teorias aplicadas – as próprias teorias foram patinadas pelo tempo e
desapareceram – mas conquistas profundamente humanas”(Mário de Andrade,
Escritor)
Em 1951, pela primeira vez, uma lei (Lei nº 232, de 08 de
julho), pretendeu corrigir as deficiências urbanísticas e planejar novos núcleos
de habitação’. Esta lei, promulgada pelo prefeito Américo René Gianetti, foi
considerada o primeiro Plano Diretor da cidade. Contudo, o crescimento
desordenado e a verticalização prosseguiram nas décadas seguintes.
Ainda
no início da década de 50 foram implantados os ônibus elétricos para atenderem
ao transporte urbano. Belo Horizonte foi a primeira cidade da América Latina a
fazer uso dos trolebus. A primeira linha foi instalada na Avenida Afonso Pena,
seguida da linha da Praça Rui Barbosa e Praça Raul Soares.
No final dos
anos 50, com aproximadamente 350 mil habitantes, Belo Horizonte ultrapassara, em
muito, os espaços de ocupação previstos por Aarão Reis. O centro, sufocado pelo
tráfego e adensamento populacional assistiu novamente, a transferência do
comércio requintado, dessa vez para o bairro dos Funcionários. Para os pequenos
comerciantes que não conseguiam se manter no centro a alternativa foi mudar para
a região norte.
O desenvolvimento do transporte rodoviário no Estado
provocou a mudança no uso e na clientela da Estação Ferroviária, restringindo-o
ao transporte de cargas (principalmente) e a alguns poucos trens suburbanos,
intermunicipais e interestaduais. O trem foi perdendo a importância como meio de
transporte, para o ônibus, o automóvel e o avião.
Novas modificações
foram impostas a Praça da Estação, ainda nos anos 50, com o objetivo de melhorar
o trânsito. A praça tornou-se o ponto final de diversos bondes e trolebus, além
de suportar o tráfego cada vez maior de automóveis e ônibus. Várias árvores
foram derrubadas e os passeios foram recortados para colocação de pontos de
embarque.
A década de 60 trouxe a duplicação da avenida dos Andradas,
que buscou desafogar o trânsito no centro da cidade. Esta obra atingiu
diretamente a Praça da Estação pois diminuiu seu espaço físico, eliminou um lago
e removeu monumentos, transferidos para outros locais (dois leões e duas
estatuetas representando o Inverno e o Outono).
A nova política de
transporte terrestre adotada pelo Governo Federal transformou definitivamente o
transporte nacional. Em 1966, pela portaria nº 385, do Ministro de Viação e
Obras Públicas, foi criado um grupo para substituição das ferrovias e ramais
considerados “antieconômicos”. O resultado foi a supressão ou substituição de
9.000 km de linhas férreas em todo o país, sendo Minas Gerais atingido em
aproximadamente 2.500 km de ferrovias. Os leitos dos trens deveriam ser
aproveitados para abertura de rodovias e parte do patrimônio da Rede Ferroviária
(edificações, estações, galpões, áreas, trilhos, etc) que não fossem úteis para
o serviço ferroviário poderiam ser requisitados por prefeituras para novo uso.
Esta nova política selou o fim definitivo da “era do trem”. Refletindo
esta mudança de status, a Praça Rui Barbosa transformou-se de portal de entrada
da cidade em mero local de passagem, seu sentido perdido em meio às mutações do
espaço urbano.
No final da década de 60 os ônibus a diesel substituíram
os trolebus. Noticias sobre o metrô de São Paulo começaram a chegar a cidade e o
então prefeito Souza Lima considerou a idéia de construir uma linha ligando a
Gameleira ao Horto. Estudos para a implantação do metrô em Belo Horizonte
chegaram a ser realizados, detectando-se os eixos de crescimento na cidade e o
aproveitamento do leito da antiga Ferrovia Central do Brasil. O projeto não se
consolidou e a idéia somente seria retomada nos anos 80.
Um fato ocorrido
em 1969 demonstra exemplarmente, a perda de sentido da Praça enquanto monumento
evocativo da grandeza e modernidade da “nova” Capital. Nesse ano foram retiradas
de seus jardins outras duas estatuetas em mármore (Primavera e uma camponesa),
transferidas para o Palácio da Liberdade.
Conforme declarou o engenheiro
Miguel de Paiva, responsável pelos jardins do Palácio do Governo, a
transferência se justificava pelo fato de na Praça as peças estarem “jogadas no
meio de um mal cuidado jardim, sujeitas a chuvas e trovoadas e dilaceradas pelos
passantes”, enquanto em seu novo local elas trariam “imponência” ao Palácio.(1-
Grillo)
Entre os anos 60 e 70 houve a consolidação do processo de
oligopolização da economia, sustentado pelo Estado durante o Regime Militar.
