INTRODUÇÃO:
Educação e Patrimônio
A Educação Patrimonial é um
trabalho permanente de envolvimento de todos os que compõem a comunidade e tem
como objetivo a preservação dos lugares e espaços, casas e manifestações
culturais importantes para todos, compartilhando responsabilidades e
esclarecendo dúvidas, conceitos e ao mesmo tempo divulgando trabalhos sobre
esses bens culturais.
Visa principalmente fortalecer a autoestima
das comunidades através do reconhecimento e valorização de sua cultura e seus
produtos.
A Educação Patrimonial é um
trabalho de “auto-despertar” motivado, que trabalha com a cultura da comunidade
ou grupo social.
As comunidades devem participar
de todas as atividades ligadas à preservação do Patrimônio Cultural: desde o
inventário, tombamento, a manutenção, fiscalização, restauração e utilização.
Assim, a Educação Patrimonial
deve ser entendida como um conjunto organizado de procedimentos e ações que têm
como principal objetivo à valorização das comunidades e todo a sua produção
cultural.
Esse conjunto de textos em linguagem simples tratam sobre as questões relativas à preservação do Patrimônio Cultural.
TEXTOS DIVERSOS: 1 - OS PROJETOS DE EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL DO IEPHA DE 1994 A 2010 |
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I - APRESENTAÇÃO: O Projeto Educação,
Memória e Patrimônio foi uma experiência pioneira do IEPHA/MG com educação
patrimonial realizado em
II - INTRODUÇÃO: O Estado de Minas
Gerais concentra inúmeras e diversificadas manifestações culturais espalhadas
por toda sua extensão territorial, fruto de suas raízes históricas, suas
potencialidades socioeconômica e rica herança cultural. O empenho para a criação de
uma instituição destinada à preservação do patrimônio cultural coube aos
intelectuais modernistas, encantados com a homogeneidade das cidades do
período colonial mineiro, que preservavam praticamente intacto o seu acervo
arquitetônico e artístico do século XVIII. Graças a estes expoentes da
intelectualidade brasileira dos anos vinte, foi criado em 1936 o Serviço do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, atual IPHAN, regulamentado pelo
Decreto –Lei n.º 25 de 30 de novembro de 1937. Este órgão de Proteção
sustentado pelo instituto do Tombamento e sob a direção do Dr. Rodrigo Melo
Franco de Andrade irá empreender a proteção dos grandes núcleos históricos e
dos monumentos mais expressivos de nossa cultura até os anos 70 superando
dificuldades e se consolidando. Em abril 1970, o
encontro de Governadores realizado em Brasília definiu que os Estados e
municípios deveriam compartilhar a proteção do Patrimônio de expressão local,
criando os seus órgãos de preservação: 1- Reconhecem
a inadiável necessidade de ação supletiva dos Estados e Municípios à atuação
federal no que se refere à proteção dos bens culturais de valor “nacional”. 2- Aos
Estados e Municípios também compete, com a orientação técnica da DPHAN, a
proteção dos bens culturais de valor regional. 3 – Para a
obtenção dos resultados em vista, serão criados onde ainda não houver, órgãos
estaduais e municipais adequados, articulados devidamente com os Conselhos
Estaduais de Cultura e com a DPHAN, para fins de uniformidade da legislação
em vista, atendido o que dispõe o art. 23 do Decreto-Lei 25, de 1937. Seguindo a
orientação do “Encontro de Brasília”, em 1971 o governo do Estado de Minas
Gerais, criou o IEPHA/MG, fundação integrante do Sistema Estadual de Cultura com
a atribuição básica de preservar o patrimônio cultural do Estado empreendendo
a identificação, registro, fiscalização e restauração dos bens culturais
tangíveis e a partir de 2002, dos bens imateriais. Em âmbito nacional,
em 1973, o governo federal criou o Programa Integrado de Reconstrução das
Cidades Históricas do Nordeste, que tinha como principal objetivo a promoção
e utilização dos bens culturais pelas comunidades. No entanto o papel
destinado a essas “ainda era de mediar o gozo estético de seres estranhos à
função social dos bens culturais: buscava-se atrair turistas”.[1] Essa iniciativa
permitiu o surgimento de experiências, ainda que esporádicas de atuação
conjunta das instituições preservacionistas e as comunidades contempladas. Ao longo dos mais de cinquenta anos de existência, o IEPHA/MG, cumpriu com relativa desenvoltura as
suas funções de proteger, gerenciar e estudar o patrimônio cultural do
Estado. No entanto, o número reduzido do seu corpo técnico e a grande
extensão territorial de Minas Gerais, aliada à diversidade do acervo
cultural, cedo demonstrou a necessidade de parcerias para o desenvolvimento
dos trabalhos. Já em 1981, esta necessidade se fazia premente e o
envolvimento das comunidades na preservação, uma solução. Um programa com esta
finalidade foi idealizado: É cada vez mais premente a necessidade
de consolidação de um programa de conscientização cultural das comunidades
perante os valores do patrimônio histórico e artístico do Estado, condição
básica para sua permanência como uma das grandes heranças espirituais do País
e até para que se resguarde a própria responsabilidade pela história de Minas
Gerais. (...) Pelo fato de Minas Gerais
possuir o maior número de cidades históricas do País, de contar com um dos
mais significativos acervos barrocos e por Ouro Preto ter sido declarada
Cidade Monumento Universal pela UNESCO, o IEPHA/MG, dentro de suas
atribuições e voltado para um trabalho cada vez mais integrado com as
comunidades, vem estudando a definição de um programa educativo capaz de
contribuir com acerto para a formação da desejada consciência coletiva diante
dos valores históricos e artísticos do Estado. Nesse sentido, conscientizar as nossas
populações sobre o direito comunitário de propriedade e o dever de todos na
preservação dos bens culturais móveis e imóveis de Minas Gerais significa
despertar e promover o “sentimento de respeito da comunidade” pelas tradições
de interesse histórico, artístico, arquitetônico e ecológico. O objetivo principal do IEPHA/MG, com
o programa de conscientização a nível de comunidade, visa deflagrar o
conhecimento mais amplo do nosso rico patrimônio cultural, condição
fundamental para garantir sua defesa e consequentemente, o trabalho de
restauração, conservação, valorização e divulgação dos bens tombados ou não
de cada comunidade.”[2] Esse programa de
1981 definia como prioridade a promoção do conhecimento a acerca do
patrimônio Cultural com utilização de audiovisuais e filmes documentários e
concursos em escolas, promoção de palestras, exposições fotográficas e
distribuição de material institucional referente aos conceitos e conteúdo dos
programas de restauração desenvolvidos pela instituição à época, denominados
PCH – Programa de Cidades Históricas e POU – Programa de Obras Urgentes.
