BARCOS
A VAPOR NO RIO DAS VELHAS E SÃO FRANCISCO
Em 1832, o Governo Regencial por meio de
decreto, autorizou a navegação dos rios Doce e Jequitinhonha com a intensão de
promover a organização de companhias navais nacionais ou estrangeiras.[1]
Em 26 de agosto de 1833, o Decreto n.º 34,
sancionou e mandou que se executasse a resolução da Assembleia Geral que
concedia ao inglês Guilherme Kopke, o privilégio exclusivo da navegação no rio
das Velhas por um período de dez anos.[2] Em
14 de novembro do ano seguinte – 1834 – outro decreto confirmou o monopólio em
favor de Kopke.[3]
Trafegavam no rio São Francisco - em 1847 -
54 barcas.[4] Em
1870 – calculavam-se entre duzentas e cinquenta a trezentas embarcações
percorrendo o rio São Francisco.
Importante destacar a utilização de vapores
para dinamizar o transporte de passageiros e produtos da região sanfranciscana
para o litoral. Dom Pedro II, que se interessava pela viabilização do
transporte fluvial na região, encarregou ao engenheiro Henrique Guilherme
Halfeld, estudos objetivando a sua navegação por vapores até o oceano
Atlântico.
O vapor
“Saldanha Marinho”, construído em 1867, na cidade francesa de Bordeaux[6]
foi arrendado pela Cia Cedro Cachoeira. Em 1869, o engenheiro Henrique Dumont –
pai de Santos Dumont – comandou uma viagem do vapor Saldanha Marinho de Sabará
à fazenda Jaguara. Em 28 de setembro de 1870, o vapor Saldanha Marinho recebia
instruções para se deslocar do porto do Jaguara pelo rio das Velhas ao São
Francisco. Essa primeira viagem do vapor ao rio
São Francisco iniciou-se em 10 de janeiro de 1871, alcançando Guaicuí em 3 de
fevereiro daquele ano.[7]
A Companhia Cedro Cachoeira dinamizou o
comércio com a Bahia via São Francisco utilizando o vapor “Saldanha Marinho” para
o transporte de tecidos e compra de algodão. Esse barco transportava algodão de Juazeiro
para Guaicuí e levava para a Bahia os tecidos fabricados. Atualmente o Saldanha
Marinho encontra-se em Juazeiro – Bahia - estacionado em uma praça da cidade:
Para abastecer-se
convenientemente, a Companhia decidiu intensificar o serviço de compra de
algodão no Nordeste. (...) o vapor “Saldanha Marinho” esteve à frente da
Companhia para levar tecidos e trazer algodão, viajando até Juazeiro. Esse
famoso vapor, de muita pequena tonelagem, mas o pioneiro da navegação da bacia
do S. Francisco, nos períodos de águas altas viajava de Sabará até Guaicuí e
daí, durante todo o ano, até Juazeiro, terminal norte da navegação do S.
Francisco. (MASCARENHAS, sd. p. 159).
Ainda em fins
do século XIX, o Estado de Minas Gerais criou a Companhia Viação Central do
Brasil – mais tarde Empresa Banco Viação do Brasil – com o intuito de promover
o transporte fluvial da bacia do rio São Francisco.