Durante o chamado “Milagre Brasileiro”, o governo mineiro passou a ter condições
de atrair investimentos estrangeiros e novas industrias se instalaram na região
metropolitana de Belo Horizonte, expandindo a cidade para o norte (Venda Nova,
Ribeirão das Neves, Vespasiano e Santa Luzia) e oeste (Contagem e Betim). Para
atender as exigências destes novos eixos tecnológicos era necessário um sistema
viário dinâmico.
Como solução para os problemas de transporte urbano nas
grandes metrópoles do país, foi criada, em 1976, a Empresa Brasileira de
Transportes Urbanos (EBTU), que atuou primeiramente nos estados de São Paulo e
Rio de Janeiro. A partir do início dos anos 90, voltou-se para Belo Horizonte
com o compromisso de modernizar os trens suburbanos e construir o
metrô.
A Estação nos anos oitenta
No fim dos
anos 70 o regime militar iniciou a abertura “lenta e gradual”, com a revogação
dos atos institucionais, anistia, convocação de eleições diretas para governos
estaduais e a abertura para que diversas lideranças populares e da sociedade
civil se inserissem em partidos políticos e interagissem nas diversas instâncias
administrativas. O período marca ainda o fim do “milagre” econômico, o início da
recessão, do desemprego em massa e a retomada dos espaços públicos pela
sociedade civil.
A Praça Rui Barbosa volta a ser palco, durante os anos
80, de manifestações políticas, comícios, passeatas, tornando-se espaço de
interlocução entre sociedade civil e governo, revivendo, sob este aspecto, seu
período áureo. Sob o ponto de vista físico contudo, continuou ‘abandonada’ pela
administração pública, com seus jardins e monumentos abandonados, suas
edificações desvalorizadas, fechadas e muitas vezes depredadas.
Durante a
década de 80 a cidade viveu reflexos desse processo de crescimento econômico
acelerado que não foi devidamente acompanhado por políticas sociais e urbanas.
As condições do transporte coletivo tornaram-se cada vez mais precárias: já não
existia o bonde, os trolebus também não resolveram o problema e a frota de
ônibus era pequena para atender a demanda da população. O metrô surgiu como a
solução para o impasse do transporte público.
O plano para a melhoria do
sistema viário de Belo Horizonte foi considerado prioritário pela EBTU, uma vez
que o metrô de São Paulo e do Rio já estava funcionando. A capital mineira era a
terceira capital em desenvolvimento do país e o metrô era a forma de solucionar
a questão do estrangulamento do transporte de cargas na região metropolitana e
melhorar o transporte de massa na cidade. Retomou-se a idéia de aproveitamento
do leito e dos trilhos já existentes para o transporte de cargas e para o trem
de subúrbio.
Na proposta, prevista para ser iniciada em 1982, a Praça
Rui Barbosa seria mais uma das inúmeras estações do trem metropolitano. O
projeto da Geipot/ Metrobel/ EBTU pretendia instalar ali, dezenas de terminais
de ônibus, para fazer a integração com o metrô, ameaçando demolir o antigo
conjunto arquitetônico.
Tal perspectiva mobilizou grupos de defesa do
patrimônio da cidade que, liderados pelo IAB-MG, lançaram uma campanha de
conservação e revitalização do Conjunto da Praça Rui Barbosa, transformando-a em
um pólo cultural na área.
A polêmica sobre a implantação do metrô na
Praça Rui Barbosa foi acirrada. Ainda em 1980 a IAB/MG começou uma campanha na
imprensa local pela preservação do conjunto arquitetônico da Praça Rui Barbosa
(DT, 08/12/80), ameaçado de descaracterização pelas obras do metrô. O apelo
contra a “amnésia cultural” da cidade foi o mais utilizado e o abandono e
destruição de outros monumentos e espaços foram citados como exemplos trágicos
da busca infindável pela modernidade.
A Estação nos anos
oitenta
Em agosto de 1981 foi realizado o Encontro pela
Revitalização da Praça da Estação, promovido pelo IAB/MG e que contou com a
participação de representantes dos poderes públicos que propunham a instalação
do metrô e representantes políticos e de entidades civis de proteção do
patrimônio cultural.
Além dos debates sobre a importância da preservação
do Conjunto da Praça Rui Barbosa, aconteceram exposições fotográficas e projeção
de filmes sobre a mesma, com ampla cobertura da imprensa local.
Durante o
Encontro foram discutidas formas de preservar, valorizar e difundir a memória
histórica evocada pelo Conjunto da Praça Rui Barbosa, palco de diversos “fatos
políticos, vivências coletivas e tradições culturais” (fala do Secretário M.