Pretendia também, um trabalho junto às universidades incentivando as
pesquisas referentes ao Patrimônio Cultural. A ação comunitária é o esforço cooperativo e conjugado de uma
comunidade que procura tomar consciência de seus problemas e busca
resolvê-los desenvolvendo seus próprios recursos e potencialidades, contando
para tanto com a colaboração de seus líderes, grupos e instituições.[3] No entanto foi
somente em outubro de 1983, com a criação do PAC – Política de Atuação com as
Comunidades, que a instituição efetivou de fato um programa de conscientização
das comunidades com o principal objetivo de romper com o paternalismo
estatal. A política de atuação do PAC partia do pressuposto de que todo bem
cultural é “uma referência histórica necessária à formulação e realização do
projeto humano de existência”. A Política de Atuação com as
Comunidades – PAC parte do pressuposto de que todo bem cultural seja uma
referência histórica necessária à formulação e realização do projeto humano
de existência. Por diferentes caminhos, diferentes
pessoas podem descobrir diferentes aspectos do valor cultural de um mesmo
bem. Mas, a ninguém é dado percebê-lo em sua totalidade, do mesmo modo que é
vedado a uma só pessoa o acesso às infinitas imagens possíveis de serem
projetadas sobre um só espelho. (...) A condição necessária, para que este
modo de atuação funcione plenamente é a de que as comunidades locais possam
se assenhorar, não apenas de seus valores culturais, mas também, dos tributos
que lhes escapam das mãos. (...) Deste modo, a criação e o
desenvolvimento de entidades locais, encarregadas do patrimônio local e
sustentados pelas próprias comunidades, aparece como variável estratégica,
capaz de equacionar o problema da deterioração do acervo cultural de Minas. Uma das metas, fundamentais da
Política de Atuação com as comunidades do IEPHA/MG é, precisamente, a de
fomentar a criação e o desenvolvimento daquelas entidades. Neste sentido,
cumpre-lhe oferecer às comunidades locais subsídios para que possam se
organizar de modo adequado.[4] Assim, para
empreender essa descentralização foi criada ainda nos anos 19 Entretanto, apesar
de todo o trabalho empreendido, como a criação de um caderno técnico com
conceitos e diretrizes para a proteção do patrimônio cultural, e uma cartilha
do patrimônio cultural (publicada em 1989), os resultados não foram tão
satisfatórios. III - O PROJETO EDUCAÇÃO MEMÓRIA E PATRIMÔNIO Em 1994, tendo em
vista a continuidade dos trabalhos de conscientização e entendendo que
somente a criação de uma sistemática de socialização do conhecimento de todas
as questões que envolvem o patrimônio cultural poderia assegurar às
comunidades a participação na construção de sua história, o IEPHA/MG resolveu
investir em um pioneiro projeto de educação patrimonial. Esta nova empreitada
pretendia conscientizar as novas gerações sobre a importância da preservação,
entendendo serem elas as futuras guardiãs deste acervo cultural. Para sua
realização foram envolvidas as superintendências das duas diretorias técnicas
da instituição (Diretoria de Proteção e Memória e Diretoria de Conservação e
Restauro) e a Secretaria de Estado da Educação. Sob a Coordenação da
arquiteta Aurora Pederzoli em parceria com a Assessora Técnica Geny Lima, o
“Projeto Educação, Memória e Patrimônio" foi desenvolvido
experimentalmente objetivando a promoção de ações educativas de
identificação, valorização e proteção de bens culturais junto a escolas
públicas estaduais: “Considerando a Educação como uma das bases
do processo de constituição da identidade cultural, o presente Projeto
destina-se a implementar, apoiar e assegurar a continuidade de ações de
caráter educativo em unidades escolares estaduais, no sentido de que possam
ser transmitidos e refletidos criticamente, conteúdos sobre educação, Memória
e Patrimônio [6]. Os trabalhos desenvolvidos em duas escolas escolhidas como piloto foram divididos em duas fases que contaram com um ativo envolvimento dos técnicos do IEPHA/MG: - A Primeira fase
consistiu em planejamento e realização do curso "Conversando com quem
trabalha com Patrimônio Cultural", dirigido ao professores e
supervisores das duas escolas envolvidas, tendo como objetivo“ proporcionar
informações e atividades correlatas de cunho metodológico com a finalidade de
inserção dos conceitos básicos do trabalho com Patrimônio Cultural e História
local no currículo da escola de 1º grau” e construir uma didática de
abordagem sobre o tema dentro das salas de aula tratando principalmente das
questões conceituais. Em três dias foram ministrados os seguintes conteúdos:
Avaliação: Em termos de conteúdo,
verificou-se que todas as informações passadas são da maior relevância,
quando se pretende trabalhar as questões referentes ao Patrimônio
Cultural junto às comunidades escolares. Entretanto, alguns itens devem ser
observados com relação às palestras, quais sejam: - a simplificação da
linguagem técnica, a fim de que se torne acessível para os professores; - a preocupação em
estabelecer elos de ligação entre um tema e outro, no sentido de se formar
uma sequência de pensamento; - o tempo de duração
das falas, visando manter o nível de interesse dos participantes. Ainda nessa fase
foram realizadas visitas orientadas ao Palácio da Liberdade
- A Segunda fase
consistiu no trabalho de campo propriamente dito, envolvendo as escolas
estaduais "Barão de Macaúbas" Na Escola Estadual
"Barão de Macaúbas", foram envolvidas duas turmas do 3º ano do
ensino fundamental, trabalhadas pelos técnicos: Elinete P. Vasconcelos,
Carlos Henrique Rangel, Rodrigo Faleiro, a coordenadora Aurora Perdezoli, e a
assessora Geny Lima. Na Escola Estadual "Zoroastro Vianna Passos"
foram envolvidos alunos do ensino fundamental e médio, trabalhados pelos
técnicos, Elisabeth S. de Carvalho, Tarcísio Guadalupe S. F. Gomes, Delmari
Ribeiro, Rodrigo Faleiro, a coordenadora Aurora Perdezoli e a Assessora Geny
Lima. O trabalho
denominado Jornada do Patrimônio Cultural foi precedido pela definição das
atividades a serem desenvolvidas e elaboração do plano de trabalho. Devido ao
ineditismo da experiência, foram muito discutidas as formas de abordagens
adotadas. A coordenação do projeto em reunião como os professores identificou
as temáticas de interesse dos alunos e definiu a abordagem inicial dos
docentes, que consistiria basicamente em um trabalho interativo,
participativo e envolvente.Com relação ao material didático todo ele foi
elaborado pelos técnicos, assim como a sugestão para roteiro de pesquisa,
reprodução do acervo histórico/fotográfico da Casa Borba Gato em Sabará, além
da confecção de slides para os Jogos de Memória, e propostas de atividades. Escolas diferentes,
com turmas diferentes, obtiveram resultados diferentes, com utilização de
metodologias e ações diferentes. Todos satisfatórios. Na escola de
Sabará os destaques foram as visitas guiadas e as duas peças teatrais criadas
pelos próprios alunos com a temática referente à preservação da memória e do
patrimônio cultural. Avaliação: Considerando-se o fato de
que seriam três os roteiros a serem percorridos na cidade, os historiadores
ativeram-se basicamente a dois, em decorrência do escasso tempo da palestra e
diante da grande quantidade de informações a serem transmitidas. Entretanto,
todos os relatos revelaram-se de grande importância para a uniformização da
linguagem a ser utilizada em campo pelos técnicos do IEPHA/G. (...) A distribuição dos 90 alunos e 03
professores nos três roteiros ocorreu de forma desordenada e desigual,
denotando a falta de compromisso e interesse dos professores para com o que
havia sido estabelecido no encontro anterior (30 alunos e 01 professor em cada roteiro). (...) Observou-se novamente, que embora de
aparente interesse, a quantidade de informações foi considerada excessiva,
prolongando em demasia o tempo despendido em cada edifício. Uma decorrência
disto foi a interrupção de dois roteiros, diante da forte chuva que caiu
aproximadamente às 17 horas, ou seja, muito tempo após o que poderia ser
considerado prazo razoável para o fechamento dos percursos. Além disto, não houve praticamente
nenhuma contribuição por parte dos alunos, os quais portaram-se como meros
espectadores e não como atuantes na construção do conhecimento. (...) Deve-se destacar a apresentação de
duas peças de teatro, a leitura de alguns trabalhos, o envolvimento da
comunidade (padre e pesquisadoras locais) e o depoimento de grupos de alunos
que, por motivos diversos, não conseguiram apresentar um “produto final [7]” Na Escola Estadual
"Barão de Macaúbas", devido à juventude dos alunos, a equipe optou
por uma abordagem questionativa, retirando dos próprios envolvidos, os conceitos
relativos à ideia de Patrimônio Cultural, utilizando o vídeo de desenho
animado “Alo Amigos” de Walt Disney, descontraído e aparentemente
desvinculado da temática. Os alunos foram estimulados a se manifestarem com
relação às imagens apresentadas que retratavam a paisagem brasileira da
década de 40, em contraste com a realidade atual. Foram utilizados a seu
tempo, questionários, recursos audiovisuais com imagens de bens tombados A utilização de vídeo contendo desenho
animado descontraiu a turma e estimulou as crianças a falarem espontaneamente
sobre o Patrimônio Cultural, construindo elas mesmas o seu conceito e noção
de importância. O número de slides utilizados (45)
pode ser considerado excessivo na medida em que o tempo de duração da
exposição é longo; entretanto, sua aceitação pelos alunos foi excelente,
gerando questionamentos diversos e surpreendentes, se levada em conta a sua
faixa etária (09 anos) (...) Os alunos receberam cópias de um
trecho da Planta Cadastral da Administração de Juscelino Kubitschek, datada
de 1942, com o percurso a ser feito devidamente “ iluminado”: Saindo da Escola,
passando pela Praça Zamenhoff, Av. Assis Chateaubriand (antiga Tocantins),
Av. Francisco Sales, R. Itajubá, R. Silva Jardim, com uma parada na Igreja
Nossa Senhora das Dores. A medida em que comparavam a numeração
antiga com a atual das edificações, os alunos identificavam a idade
aproximada das edificações e seus respectivos estilos. No interior da Igreja, foram
respondidas as questões apresentadas pelos alunos quanto a estilo,
ambientação, simbologia, dentre outras. A caminhada livre, sem excesso de
informações, permitiu aos alunos que tivessem dúvidas e tirassem suas
próprias conclusões a partir do que lhes era esclarecido. Acredita-se que,
desta forma, o conhecimento foi sendo construído por cada um, ao invés de
lhes ter sido fornecido um “pacote pronto”[8]” Em pouco mais de um mês de atividade os resultados obtidos foram
surpreendentes, culminando com uma exposição museológica de objetos dos
familiares dos alunos, com legendas elaboradas pelos próprios, e um júri
simulado. “A simulação do museu objetivou o
ensino de “como visitar uma exposição”, considerando-se tudo o que foi
trabalhado com relação a preservação e valor cultural”[9]. A ideia de se fazer
um julgamento para se captar o nível de assimilação de ideias dos alunos foi
motivada pelas observações detectadas na visita guiada ao bairro Floresta,
onde a escola se situa. Devido à proximidade com o Centro da Cidade, a região
foi e ainda é palco de grandes transformações que foram facilmente percebidas
pelos alunos ao compararem o bairro existente com a realidade apresentada
pela planta cadastral dos anos 40. Para servir de pano
de fundo ao julgamento foi escolhido o "Solar Cannã", imóvel da
década de 40 que, devido a ameaça de demolição por parte dos proprietários
foi embargado pela Prefeitura e a época do projeto, encontrava-se em ruínas. A simulação do
julgamento tendo como objeto uma realidade concreta motivou o conhecimento
dos dilemas encontrados ao longo da luta pela defesa do patrimônio cultural.