Em setembro de 1892, o Banco Viação do Brasil
contava no rio das Velhas e no São Francisco, com quatro embarcações de aço
movidas a vapor, dois navios de madeira e o vapor Saldanha Marinho adquirido
por volta de 1890.[8]
Em 22 de
setembro de 1905, essa empresa foi transferida para o Estado da Bahia recebendo
a denominação de Empresa Viação do São Francisco. Essa nova empresa durante
décadas se responsabilizou pela navegação no rio entre as cidades de Juazeiro,
Pirapora e afluentes, sendo proprietária dos vapores: Antônio Olinto, Amaro
Cavalcanti, Barão de Cotegipe, Cordeiro de Miranda[9],
Costa Pereira (ex-Pirapora), Delsuc Moscoso, Djalma Dutra (ex- Prudente de
Morais), Juracy Magalhães, Matta Machado[10],
Saldanha Marinho, Siqueira Campos (ex- Carinhanha); dentre outros.[11]
O vapor Benjamim
Guimarães foi construído em 1913, pelo estaleiro norte-americano James Rees
& Sons e navegou alguns anos no rio Amazonas sendo transferido para o rio São Francisco a partir de 1920.[12]
Atualmente transporta turistas pelo rio, sendo o único em funcionamento.[13]
A região do São Francisco entra o século XX
com fortes relações comerciais com a Bahia, reforçadas pela instalação ainda no
século passado, da navegação a vapor. Já em 1909, onze vapores baianos
navegavam as águas do grande rio transportando mercadorias para Juazeiro.
Este comércio com a Bahia, no entanto, foi
reduzido nas décadas seguintes, principalmente por causa da instalação da
Estrada de Ferro Central do Brasil, que possibilitou a aproximação com centros
como Belo Horizonte e Rio de Janeiro.
A Companhia Indústria e Viação de Pirapora
- CIVP - responsável pela implantação de um parque industrial na cidade de
Pirapora surgiu em 1917. Em 31 de agosto de 1918, essa empresa firmou contrato
com o Governo Federal objetivando o transporte fluvial no rio São Francisco, recebendo
para esse fim, o vapor Wenceslau Braz.[14]
Sediada no Rio de Janeiro, tendo instalações em Pirapora, a CIVP exercia
atividades industriais e comerciais na região com uma frota admirável, composta
dos vapores: Bahia, Benjamim Guimarães, Coronel Ramos, Francisco Bispo,
Iguassu, Júlio Vito, Otávio Carneiro, Santa Clara, São Francisco, São Salvador,
Sertaneja e o já citado Wenceslau Braz.[15]
Em 1925, o governo do Estado de Minas
Gerais criou a empresa Navegação Mineira do Rio São Francisco ligada à
Secretaria de Viação e Obras Públicas. Sua frota foi composta pelos vapores:
Wenceslau Braz, Affonso Arinos[16],
Antônio Nascimento, Baependi, Curvello, Engenheiro Halfeld, Fernão Dias,
Governador Valadares, (ex-Pires do Rio), Mauá, Paracatu[17] e
Raul Soares (ex- Melo Viana).[18] A
iniciativa do Governo Estadual reconhecia a importância do transporte fluvial
do rio São Francisco e visava implementá-la.
Em 1963, foi constituída a FRANAVE –
Companhia de Navegação do São Francisco – que encampou os barcos que percorriam
o rio São Francisco entre
o século XIX e meados do século XX e que ao longo dos anos pertenceram a várias
companhias de navegação.[19]
A FRANAVE atuou no rio São Francisco e em
alguns afluentes transportando cargas e passageiros. Seu acervo se constituía
de chatas, pequenas embarcações e muitos dos já citados vapores: Benjamim
Guimarães, São Francisco, São Salvador, Otavio Carneiro, Sertanejo, Iguassu,
Coronel Ramos, Bahia, Comendador Peixoto, Francisco Bispo, Engenheiro Halfeld[20],
Wenceslau Braz, Fernandes da Cunha, Barão de Cotegipe, Djalma Dutra, Delsuc
Moscoso, Siqueira Campos, Cordeiro de Miranda e Jasen Melo. No final dos anos 1960, a Companhia de