Cultura George Norman Kutova, 12/08/81).
No Encontro, foi solicitada
imediata suspensão do projeto do Geipot para o Conjunto da Praça Rui Barbosa.
Durante o evento foi anunciado projeto de lei municipal para criação do Conselho
Municipal de Tombamento e solicitado o tombamento imediato do Conjunto da Praça
Rui Barbosa pelo IEPHA/MG.
Diversas das moções aprovadas durante o
encontro refletiram uma reação da sociedade frente à destruição da memória
histórica da cidade, representada pela Praça Rui Barbosa. A reabilitação da
Praça era a reabilitação da história e da memória de Belo Horizonte, uma vez que
era vista como parte vital da identidade de seus habitantes.
Redescobrir
a Praça Rui Barbosa era descobrir novo significado e potencialidade nas ‘velhas
coisas e formas de vida’. Espelhando esse movimento foram aprovadas as seguintes
moções:
- Solicitação ao prefeito para institucionalização de uma
COMISSÃO com o objetivo de definir as linhas básicas de uma política de
preservação para o município, considerando aspectos relativos ao seu patrimônio
histórico, cultural e artístico, começando pelo conjunto da praça da
estação;
- Acompanhamento de todos os processos de intervenção em áreas
de interesse de preservação por parte da Comissão, que funcionaria como uma
Câmara Consultiva;
- Realização de ajustes e acertos à Lei de Ocupação e
Uso do Solo de BH para a área do Conjunto da Praça Rui Barbosa e seu entorno,
considerando o cadastro das edificações e espaços de interesse histórico para
preservação.
- Exigência ao poder público de colocar em discussão junto à
sociedade civil todos os projetos e obras em áreas de interesse de preservação,
antes que fossem detalhados tecnicamente;
- Comprometimento do poder
público municipal quanto a sua competência sobre o uso do solo urbano,
coordenando os diversos projetos dos órgãos estaduais e federais que possam
interferir neste uso e levando-os ao conhecimento da população para que ela
possa se manifestar sobre eles;
- Realização de um concurso público
nacional para elaboração de plano de reurbanização, em nível preliminar, para a
região da atual Praça Rui Barbosa e de implantação de terminal do metrô, uma vez
que o atual projeto desfigurava o Conjunto da Praça;
- Preservação dos
prédios, na medida do razoável e seu aproveitamento para atividades
culturais;
- Realização do paisagismo da Praça apenas com espécies
nativas;
- Aceleração do processo de regulamentação da lei municipal que
instituiria a Fundação Municipal de Cultura;
- Constituição imediata da
Comissão Municipal de Tombamento sob a presidência do Secretário Municipal de
Cultura, Turismo e Esportes. (Citar livro e pág. 39-40)
Apenas um ano
depois, no entanto, a IAB voltava a denunciar o não cumprimento dos acordos
firmados durante o Encontro de 1981. Em reportagem do Estado de Minas datada de
03 de janeiro de 1982, cobrava-se o tombamento do Conjunto da Praça, ainda
pendente e denunciava-se plano da Metrobel de construir na Praça um terminal de
embarque com nada menos que 35 pontos de ônibus, em frente ao prédio da antiga
Estação, projeto que não se realizou contudo.
Em julho do mesmo ano o IAB
mais uma vez correu em defesa do Conjunto da Praça, denunciando a burocracia no
processo de tombamento levado a cabo pelo IEPHA/MG. Órgão responsável pelo
tombamento, o IEPHA/MG não sabia dar informações sobre o mesmo, uma vez que este
havia sido encaminhado para a Secretaria de Planejamento para aprovação. Como a
própria reportagem ressaltou, este fato era inédito, uma vez que o órgão nunca
precisou de autorização de outro para tombar um bem. Com ceticismo era encarada
também a liberação por parte do Governo Estadual de verba de 300 milhões de
cruzeiros para a criação, na Praça, do Centro de Cultura Popular, o que de fato,
não aconteceu.
O ano de 1983 começa com novas denúncias contra as obras
do metrô, que derrubaram, em maio, parte de antigo armazém que serviu de oficina
ao Conde de Santa Marinha, construído em 1896, para a passagem das linhas do
metrô. Ainda neste ano o Conjunto da Praça Rui Barbosa sofreu mais um revés.
Durante as obras de canalização do rio Arrudas, foi colocada uma murada de
concreto às margens do rio e retirada a antiga ponte construída em 1896 na rua
Guaicurus, empobrecendo esteticamente o conjunto.
Em novembro de 1983, o
vereador Arutana Coberio Terena encaminhou à Câmara Municipal um projeto de lei
estabelecendo o Conjunto da Praça Rui Barbosa como área de urbanização restrita.