As turmas foram divididas em “contra a preservação do Solar” e “a favor da sua
preservação”. Quatro alunos foram selecionados para encenarem a trama
do julgamento. Representaram quatro irmãos: dois a favor da demolição do
imóvel e os outros dois favoráveis a preservação. Um outro grupo de alunos
foi designado para ser o corpo de jurados a quem caberia a decisão hipotética
de preservar ou não o imóvel. Para maior conhecimento e sensibilização dos
alunos foram apresentados slides com detalhes do interior e da fachada
anteriores à degradação. As duas duplas se
empenharam na caracterização dos papéis e no julgamento presidido pela
Presidente Interina do IEPHA/MG, Ruth Villamarim Soares. Defenderam com
argumentos convincentes os seus pontos de vistas. Os dois alunos que
desejavam demolir o imóvel alegaram que era velho e que o mais correto seria
a sua substituição por um prédio que teria um apartamento para cada um dos
irmãos solucionando a disputa. Os outros dois "irmãos" argumentaram
que a casa era cheia de lembranças do passado da família, citando cenas do
convívio imaginário dentro da casa e até mesmo as cores das paredes dos
quartos e os afazeres dos pais na cozinha do imóvel. Importante esclarecer,
no entanto, que nenhum dos alunos conhecia o interior da Solar, o que
permitiu uma representação criativa e comovente das argumentações. A atuação,
extremamente convincente emocionou a todos os técnicos envolvidos por
constatarem a apreensão e utilização dos conceitos discutidos durante o
projeto para defenderem o patrimônio e a qualidade de vida local. Venceram os
últimos. Em avaliação
elaborada após a atividade, a equipe considerou que a divisão das turmas ...gerou uma competição
acirrada, provocando uma atitude parcial entre os alunos, os quais apesar da
consciência sobre a importância da preservação passaram a querer ganhar, de qualquer
forma [10]. Independente do
resultado obtido pelo júri simulado, o mais importante de todo processo foi a
grande participação das turmas que foram sensibilizadas para a descoberta,
dedução, comparação e raciocínio com relação à temática, fechando com chave
de ouro o Projeto Piloto: A Jornada extrapolou a esfera da
Escola, integrando também a comunidade (padre da Igreja N. S. das Dores, vizinhos
da Escola, famílias dos alunos), a qual se mobilizou de diversas formas para
a construção do trabalho. O sucesso da atuação do IEPHA/MG foi
tão grande que chegou a provocar “ciúmes” nas turmas que não foram envolvidas
no Projeto. A resistência inicial, por parte de alguns professores, em
trabalhar a questão do Patrimônio Cultural com seus alunos, acabou sendo
superada a partir da tomada de conhecimento do resultado do trabalho”. (...) “O trabalho realizado no “Barão de
macaúbas” destacou-se pela flexibilidade no planejamento, o qual foi sendo
construído diariamente, em respeito ao conhecimento e interesse de alunos e
professores. (...) Considerando o objetivo do Projeto em
despertar o interesse dos alunos para as questões da preservação do Patrimônio
Cultural, houve uma preocupação por parte dos técnicos em não fornecer
informações em excesso e sim, esclarecer os questionamentos no momento em que
havia a manifestação de interesse pelos alunos, o que pode ser avaliado como
bastante salutar. A atuação integrada dos diversos
técnicos envolvidos possibilitou uma linguagem unificada, acessível aos
alunos, os quais puderam sentir o resultado do trabalho de uma equipe coesa.[11]. Finalizada a
experiência, nas duas escolas o IEPHA/MG, devido a grande repercussão
advinda, deu prosseguimento à educação patrimonial através do Projeto de
Pesquisa "Memória de Minas - Educação e Patrimônio Cultural", numa
tentativa de se criar uma atividade permanente integrada às ações
comunitárias e ao projeto de realização de inventários da instituição. Este
novo projeto tinha como principal objetivo “a socialização do conhecimento
das questões referentes ao Patrimônio Cultural, assegurando às comunidades
uma verdadeira participação na construção da sua história e, consequentemente,
na melhoria de sua qualidade de vida”. Apenas um piloto foi realizado em
1995, na cidade de Leopoldina, onde se empreenderam ações educativas com a
participação da comunidade na investigação reconhecimento e manutenção dos
referenciais culturais do município. Foram ministrados encontros, palestras,
fóruns de debate, o tombamento da Escola Estadual Botelho Reis e o inventário
do acervo cultural do município. Nos anos que se seguiram, ações isoladas
foram empreendidas em trabalhos de pesquisa para tombamento, inventário e
restauração de imóveis tombados. No entanto, estas ações não se traduziam em
um projeto efetivo da instituição refletindo muito mais a disposição de
alguns técnicos. IV - AS EXPERÊNCIAS DE 2001 a 2006 – Uma Publicação e o Projeto Trens de Minas
Em 2001, foi realizada uma oficina sobre Educação Patrimonial na sede
da Fundação João Pinheiro onde se discutiu as ações passadas da instituição e
foram propostas novas ações em parceria com a Fundação João Pinheiro e
Secretaria de Estado da Educação. No ano de 2002, houve uma nova tentativa de se
empreender um projeto de educação patrimonial, agora em convênio com a Secretaria
de Estado da Educação e Fundação João Pinheiro, estabelecendo “um elenco de
ações conjuntas visando a disseminação de conceitos, conhecimentos,
experiências e recomendações para a exploração do tema Educação
Patrimonial nas escolas de nosso estado”. O Projeto gerou uma publicação,
(Reflexões e Contribuições para a Educação Patrimonial) com textos de
diversos autores, que se tornou referência nacional na área. “A meta da Secretaria da Educação, nesse campo, é
estimular ações voltadas para o conjunto do patrimônio histórico e cultural
de Minas Gerais. Mas é importante ressaltar que esta não deve ser atividade
apenas das instituições e pessoas interessadas na preservação de edificações
ou conjuntos arquitetônicos que representam fases da história de Minas. O
patrimônio da sociedade mineira vai muito além, das manifestações artísticas
ao conhecimento técnico e científico, dos recursos naturais ao aparato
turístico de cada região.”[12] Em 2006 o IEPHA/MG realizou um programa de educação
patrimonial dentro do subprograma Preservação do patrimônio Cultural do
programa “Trens de Minas”, visando, desta forma suprir esta carência de
intercâmbio e conscientização tão importante para o bom desempenho da
instituição, dos municípios e comunidades na proteção do acervo ferroviário
mineiro. Paralelamente, desenvolveu várias ações educativas: cursos,
palestras, fóruns, atendimentos presenciais e via e-mail/site, produção de
informativos, estórias educativas e jogos auxiliando os municípios mineiros
na realização dos seus projetos de educação patrimonial. V - O PROGRAMA EDUCAÇÃO MEMÓRIA E CIDADANIA De 2007 a 2010, a
Diretoria de Promoção do IEPHA/MG, Gerência de Difusão, desenvolveu um grande
programa de educação patrimonial - “Programa Memória e Cidadania” – cujos
pilotos aconteceram em 2007 nas cidades de Paracatu e em seguida, em 2008,
Pitangui, envolvendo comunidades quilombolas, associações de bairros,
Conselho Municipal do Patrimônio, Secretaria Municipal de Educação,
Secretarias Municipais de Cultura, entidades públicas e privadas diversas e
escolas estaduais e municipais. O foco central era o desenvolvimento de
projetos elaborados em conjunto entre os vários seguimentos da sociedade
local. Nos anos 2008 a 2010 o projeto atingiu as cidades de Entre Rios,
Jeceaba, São Brás do Suaçuí, Pirapora, , Sacramento, Berilo e novamente a
cidade de Pitangui. Paralelamente nos anos 2008 e 2010 foram realizadas atividades do projeto com as escolas tombadas de Belo Horizonte, que contemplou as escolas estaduais, Barão do Rio Branco, Barão de Macaúba, Olegário Maciel, Afonso Pena, Instituto da Educação e D. Pedro II. OS PROJETOS
2009 – Trabalho com
os alunos do “Projovem” vinte e quatro professores e alunos envolvidos.