Navegação do São Francisco possuía vinte e uma (21) chatas fazendo o trajeto de
Pirapora a Juazeiro.[21]
No início do século XXI a FRANAVE possuía
em Joazeiro, um estaleiro para construção de navios e manutenção da frota
composta de 8 empurradores de 540 HP e 62 chatas.[22]
Em 22 de janeiro de 2007, a FRANAVE foi
extinta pelo Decreto Federal n.º 6.020.[23]
Ainda antes da extinção da FRANAVE, sobre o
pretexto de se modernizar a navegação do rio São Francisco, toda a frota de
vapores foi desativada. Em 23 de setembro de 1984, o Jornal do Brasil relatou
um dos últimos episódios da saga dos vapores: “A paralisação total dos velhos
vapores naquela região aconteceu com o incêndio do “gaiola” São Francisco, no
porto de Pirapora, e selou a vontade antiga da Franave de pôr fim ao transporte
de passageiros.”[24]
O fim da Franave teve como consequência o
fim da movimentação de cargas do Porto de Pirapora.[25]
A
navegação no rio São Francisco é atualmente realizada pela empresa Icofort[26],
possuidora de dois comboios de empurradores e chatas, que levam algodão para os
municípios baianos de Ibotirama e Juazeiro.[27]
Após a construção da barragem da Usina Hidrelétrica de Três Marias em 1961 e da
barragem da Usina Hidrelétrica de Sobradinho (BA) em 1978, a navegação dos
vapores foi bastante prejudicada. Outros problemas também afetam o Rio São
Francisco e paralelamente a sua navegação: a falta de esgotos residenciais e
industriais tratados e o assoreamento.
[1] O rio Jequitinhonha é navegável em alguns trechos por canoas e pequenos barcos a vela. (CRAVO. Telio Anísio. GODOY, Marcelo
Magalhães.
Por Estradas e Caminhos no Interior do Brasil Oitocentista: Viajantes e o Desenvolvimento
da Infraestrutura de Transportes de Minas Gerais. – CEDEPLAR/FACE/UFMG, S.d., p.5).
[2] A Bacia Hidrográfica do rio das Velhas é atualmente composta por 51 municípios
com uma população quase que totalmente urbana.
[3] Guilherme ou William kopke construiu em Sabará, um barco
a vapor e máquina, entre os anos 1833-1834. (MATTA MACHADO. Dezembro de
2011, p.113).
[4]o viajante inglês -Richard Burton - informava em 1867, a existência de uma
barca de 15 metros de comprimento por 5 de largura. Menciona a barca denominada
“Nossa Senhora da Conceição da Prata” construída em Januária, que que tinha 27
metros de comprimento e 2 de largura. (BURTON, 1977, p. 171).
[6] Bordeaux ou Bordéus fica no departamento da Gironda - da região Aquitânia-Limusino-Poitou-Charentes, no
sudoeste de França.
[7] DINIZ, 2009,
p. 115
[8]
Inicialmente o vapor se chamava Conselheiro Saldanha.
(MATTA MACHADO, 2002, p.103). Seu nome é
uma homenagem ao conselheiro Joaquim Saldanha Marinho, que foi presidente da
província de Minas Gerais. Saldanha Marinho faleceu em 1895. (DINIZ, 2009, p. 121). O Saldanha Marinho foi o primeiro
vapor adquirido pela Companhia Viação Central do Brasil. (Relatorio Apresentado
á Assembléa
Legislativa da Provincia de Minas Geraes
na sessão extraordinaria de 2 de março de 1871 pelo Presidente, o Illm. e Exm. Sr. Doutor Antonio Luiz Affonso de Carvalho. Ouro Preto,
Typ. de J.F. de Paula Castro, 1871, P.75). Em abril de 1890, o vapor já fazia o percurso rio das Velhas e São
Francisco. (MATTA MACHADO, 2011, p. 117). Em 1943, o Saldanha Marinho apresentava
problemas estruturais e não navega mais no São Francisco. Em 1971, é
transferido para uma praça em Joazeiro. Passou por reformas na década de 1990.
Em 2000, passou a servir de restaurante e pizzaria.
[9] O vapor Cordeiro de Miranda afundou em fevereiro de 1943. (Jornal Gazeta,
Rio de Janeiro, 17 de fevereiro de 1943).