Junto com o projeto de lei foi encaminhada proposta para revitalização da área,
transformando-a em um espaço cultural.
O atraso na homologação do
tombamento estadual do Conjunto da Praça Rui Barbosa por parte do IEPHA/MG
tornou mais difícil evitar a descaracterização do local pelas obras de
construção do trem metropolitano. Em dezembro de 1985, reportagem do Jornal de
Casa denunciou as modificações levadas a cabo no local, mesmo diante de
tombamento provisório do IEPHA. Eram lembradas com pesar derrotas sofridas pela
população e pelos preservacionistas como o Cine Metrópole (1983), o Palacete dos
Guimarães na Av. João Pinheiro e a área junto ao Bemge na Praça Sete (1984) além
da então recente descaracterização do Cine Brasil (1985).
Na luta pela
preservação dos bens culturais da cidade, IAB e a Associação de Estudos do
Patrimônio Cultural (AEPAC) foram, durante a década de 80, os principais agentes
preservacionistas da época, denunciando à imprensa e exigindo medidas dos órgãos
e instituições públicas responsáveis.
Depois de muita briga, o metrô
acabou usando o leito das ferrovias e os prédios das antigas estações da Central
do Brasil e da Rede Mineira de Viação se transformaram em um ponto de parada.
Embora, do ponto de vista arquitetônico, o Conjunto da Praça Rui Barbosa tenha
sido preservado, sua necessária revitalização, principalmente de uso, não
aconteceu.
O metrô entrou em operação comercial em agosto de 1986, no
trajeto ligando a estação da Lagoinha à do Eldorado. O trecho Lagoinha- Estação
Central só foi inaugurado em março de 1987 e logo depois as obras do metrô foram
paralisadas por falta de verbas.
O uso do metrô como solução para o
problema viário foi frustrado pela falta de obras complementares que
possibilitassem sua integração com o sistema de ônibus. O isolamento de algumas
estações e a falta de segurança levou a população a optar preferencialmente
pelos ônibus.
O ano de 1987 foi marcado pela campanha em prol da
preservação do prédio da antiga Serraria Souza Pinto, ao lado do Viaduto Santa
Tereza, então transformado em estacionamento e oficina mecânica. Em julho, o
prédio foi adquirido pelo Governo estadual e um projeto de restauração começou a
ser elaborado, prevendo sua transformação em um Centro Cultural, fato que só se
concretizou em 1997.
Finalmente, em 15 de março de 1988, através do
Decreto nº 27.927, foi homologado o tombamento estadual do Conjunto Paisagístico
e Arquitetônico da Praça Rui Barbosa e, logo após, foi iniciado o processo de
restauração do antigo prédio da Estação Ferroviária da Central do Brasil e dos
armazéns da Rede Ferroviária, ficando a obra concluída em 1989.
Em abril
de 1989 foi inaugurado o Centro Cultural da UFMG, sediado no prédio da antiga
Escola de Engenharia. Em julho do mesmo ano a Rede Ferroviária Federal
inaugurou, no Casarão do Conde de Santa Marinha, o Núcleo Histórico Ferroviário.
Tais realizações evocaram e pareceram anunciar que o antigo sonho de transformar
o Conjunto da Praça Rui Barbosa em um “corredor cultural”, integrando as
diversas edificações estava para se concretizar.
Durante a década de 80,
a Praça Rui Barbosa passou a ser utilizada pelo poder público como espaço de
promoção de festas populares e shows musicais. A população por sua vez, desde o
final da década de 70 apropriou-se do local para manifestações políticas.
Durante a campanha presidencial de 1989 a Praça Rui Barbosa serviu de
palco de diversos comícios. Contudo, cotidianamente, a Praça continuou tendo um
papel marginal em relação à cidade, comparativamente ao que tinha nos anos 20 e
30. No local, continuaram se concentrando pontos de ônibus e camelôs. Seus
jardins reduzidos e mal cuidados, seus poucos bancos, eram utilizados muitas
vezes, como abrigo para mendigos e menores de rua.
Em dezembro de 1998 o
Conjunto Urbano da Praça Rui Barbosa e adjacências foi reconhecido pelo
município através do instituto do tombamento.
A Praça de hoje não lembra
o lugar agradável dos primeiros anos da Capital. O crescimento da cidade mudou
seu projeto inicial. Contudo, ela não está morta e neste movimento dialético
valorização – degradação, a Praça Rui Barbosa segue, corajosamente, lembrando
aos belorizontinos que somente mantendo vivos seus laços com a “modernidade do
passado” poderão criar um presente verdadeiramente moderno e um futuro no qual
não percam o que têm de essencial, significativo e real.
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