Participaram da oficinas
cinquenta e sete agentes culturais.
1 -
Os objetivos dos projetos: - Promover a sensibilização cultural através de ações junto às
comunidades (palestras, cursos, cartilhas e boletins), para que absorvam os
conceitos e conheçam a realidade local com relação ao Patrimônio Cultural e
possam desenvolver coletivamente ações para valorização e preservação das
produções culturais em conjunto com o IEPHA/MG. - Estimular a apropriação e o uso, pela comunidade, do Patrimônio
Cultural que ela detém. - Estimular o diálogo entre a sociedade e os órgãos responsáveis
pela identificação, proteção e promoção do Patrimônio Cultural, propiciando a
troca de conhecimentos acumulados sobre estes bens culturais. - Levar as questões relativas à preservação do patrimônio
Cultural para dentro das escolas, contribuindo para que o corpo docente atue
como agente multiplicador. - Incentivar a participação das comunidades nas decisões
referentes à preservação revitalização e conservação dos marcos culturais. - Estimular a autoestima dos vários segmentos sociais através da
valorização e reconhecimento de suas produções culturais. - Propiciar o fortalecimento da identidade cultural individual e
coletiva. - Promover o estudo e a compreensão da cultura local, destacando
sua importância e sua singularidade. - Promover o estudo sobre os bens culturais e seus problemas,
buscando soluções. - Incentivar atividades que ampliem a participação de diversos
segmentos da comunidade visando ao prosseguimento das ações do projeto. - Promover a participação das comunidades nas atividades a serem
desenvolvidas pela instituição. - Tornar acessível, aos indivíduos e aos diferentes grupos
sociais, os instrumentos e significados. - Experimentar e desenvolver metodologias de Educação
Patrimonial, que permitam um processo contínuo de conhecimento e compreensão
e avaliação dessas ações. - Promover a produção de novos conhecimentos sobre a dinâmica
cultural e seus resultados, incorporando-os às ações de identificação,
proteção e valorização do Patrimônio Cultural no nível das comunidades locais
e das instituições envolvidas. 2 - O trabalho
consistiu das seguintes etapas: 2.1 - Etapas Preliminares:
Definição das ações a serem desenvolvidas.
2.2 - Etapa I: Definição da área
de atuação /público alvo e cronograma.
2.3 - Etapa
II: Contatos e Divulgação.
2.4 - Etapa III: Atividades junto à comunidade: Oficinas e PalestrasAs oficinas teriam duração de 16 horas com
exposição de conceitos, dinâmicas de grupo, visitas orientadas a locais
pré-determinados com mapas e folhas didáticas contendo exercícios para serem
realizados em campo e a elaboração em conjunto de projetos a serem
desenvolvidos nas escolas e nas comunidades. O destaque nos exercícios da Visita Orientada são
as folhas com detalhes de edificações situadas ao longo do trecho a ser
percorrido, para serem descobertos e identificados pelos participantes da
oficina. O exercício tem como objetivo estimular a percepção do espaço,
muitas vezes ignorado no cotidiano.
2.4- Etapa IV: Monitoramento dos projetos:
2.6 - Etapa V: Conclusão dos trabalhos:
2.7 - Etapa VI: Relatório Final.
VI – Atividades
Correlatas do IEPHA/MG Outro grande avanço no processo de municipalização e
participação das comunidades na preservação do acervo cultural foi a
valorização dos projetos locais de educação patrimonial, que pontuam os
municípios no ICMS Patrimônio Cultural - atual Lei 18.030/2009. Exigência consolidada a partir da Deliberação Normativa
01/2005 do IEPHA/MG, as ações de educação patrimonial passaram a fazer parte
do cotidiano dos municípios mineiros, visando a promoção sensibilização e
valorização do patrimônio cultural. Nesses anos de atuação, várias foram as iniciativas
educativas dos municípios, desde a realização de cartilhas do Patrimônio Cultural,
a jogos, revistas, camisetas, cds interativos, almanaques, chaveiros,
postais, calendários, imãs de geladeira, etc. Destacamos as cartilhas de Pitangui, Ubá, Juiz de Fora,
Uberlândia, Campo Belo, Conselheiro Pena, Aricanduva, Divino das Laranjeiras,
Rio Piracicaba, Monte Alegre, Conselheiro Lafaiete, Tiradentes, Sete Lagoas,
Contagem, Congonhas, Iturama, São Thomé das Letras, Três Corações, Canápolis
Ouro Preto e tantos outros municípios. Para auxiliar os municípios na elaboração dos trabalhos,
foram ministrados cursos ao longo dos anos em cidades diversas do Estado. A - A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL 2005 – 362 projetos e relatórios 2006 – 663 projetos e relatórios 2007 – 623 projetos e relatórios 2008 – 614 projetos e relatórios 2009 – 644 projetos e relatórios 2010 – 646 projetos e relatórios B - CURSOS MINISTRADOS
PELO IEPHA/MG AO LONGO DOS ANOS 2005 -2010 Ano Cursos
Municípios Agentes
Culturais Participantes 2005 10 59 - 2006 18 165 614 2007 09 85 290 2008 10 87 495 2009 17 116 572
2010 15 111 990 ______________________________ TOTAL: 79 623 2961 C - EVENTOS
DIVERSOS: SEMINÁRIOS, CURSOS, OFICINAS, FÓRUNS 2006 Somando eventos, seminários, cursos, oficinas, fóruns (foram 29):
312 Municípios. Agentes Culturais envolvidos: 1105 agentes culturais. 2007____________________________________________________________________ Total de Municípios participantes dos cursos, fóruns e
seminários: 221 Municípios. Total de agentes culturais envolvidos: 1096 Agentes Culturais. ____________________________________________________________________
2008 Total de Municípios participantes dos cursos, fóruns e seminários:
193 Municípios. Total de agentes culturais envolvidos: 1879 Agentes Culturais. 2009 Total de Municípios participantes dos cursos, fóruns e
seminários: 359 Municípios. Total de agentes culturais envolvidos: 2079 Agentes Culturais. __________________________________________________________________ 2010 Total de Municípios participantes dos cursos, fóruns e seminários
até outubro de 2010: 111 municípios. Total de agentes culturais envolvidos: 1366 Agentes Culturais. TOTAL DE PARTICIPANTES de 2006 a 2010: 7525 AGENTES CULTURAIS NOTAS
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2. - O PAPEL DA
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL
O patrimônio cultural pode ser
entendido como um conjunto de coisas de seres humanos. Coisas de gente, criadas
para facilitar a vivência em grupo e a sobrevivência nos espaços que lhes foram
destinados. Pode ser entendido também, como produto de uma construção coletiva
dinâmica e viva produzida ao longo do tempo em um espaço definido. Ou seja, vinculado
à memória e à construção de uma identidade e por este motivo deve ser preservada.
Essa preservação e conseqüente conservação, manutenção e continuidade depende
do envolvimento de todas as pessoas individualmente e coletivamente.
Cada Ser Humano é o que deve ser. E pode ser
mais. E o que é se relaciona com o que foi. Com os que foram. Com o que
construíram os que foram...
O que é se relaciona com o passado. Com as
coisas do passado. Com o que foi feito no passado e continua presente.
O Ser é fruto e construção de outros
seres. Somatória, complemento, continuidade. Cada Ser Humano carrega em
si o seu mundo e para onde for, onde estiver, sua família, sua rua, sua igreja,
sua praça, seu bairro, sua crença, sua terra, lá estarão. Cada Ser é um representante
vivo de sua cultura. Do seu Patrimônio. Cada Ser Humano é plural. O produto de uma cultura
diversa e rica. De um modo de ser, fazer e viver. Cada Ser importa.
Ações educativas ou
sensibilizadoras das comunidades detentoras de bens culturais ocorrem desde os
primeiros tempos do IPHAN, órgão federal de proteção do patrimônio cultural, criado
em 1936 em caráter provisório e consolidado a partir da Lei Federal n.º 378 de
13 de janeiro de 1937 e pelo Decreto Lei n.º 25 de 30 de novembro,
também de 1937. No entanto, estas ações careciam de objetividade e planejamento
que permitissem uma continuidade.
No Estado de Minas Gerais, após a criação do
órgão Estadual de proteção do patrimônio cultural – o IEPHA/MG – Instituto
Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais – (criado em
setembro de 1971), a situação não foi tão diferente. No início dos anos 80
(1983) a instituição criou o programa PAC – Política de Ação com as Comunidades
- cujo principal objetivo era o de romper com o paternalismo estatal. A política
de atuação do PAC partia do pressuposto de que todo bem cultural é “uma
referência histórica necessária à formulação e realização do projeto humano de
existência” [1].
“A condição necessária, para
que este modo de atuação funcione plenamente, é a de que as comunidades locais
possam se assenhorar, não apenas de seus valores culturais, mas também, dos
tributos que lhes escapam das mãos.
(...)