[10] O vapor Mata Machado – de fabricação inglesa – foi transportado de Salvador
até a cidade de Alagoinhas, por trem. De Alagoinhas foi levado a Juazeiro em
carro de bois numa viagem que durou cinco anos. (Revista o Cruzeiro, 1 de
dezembro de 1971, p. 87).
[11] 45 vapores navegaram no Médio e Submédio São Francisco. (DINIZ, 2009, p.
119).
[12] (MATA-MACHADO, 1991, p.74, 127, 132).
[13] O Vapor Benjamim Guimarães foi tombado pelo IEPHA/MG – Decreto
Estadual nº 24840, de 1º de agosto de 1985. Publicado no dia 02 de agosto de 1985 no diário oficial do
executivo e legislativo e publicações de terceiros - Minas Gerais - página
1, col 1. livros do tombo I.
Com capacidade para transportar até 140 pessoas, entre
tripulantes e passageiros, o vapor Benjamim Guimarães
navega a chamada área 01: rio, lago e correnteza que não tenham ondas ou ventos
fortes. Como características construtivas, o
vapor é uma embarcação fluvial de popa quadrada, com máquina a vapor de 60 cv
de potência alimentada por lenha, e com uma capacidade máxima de estocagem de
28 toneladas de combustível.
[14] Em 1925, esse vapor foi entregue ao governo do Estado de Minas.
[15] DINIZ, 2009,
P. 116.
[16] O Vapor Affonso Arinos naufragou em fevereiro de 1947. (Jornal de Notícias,
7 de fevereiro de 1947, p.3).
[17] o vapor Paracatu foi lançado em serviço no rio São Francisco em 1896.
(Jornal do Brasil, 17 de julho de 1960, p.8).
[18]A empresa Navegação
e Comércio do São Francisco S.A., iniciou suas atividades em Pirapora em 1937,
comandada pelo empresário Júlio Mourão Guimarães sendo extinta em 1943. (Diniz,
2009, p.116).
[19] Destacando-se dentre elas: a Companhia
Viação Central do Brasil (mais tarde Banco Viação Brasil), a
Empresa Viação Brasil; a Viação Baiana do São Francisco; a Empresa de Navegação e Comércio do São Francisco; a Empresa Fluvial Ltda.; a Companhia Indústria e Viação Pirapora e a Navegação do rio são Francisco. (DINIZ, 2009, p.113,114). A FRANAVE foi instalada em Pirapora em 1965.
(SILVA, 2000, p.221).
[20] em seus melhores anos era considerado o mais luxuoso do Rio São
Francisco. Em 1953 encontrava-se encalhado e abandonado. (Alterosa, 15 de março
de 1953, p.32).
[21] Revista O Cruzeiro, 6 de abril de 1968, p. 102.
[22] CAMELO
FILHO, 2005, p. 85.
[23] Há registros de 45 vapores que navegaram no rio São Francisco de 1871
aos dias de hoje. (DINIZ, 2009,P.119).
[24] DHOMÉ, Alain. NAS Águas do Velho Chico.
Belo Horizonte: Edição do Autor, 2014, p.52.
[25] Segundo Souza, não existe movimentação no porto de Pirapora desde 2000.
(SOUZA, Antônio Carlos da Silva. Pirapora, uma cidade média no Norte de Minas
Gerais. Belo Horizonte: PUC, Programa de Pós-Graduação em Geografia, 2008, p. 84).
[26] A Icofort,- Indústria e Comércio de Rações Ltda. foi fundada pela família
Barreto na cidade de Fortaleza - Ceará – no ano de 1989.
[27]dados de 2008. (SOUZa, 2008, p. 83).
venho acompanhando o blog, bem interessante... parabéns!
ResponderExcluirarq. Thiago de Freitas
http://dfreitasarquitetura.blogspot.com.br/
Thiago, precisando de ajuda é só escrever.
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