Deste modo, a criação e o
desenvolvimento de entidades locais, encarregadas do patrimônio local e sustentados
pelas próprias comunidades, aparece como variável estratégica, capaz de equacionar
o problema da deterioração do acervo cultural de Minas.
Uma das metas, fundamentais da
Política de Atuação com as comunidades do IEPHA/MG é, precisamente, a de fomentar
a criação e o desenvolvimento daquelas entidades. Neste sentido, cumpre-lhe oferecer às comunidades locais, subsídios para
que possam se organizar de modo adequado.”[2]
O PAC, antes mesmo da chegada do conceito ao Brasil, já era efetivamente
um programa de Educação Patrimonial. Mais tarde, em 1994, o IEPHA/MG criou o
projeto “Educação Memória e Patrimônio” que durou cerca de quatro meses em duas
escolas estaduais – Escola Estadual Barão de Macaúbas em Belo Horizonte e
Escola Estadual Zoroastro Vianna Passos em Sabará.
Recentemente, durante o ano de 2007, o IEPHA/MG desenvolveu dois programas
pilotos nas cidades de Pitangui e Paracatu utilizando uma nova metodologia de
trabalho voltada principalmente, para a capacitação e monitoramento de projetos
criados pelos diversos grupos sociais envolvidos.
Paralelamente, foi executado a partir de 1995, o ICMS Patrimônio Cultural
programa de descentralização da proteção do patrimônio cultural vinculado à lei
estadual 13.803/00 atual lei 18030/09, denominada “Lei Robin Hood”, o qual
repassa recursos do ICMS (Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços) para
os municípios que investem na preservação do patrimônio cultural, pontuando,
também, ações planejadas de Educação Patrimonial.
Por ser ainda uma ação nova, muitas dúvidas pairam sobre o tema Educação
Patrimonial e principalmente quanto ao seu desenvolvimento.
Educar é alimentar e ser alimentado. É se dá ao outro e também receber.
Educar é troca. É transbordar, mas também se preencher. Ou seja:
eu dou o que tenho e recebo o que você tem. A transformação é mutua. Eu
serei outro. Você será outro. O que fizermos juntos será melhor e diferente.
Por isso
entendemos a
Educação Patrimonial como um trabalho permanente de envolvimento de todos os
segmentos que compõem a comunidade, visando a preservação dos marcos e
manifestações culturais, compartilhando responsabilidades e esclarecendo
dúvidas, conceitos e, ao mesmo tempo, divulgando trabalhos técnicos pertinentes
e seus resultados.
Ela visa, principalmente, fortalecer
a autoestima das comunidades através do reconhecimento e valorização de sua cultura
e seus produtos. A Educação Patrimonial é um trabalho de “auto-despertar”
motivado, que tem como temática toda a produção cultural de uma comunidade ou
grupo social. Esse processo educacional, formal e informal, utiliza situações e
ações que provocam reações, interesse, questionamentos e reflexões sobre o
significado e valor dos acervos culturais e sua manutenção e preservação.
A Educação Patrimonial deve nos motivar, enquanto indivíduos, a pensar, a
nós mesmos e ao mundo que nos cerca. Principalmente, ela deve trabalhar todos
os sentidos humanos:
- Deve trabalhar o olhar para que possamos entender e compreender o que
se vê, para compreender o gostar e o não gostar do que se vê.
- Deve trabalhar a audição para que se possa saber ouvir e refletir sobre
o que se ouve.
- Deve educar o olfato para saber o mundo e seus cheiros e seus
significados e para onde estes nos remetem.
- Deve educar a percepção tátil para sentir as coisas. Sua temperatura,
textura, maleabilidade, função estética.
- Deve trabalhar os modos de se expressar e os de dizer para que sejamos
capazes de exprimir os sentimentos, duvidas, anseios e idéias, com propriedade
através da fala, da escrita e do próprio corpo.
A Educação Patrimonial visa a fazer com que o ser humano compreenda a si mesmo,
suas angustias, dores, medos, anseios e entender o porquê das coisas: o porquê
de estar aqui. Entender a sua vida, seu modo de vida, seu mundo particular, seu
mundo coletivo e a ligação e relação de tudo isto.
Principalmente, a Educação Patrimonial deve ajudar na compreensão do
papel do indivíduo neste universo social e cultural.
Assim, a Educação Patrimonial deve
ser entendida como um conjunto organizado de procedimentos e ações que tem como
principal objetivo a valorização dos indivíduos e das comunidades e toda a sua
produção cultural. É um processo de auto-educação e sensibilização que visa a
eliminar a miopia cultural, despertando sentimentos e conhecimentos adormecidos
que fortalecerão o senso de pertencimento de compreensão de responsabilidade dos
indivíduos enquanto elementos de um grupo, sociedade, comunidade e lugar,
utilizando para esse fim o seu acervo cultural.
Os princípios norteadores das ações
de Educação Patrimonial são a descoberta e a construção em conjunto, motivadas
pela observação, apreensão, exploração e a apropriação criativa do
conhecimento, na busca da compreensão da condição individual e coletiva e o
aprimoramento da vida em sociedade. Ou seja:
- Sensibilizar a sociedade para uma mudança de atitude: de
espectadores da proteção do patrimônio para atores desse processo.
- Através da educação, produzir a compreensão; através da
compreensão, proporcionar a apreciação e através da apreciação a proteção.
Com a Educação Patrimonial
pretendemos contribuir para a formação do indivíduo enquanto parte de uma
coletividade. Ou seja, uma peça importante e participativa para o
desenvolvimento sadio das comunidades.
Com a Educação Patrimonial
pretendemos alcançar a preservação de nosso patrimônio cultural pela sociedade
como um todo – poder público, iniciativa privada e comunidades. Assim poderemos
aprender a conhecer as diversidades culturais;
aprender a fazer, participar, vivenciar essas diversidades culturais; aprender a
viver em sociedade e respeitar as diversidades culturais e aprender a ser,
desenvolvendo a capacidade crítica, emocional e criativa.
No entanto, por mais lúdicas e espontâneas que sejam as atividades e
ações de Educação Patrimonial, elas não podem dispensar o planejamento. Não
podem ser aleatórias. Devem seguir um plano/projeto estruturado, com princípio
meio e fim, com: apresentação, justificativa bem definida, definição do
público–alvo, objetivos claros, metodologia detalhada em atividades e ações,
cronograma, orçamento, com definição da equipe que vai trabalhar e dos produtos
que se pretende alcançar.
Ao final do projeto, avaliações e relatórios devem ser produzidos para
otimizar as ações futuras deste ou de outros projetos que, porventura, sejam
elaborados. Desta forma, nossas atuações na Educação Patrimonial serão cada vez
mais eficientes e alcançarão o objetivo principal que é o envolvimento das
comunidades na preservação do patrimônio cultural e consequentemente na sua
construção enquanto cidadãos.
Nunca é demais repetir que, o ser
humano se faz com troca, transmissão, repetição, continuação, construção
dinâmica, viva, sadia...
Um ser humano se faz com espaços
físicos e outros seres humanos... Influenciado pela natureza: clima, fauna,
flora...
Os Seres Humanos são muitos.
Parte dos que foram. Parte dos vizinhos. Parte dos que chegam. Parte de si
mesmo.
Um Ser Humano é ETERNO se respeita o seu Passado, seu
Presente, sua Comunidade e a si mesmo.
(Carlos Henrique Rangel).
[1]1 IEPHA/MG. Política de Ação com as Comunidades
– PAC – Documento
Básico, 03 de out. de 1983.[1]
[2] IEPHA/MG. Política de Ação
com as Comunidades – PAC – Documento Básico, 03 de out. de 1983.
3 - A
PRESERVAÇÃO REVISTA
Para viver e sobreviver no mundo, os seres precisam se
adaptar aos espaços/lugares do mundo.
Os animais se relacionam com os lugares biologicamente, se
moldando lentamente ao clima e ambiente. Tornam-se perfeitamente aptos para
viver nos espaços que escolheram como lar.
O lugar se torna seu habitat sua morada definitiva e única.
E esse ser não poderá viver em outro lugar a não ser que
seja um lugar muito parecido com o seu lugar de origem.
Sua história está vinculada, moldada no espaço que o
construiu e adaptou.
O ser humano, também é um ser adaptado biologicamente, mas
não só.
Obrigado a viver em grupo para sobreviver o ser humano
criou mecanismos de comunicação para poder transmitir conhecimentos, ideias e
descobertas: gestos e sons que se somam e formam sílabas, palavras e significados.
Esses códigos dizem algo. Passam algo. Transmitem algo.
“Os homens
estavam por natureza desprovidos de meios para viver isoladamente, (...) é a
necessidade que os obriga a juntar-se uns aos outros, a inventar a vida social
em conjunto”
Jâmblico, filósofo Sofista.
O ser humano se adapta ao lugar culturalmente.
Percebeu cedo que precisava do outro. Precisava
compartilhar com o outro o seu conhecimento e suas experiências para continuar
no mundo.
O lugar o molda, mas também é transformado por ele. O lugar
é domesticado, trabalhado por ele.
Cedo o ser humano percebeu o seu mundo e descobriu que ao
contrário dos animais, precisa se adaptar aos lugares transformando-os.
Não possui peles fortes para protegê-lo do calor ou do
frio. Não possui garras para matar ou rasgar os alimentos.
Para sobreviver às constantes mudanças climáticas do meio
ambiente o ser humano necessita criar peles artificiais tiradas dos outros animais.
É necessário cria garras artificiais como pedras pontudas ou paus trabalhados
para ferir e nocautear os animais/caças e os inimigos, os “outros”. E todos
esses artifícios estarão sempre em constante evolução para uma melhor adaptação
ao meio.
O ser humano produz cultura. O único ser a fazê-lo. E
cultura é essa soma de modos de ser, fazer e se relacionar com os
espaços/lugares, utilizando o que o meio tem a lhe oferecer para sobreviver. Se
há pedras, fará abrigos de pedra. Se há apenas terra, a casa será de barro. Se
há gelo, que seja de gelo o abrigo a protegê-lo.
Cultura
Conjunto de atividades e modos de agir, costumes e
instruções de um povo, meio pelo qual o homem se adapta às condições de
existência, transformando a realidade.
Cultura é um processo em permanente evolução, diverso e
rico.
É o desenvolvimento de um grupo social, uma nação, uma
comunidade, fruto do esforço coletivo pelo aprimoramento de valores espirituais
e materiais.
Ao contrário dos animais. Que naturalmente se molda aos
lugares, precisamos aprender. Não se nasce com cultura. É necessário aprender a
cultura do grupo.
Os modos de ser de acreditar de se relacionar com o outro.
Cultura se aprende.
Então cultura está relacionada com o passado. Com o que foi
vivenciado no passado e que deve ser transmitido para que continue e ajude o
grupo a se perpetuar no mundo.
Cultura está relacionada com lembrança e com a memória e
define a identidade do grupo.
A Cultura está em gestos e ações dos Homens. É um fazer
portador de sentidos.
E os produtos culturais são consequências deste fazer,
deste agir.
A importância cultural é dada pelos atores deste fazer.
IDENTIDADE
Tudo aquilo que diferencia e que identifica
o homem, um grupo social, político, étnico, religioso, etc,
em relação ao Outro.
São as ações do homem para viver em sociedade ao longo da
história e do dia a dia.
Minha identidade é a soma do que lembro individualmente e
em conjunto. Minha memória se faz com o meu passado e consequentemente molda a
minha identidade.
Memória: Lembranças,
reminiscências, vestígios.
Aquilo que serve
de lembrança.
Todos nós temos lembranças.
Só lembramos do que passou.
O ser humano precisa aprender sempre para lembrar.
Deve ensinar e transmitir para que outros possam lembrar e
futuramente transmitir.
Mas a nossa memória é frágil e mutável. Constantemente é
construída no presente. Nem tudo lembramos e para isso é importante repetir e
transmitir e também atribuir lembranças às coisas e lugares. Para isso é
necessário qualificar as coisas e os lugares para que esses “falem” e sejam
suportes da memória do indivíduo e do grupo.
Lembrar pode ser a diferença entre sobreviver ou perecer.
Para não esquecer eu guardo o que pode me fazer lembrar.
Posso escrever, posso documentar e posso incorporar valores
e lembranças às coisas para que elas me façam lembrar.
O que sou está no passado, no presente e nos espaços que me
rodeiam.
Sou influenciado pelos lugares e pelos outros seres
humanos.
O que sou eu aprendi e construí com os meus e guardo em minha
memória.
MEMÓRIA
“Mais que apenas via de acesso ao passado, a memória é uma estrada
para a compreensão do Eu”
(Cunha, João Paulo. Editor de Cultura do Jornal
Estado de Minas)
Todo ser humano é em um lugar. E nesse lugar deixa sua
marca e sua essência, moldada e influenciada pelo lugar.
O Ser humano está no lugar. O lugar faz o Ser. O Ser também
faz o lugar.
Então, a permanência de um grupo depende da sua cultura,
que depende do lugar. Depende da memória de grupo e dos suportes da memória: os lugares que falam.
Essa produção cultural de um grupo é uma herança
compartilhada.
Podemos herdar os bens culturais, mas não herdamos a sua
compreensão.
Para compreender é preciso aprender, conhecer, vivenciar,
apreciar.
Aquilo que eu compreendo e conheço, eu respeito.
“A espécie humana é a única que precisa
Ser educada” (Kant)
“Depois do pão, é de educação que o povo
Precisa” (Danton)
Onde tem gente tem cultura transplantada, recriada,
reconstruída, adaptada, inovada e novamente criada.
Onde tem cultura tem bens culturais: materiais e imateriais
produzidos pelo Homem para viver e sobreviver no mundo que o cerca.
Todo lugar de Homem... De muitos Homens produz cultura.
Cada ser humano carrega em si o seu mundo e sua cultura e é
direta e indiretamente
transmissor, reprodutor, inovador e criador de cultura.
“A história social e pessoal, pode qualificar as coisas, os
objetos, os lugares da casa, os lugares de um bairro. Até mesmo a natureza vira
memória.”
(GONÇALVES FILHO, José Moura. 1991)
O que o ser humano é está no passado, no presente e nos
espaços que o rodeiam.
Somos influenciados pelos lugares e pelos outros seres
humanos.
O que somos aprendemos e construímos com os outros e guardamos
em nossa memória e em suportes.
É por isso que guardamos coisas. As coisas falam. Fazem com
que nos lembremos do que aconteceu no passado e que precisamos para continuar.
Alguns “bens”, falam só para um indivíduo ou para a sua
família.
Falam de coisas que vivenciou e de coisas e seres que quer
lembrar.
Há outros bens que falam para o grupo/comunidade/nação e
transmitem o conhecimento que necessitam para que possam sobreviver com
dignidade e autoestima.
Esses são os “bens culturais”, produtos do processo
cultural de um grupo e que são importantes não por serem históricos artísticos
ou arquitetonicamente únicos, mas por que são essencialmente suportes da
memória do ser humano.
O valor de um bem cultural está nessa capacidade de “falar”
ao grupo tanto coletivamente como individualmente. Está impregnado de lembranças
e dá sentido ao grupo e o diferencia de um outro.
Esse bem só terá
sentido para um grupo se for um suporte vivo de lembranças, vivências e
significados.
Esse bem precisa estar vivo no cotidiano do grupo para
realmente falar a esse grupo.
“...o conceito de bem cultural extrapola a dimensão
elitista, de "o belo e o velho". E entra numa faixa mais importante
da compreensão como manifestação geral de uma cultura.
É o conjunto de bens culturais
materiais e imateriais, de um povo.
Suas festas, modos de fazer, criar
e viver.
Suas criações científicas,
artísticas, tecnológicas e documentais.
O gesto, o habito, a maneira de ser da nossa comunidade se
constituem no nosso patrimônio cultural. (...)"
(Aloísio de Magalhães)
Preservar os bens culturais materiais e ou imateriais de um
grupo é manter a identidade deste grupo garantindo a sua continuidade. Mas isso
só será possível se esse grupo continuar a “ouvir as vozes” dos bens culturais.
Ninguém nasce sabendo cultura e sempre será necessário
ensinar o respeito às coisas que falam para podermos ouvir. É preciso romper a
miopia cultural e aprende a escutar o que os lugares e os suportes da memória
têm a dizer.
Assim, só respeito o que conheço. Só preservo o que
significa algo. Só protejo o que é caro à minha memória e sobrevivência.
Carlos Henrique Rangel.
O mais
importante na Educação Patrimonial é o caminho para se chegar aos objetivos.
É o que
se aprende no caminho.
Aprender
a olhar é mais importante que o próprio olhar.
Aprender
a fazer é mais importante do que o que vai ser feito.
Aprender
a sentir dará sentido ao que foi sentido. Ao que vai ser sentido.
Porque
mais que um projeto a ser executado é um mundo a ser desvendado.
- Uma
nova visão.
- Uma nova percepção do seu lugar.
- Uma nova maneira de se relacionar com as
coisas de lembrar.
- Entender diferente o que se achava
entendido.
Educação
Patrimonial é a busca do entendimento de se mesmo e do seu mundo.
Porque o
que somos é parte do que vimos. Do que vemos, utilizamos e vivenciamos.
Seremos
seres humanos melhores se nos compreendermos, tendo como base o passado e os
vestígios deste passado. Não se pode caminhar para o futuro sem olhar para trás...
Para o passado que nos consolidou como somos.
As coisas
nos falam sempre.
E sempre
de nós mesmos...
(Carlos Henrique Rangel).
5 - PENSAR ALÉM
Entendemos
que o Patrimônio Cultural está no ar que respiramos no dia a dia. Porque como
seres humanos, somos constituídos de lembranças, memórias e coisas do passado que nos movem no presente e nos
remetem para o futuro. Precisamos lembrar para continuarmos e aprendermos o que
dizem as coisas do passado que continuam no presente. Aprender o porquê preservar
essas coisas para que elas continuem a nos dizer o que somos.
Mas
educação patrimonial não pode e não deve se restringir às escolas. Ela deve
permear todos os nossos atos e atitudes e para isso precisamos usar todos os
meios disponíveis e necessários: Mídia impressa e televisiva, vídeos, campanhas
publicitárias, internet, etc. Tudo que possa ser usado para valorizar, difundir
e divulgar o patrimônio cultural, contribuindo para elevar a autoestima de um
grupo, comunidade, cidade ou nação.
Algumas pessoas ainda estão
pensando em educação patrimonial apenas como algo dentro das escolas.
Precisamos avançar, ir além da visão simplista das coisas. Os órgãos de preservação
precisam amadurecer, pensar holisticamente as "coisas" que falam. Temos
que ser criativos, sem medo de errar. Na verdade, em se tratando de educação
patrimonial não se erra nunca, pois sempre ficará alguma coisa.
(Carlos
Henrique Rangel).
6 - O
OUTRO
Vivendo em grupo por necessidade e sobrevivência,
o ser humano cedo necessitou de símbolos e códigos para se fazer entender e
compreender o seu mundo e os seus iguais. Essa necessidade do outro e a
convivência com este, só foi possível através de um consenso coletivo para se
entenderem em relação a tudo. Desde as pequenas coisas como a nominação de um
objeto, às regras de convivência.
Se esse consenso se deu através de lideres carismáticos
ou autoritários ou mesmo de forma democrática, essa não é a questão. O fato é
que o consenso existiu para que fosse possíveis a convivência em grupo e a
adaptação a um espaço determinado.
A identidade desse grupo será definida pelo consenso.
Pela crença em valores assimilados por todos ou pelo menos a maioria dos
membros do grupo. Os que não aceitam as regras do grupo são excluídos e se
tornam os “outros”.
Também esses, denominados “outros” são necessários
para a formação da identidade do grupo e a consolidação de suas crenças,
costumes e ideais. A identidade de um ser ou de um grupo é definida pela
contraposição à identidade de outro. O outro indivíduo, grupo, comunidade ou
nação será sempre a referência até mesmo para o fortalecimento da identidade.
Ao mesmo tempo, uma comunidade por mais homogênea
que seja sempre terá grupos discordantes – “os outros” que também possuem
identidade própria, cultura própria, mesmo que identificados de uma forma geral
com o grupo dominante.
Essa minoria dentro de uma comunidade maior ainda
assim é parte desta e merece respeito quanto a sua memória, identidade e suas
produções culturais.
O outro que me acompanha e que produz cultura
comigo, o que permite a diversidade cultural merece ser reconhecido, respeitado
e valorizado como parte do grupo maior.
Numa sociedade consensual a diversidade deve ser o
consenso para que a o grupo se renove culturalmente e sobreviva com a
autoestima valorizada e fortalecida.
Esse outro também ele é parte do grupo e mesmo o
outro culturalmente diferente, aquele de outro grupo/nação, também esse merece
respeito. Ser diferente não é ser pior ou melhor. É apenas diferente.
Outra forma de ser e de se relacionar com o mundo e seus lugares.
O outro é o meu céu e meu inferno. É o meu contraponto.
O outro sou eu diferente.
(Carlos
Henrique Rangel).
7 – DESCENTRALIZAÇÃO
É no âmbito municipal, nas
localidades e comunidades é que se encontra a verdadeira proteção.
É junto aos vivenciadores e com
os vivenciadores é que se protege o patrimônio cultural.
Se quisermos de fato efetivar e
consolidar essa proteção temos que descentralizar nossas ações.
Temos que ir ao encontro destes
detentores do patrimônio cultural.
Levar nossos cursos, nossas
angústias, nossas dúvidas e certezas a onde estão as comunidades e os seus
agentes culturais.
Devemos aprender a ouvir e
principalmente a ensinar e compartilhar conhecimento com os agentes culturais,
entendendo que não são inimigos e sim parceiros e construtores da proteção do
patrimônio cultural.
Chega da preguiça centralizadora
e limitada dos burocratas sem visão.
(Carlos Henrique Rangel).
8 - UMA VISÃO SOBRE A
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL
O público alvo, objeto de uma ação
de Educação Patrimonial não é uma caixa vazia esperando para ser preenchida.
Ele detém conhecimentos sobre si
mesmo e sobre o seu mundo e necessita apenas, ser estimulado a ouvir/sentir o
que se encontra em seu interior, na essência de sua comunidade e nos espaços e
coisas que a permeiam e rodeiam.
As ações de Educação Patrimonial
precisam estimular esse conhecimento latente que se encontra no grupo a ser
trabalhado, fazendo com que se lembre ou se redescubra nos objetos, lugares,
ações, manifestações e recriações, fruto do seu grupo/comunidade/bairro/cidade/nação.
Esses estímulos sensoriais,
visuais, auditivos, olfativos, gustativos e sentimentais devem se realizar por
meio:
- De atividades e exercícios que
provoquem e estimulem no indivíduo, o entendimento de seu ambiente familiar,
seu cotidiano e a relação das coisas materiais e imateriais com essa vivência
do dia a dia.
- De atividades e ações que
possam despertar essa intimidade perdida ou adormecida, entre os bens culturais
materiais e imateriais, o indivíduo e sua coletividade.
- De visitas orientadas a lugares
e bens culturais de importância coletiva onde o grupo será provocado, por meio
de exercícios e atividades, a descobrir/redescobrir, conhecer e se reconhecer
no bem cultural.
Conceitos básicos devem ser trabalhados
sim, mas não com o intuito de se transformarem em conhecimento de segunda mão,
repetidos sem sentido. Esses conceitos devem ser o alicerce da redescoberta
individual e coletiva do conhecimento latente adormecido no consciente e inconsciente
desses homens e mulheres envolvidos no projeto de Educação Patrimonial.
Ao final do Projeto de Educação
Patrimonial, mudanças ocorrerão tanto no grupo trabalhado como nos instrutores
envolvidos e será diferente de indivíduo para indivíduo.
(Carlos
Henrique Rangel).
9 - CHOVENDO
NO MOLHADO:
É
necessário pensar a proteção do patrimônio cultural, não como um objetivo em si
mesmo, mas como uma prioridade de sobrevivência e continuidade de um
povo.
E isso
tem que ser decidido não por um grupo de "iluminados" detentores de
diplomas e títulos.
E sim
pelo povo...Pelas várias comunidades produtoras de culturas e seus produtos: os
bens culturais - materiais e imateriais.
O
reconhecimento legal a um bem cultural não é garantia de sua
continuidade.
Somente
a legitimação deste bem cultural pelo seu grupo criador/recriador é que
realmente o fará continuar pela eternidade possível.
Somente
o seu reconhecimento, utilização, recriação, lhe dará o devido respeito e legitimidade
enquanto objeto de lembrar e depositário da identidade de uma comunidade...
Caixa de sua memória e autoestima.
Por isso
repito: Não adianta declarar um bem como patrimônio legal de um povo sem a
devida concordância, participação e colaboração deste povo.
Não
adianta tombar/Registrar um bem cultural se não houver um comprometimento
compartilhado do órgão tombador e das comunidades envolvidas, em seu cuidado
diário, em sua conservação, utilização, recriação, promoção e divulgação...
Enfim:
Educação Patrimonial constante, permanente desde o início do processo de
proteção e para todo o sempre.
(Carlos
Henrique Rangel).
10 - ESSAS COISAS...
As coisas nos falam mesmo quando não temos a
capacidade de ouvi-las por não entendermos sua linguagem. Mesmo quando falam de
memórias de outros, conseguimos ouvir seus sussurros de um tempo que não é
nosso e do qual não participamos ou vivenciamos. Sabemos que trata de memórias
de homens mesmo que não sejam as nossas.
Um Rio pode ser uma metáfora do tempo, esse
que passa sempre e mesmo sendo o Rio é sempre um novo rio.
As coisas ou o que resta das coisas berram
memórias e mesmo o rio, reflete o tempo dos homens em suas margens, em seu
espelho d’água, esse caminho que leva o Homem e que também é marcado pelo
Homem.
São os homens que atribuem vozes às coisas. Que
lhes impregnam de significados para fazer lembrar mesmo que seja inconsciente.
Coisas que falam duram mais...
Homens que ouvem as coisas estes também vivem
mais e melhor.
(Carlos Henrique Rangel).
11 - LUGAR
COMUM:
CONHECIMENTO E VALOR
Ao homem cabe definir o que lhe é caro. O que
lhe toca, fala e o impulsiona para o infinito futuro.
É característica humana conhecer ou pensar
conhecer para aceitar , acomodar, sentir-se bem e continuar.
Conhecer e atribuir valores são essenciais ao
homem para uma vivência sadia com o seu meio e os seus. E isso pode ocorrer de
forma consciente ou inconsciente. Coletivamente ou individualmente. Sempre de
forma diferente, por que diferentes são os homens e as relações destes com o
seu meio/mundo.
Uma relação que é real e ao mesmo tempo mística.
Ao mesmo tempo fantasiosa e construída individualmente e coletivamente nos
espaços domesticados.
Os valores são transportados, atribuídos aos
lugares e as coisas, quase aleatoriamente ao longo dos anos e das vivências.
Definem o caráter dos homens, influenciam o seu modo de ser, crer, e ver o
mundo e vice-versa. Os lugares e as coisas influenciam e ao mesmo tempo são
qualificados, valorados compreendidos, modificados material e imaterialmente
pelos homens.
E a razão de tudo isso é viver bem.
Sentir-se bem e em segurança física e espiritual.
“Eu me sinto bem no lugar que quero e me quer bem.”
O que conheço e me faz bem e me é caro, eu quero
que dure, que permaneça. Por que a sua permanência está vinculada a minha sobrevivência,
a minha continuidade.
Se o elo se rompe por incompetência do grupo
humano em transmitir o conhecimento atribuído aos lugares e coisas,
assistiremos a crise desta sociedade. Onde a ruptura acontece entre
conhecimento e valor, a dispersão impera. Não há mais coesão social e um povo
que não lembra está fadado ao desaparecimento. Um povo que não lembra não
importa.
E se não importa, já não é mais um povo.
Para não esquecer os valores e ou atribuir novos
valores é preciso lembrar sempre: transmitir, repetir, reconhecer, conhecer,
repassar...
Está nas mãos dos homens a sua continuidade e
permanência.
Sem passado e tradição não há continuidade e
renovação sadia. Sem suportes da memória não há como lembrar e continuar com
autoestima. Sem autoestima é o fim.
O que queremos?
(Carlos Henrique Rangel).
12 - GENTE E PATRIMÔNIO:
Quem quer trabalhar com Patrimônio Cultural tem que
gostar de gente.
Entender de gente.
E gente com muitas gentes.
Afinal, são as gentes - as pessoas - é que produzem,
utilizam, vivenciam e qualificam as coisas - materiais e imateriais - transformando-as
em bens culturais.
Quem trabalha com Patrimônio e quer ser um multiplicador,
orientador, transmissor, tem que gostar de pessoas e, claro, precisa saber do
que está falando.
Tem que ser humilde para entender que ninguém sabe tudo.
Principalmente quando se trata de suportes da memória.
Se for humilde, saberá ouvir.
Saberá orientar, ensinar, compreender, motivar, incentivar e
principalmente, aprender.
Quem trabalha com Patrimônio Cultural precisa gostar de gente.
De muita gente.
De gentes diferentes.
De culturas diversas.
De terras e vivências diversas.
(Carlos Henrique Rangel).
13 - O SENTIDO DAS
COISAS:
Ainda
sobre o sentido das coisas.
Somos
acumuladores.
Isso
nos resume em relação aos outros seres vivos que frequentam esse planeta.
A vida
nos trouxe ao mundo sem nada e logo já somos de alguém e esse alguém também
passa a ser nosso.
O tempo
- essa caixa sem fundo - guarda nossas coisas invisíveis e enriquece as coisas
visíveis que vamos acumulando, com memórias e sentimentos.
Acumulamos
lembranças e coisas que lembram para no sentirmos parte do mundo.
Para
nos sentirmos indivíduos entre indivíduos.
Por mais
caras que sejam todas essas coisas que nos falam de nós e dos nossos, elas não
partirão conosco.
Ficarão.
As
vivências invisíveis nunca ficarão.
São
pessoais demais.
E mesmo
que a contemos aos nossos continuadores, nunca passaremos a eles o que
realmente vivemos.
As
coisas tangíveis ficarão
E
poderão significar algo ou não para os que ficam.
Algumas
ou muitas, serão descartadas.
Outras,
espalhadas entre nossos descendentes.
Perdidas
entre os entes queridos e fora do contexto.
Ganharão
novos contextos, novos significados para nos significarem a esses continuadores
que nos amavam.
Somos acumuladores
porque queremos nos diferenciar.
Nos
sentir importantes.
Únicos
entre outros seres únicos.
Somos
criaturas que se fazem em coisas tangíveis e intangíveis. Individuais e coletivas.
E tudo
isso nos ajuda a viver entre outros seres que se lembram em coisas.
Na
verdade, somos colecionadores de nós mesmos como indivíduos ou como grupo.
Isso
nos diferencia em relação aos outros seres, para o bem e para o mal.
Homens
é o que somos.
E basta.
Lembrar
é ser... Somos porque lembramos.
(Carlos
Henrique Rangel).
14 - O FUTURO DO PASSADO:
É
sempre bom lembrar que o futuro do passado se encontra no presente.
Nada
realmente é só do passado e só terá futuro se significar para as gerações que
vivem o presente acontecendo.
Por
isso se faz importante pensar o patrimônio cultural com total anuência e
envolvimento dos seus criadores e vivenciadores.
Se décadas
atrás, as escolhas do que deveria ser preservado eram feitas quase
exclusivamente por intelectuais e técnicos das instituições de preservação e
poucos questionavam essas ações, hoje - pelo menos em teoria - já sabemos que
essas escolhas precisam ser motivadas e feitas com e pelas comunidades.
Afinal,
são elas - as comunidades - que estão junto a esses bens culturais e sabem das
memórias que carregam e que acumulam no dia a dia.
São
elas que atribuem valores a esses lugares, moradias, monumentos, objetos,
fazeres e ações.
Não há
futuro para as coisas que foram do passado se elas não agregarem as diversas
memórias e vivências cotidianas da vida acontecendo.
Apesar
de algumas redundâncias e repetições, há falas que precisam virar mantras para
ver se mudamos a mentalidade das instituições do patrimônio cultural e tornemos
em prática o respeito aos fazedores e vivenciadores dos bens culturais.
(Carlos Henrique Rangel).
15 - PENSANDO O PATRIMÔNIO CULTURAL - MATERIAL, IMATERIAL E NATURAL:
Não
se pode pensar o Patrimônio Cultural apenas como o construído ou mesmo com o
acréscimo da natureza, sem se pensar nos seres humanos atuais e suas vivências
cotidianas e produções imateriais.
O
dia a dia que produz a cultura renovada de forma lenta e dinâmica que vai além
das coisas do passado.
Afinal,
as coisas do passado e as coisas naturais estão aqui e agora e são agregadoras
de novos significados a todo instante. Sem o ser humano que lhe dê significado
e utilidade contemplativa e prática, não se pode falar de Patrimônio
Cultural.
Patrimônio
não se sustenta sem seus vivenciadores/criadores.
A
verdade é que os processos de proteção devem ser mais amplos.
O
ideal é que houvesse apenas um processo de Proteção que abarcasse o Patrimônio
material, imaterial, espaços de convivência e patrimônio natural.
Ou seja
um processo de Tombamento/Registro com amplo envolvimento das comunidades
vivenciadoras/criadoras e que pensasse a atuação manutenção, educação
patrimonial e salvaguarda a curto, médio e longo prazo.
O
Processo já deveria conter um Plano de salvaguarda, revitalização, recriação,
restauro e educação com ampla participação da comunidade envolvida.
(Carlos Henrique Rangel).
16 - O PASSADO PRESENTE:
Sim, eu vivo o hoje como única realidade.
Mas que
seria do hoje se não fosse o ontem impregnado nessa pele e nas coisas de
lembrar?
Mesmo que
estejam no hoje, foram do ontem e acumulam os invisíveis dramas das existências
que se foram e também do que acontece no agora.
Me apego
a essas coisas que lembram, carregadas de suores e lágrimas que repetem o meu
nome.
Querendo
ser mais, é no cotidiano das moradas, nas casas de orar e nos objetos açoitados
pelo tempo que me construo no dia a dia.
Minha
alma que se renova sempre é uma anciã mascate vendendo minha história que
carrego no meu alforje.
Sim, eu
vivo no presente como única realidade.
Mas que
seria de mim sem esse amado fardo da memória?
Esse
lugar comum a mim e aos meus que berram meu nome em todos os meus sentidos?
Sim, eu
vivo o hoje carregado de passado, passado a limpo todos os dias.
(Carlos
Henrique Rangel).
Mesmo que sejam negligenciados ou ignorados pelos que assumiram a direção das instituições de proteção do patrimônio cultural e seus Conselhos supostamente e teoricamente definidos como “representantes das Comunidades”, esses bens culturais de valores diversos para os grupos culturais permanecerão para além dos desejos elitistas e preconceituosos.”
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